Em alto-mar, dispersos numa imensidão de água, os navios podem não parecer uma grande ameaça ao meio ambiente. Mas a poluição causada por embarcações impressiona: já representa 2% das emissões globais de CO2.
Um projeto desenvolvido dentro Escola Politécnica da USP, em parceria com empresas e outras instituições de ensino e pesquisa, vem tentando reduzir esses números. Em especial os poluentes causados pelos PSV (Platform Supply Vessel), navios que podem chegar a 100 metros de comprimento e são geralmente usados para transportes de cargas e pessoas até plataformas de extração de petróleo e gás localizadas em alto-mar.
Essas embarcações requerem muita energia, por vezes muito mais que uma ilha habitável inteira, diz o engenheiro Maurício Salles, um dos pesquisadores do projeto. O arquipélago de Fernando de Noronha, por exemplo, é alimentado por equipamentos (geradores a diesel e fontes renováveis) com cerca de 4 megawatts de potência. A energia de algumas embarcações chega a ser dez vezes maior.
A ideia do projeto é melhorar a eficiência de navios combinando seus já existentes motores de combustão a diesel com baterias de lítio. As embarcações costumam ter mais de um gerador, já que pode haver falhas (e o risco de ficar à deriva em alto-mar). Assim, uma máquina consegue suprir eventuais defeitos da outra. Mas os motores trabalham na chamada eficiência ruim, ou seja, não usam toda a energia gerada pelo combustível queimado — mais da metade vira fumaça. O que as baterias fazem é armazenar essa carga desperdiçada. Elas não são totalmente eficientes, mas é possível aproveitar cerca de 90% da energia guardada nelas.
As simulações mostraram que a combinação reduz até 8,7% das emissões de CO2 de um navio em movimento. Em plataformas — quando a embarcação precisa manter os propulsores ligados para ficar parada na água, já que a profundidade é muito grande para se usar uma âncora — a redução é maior, variando entre 34,6% e 47%.
“Você pode perguntar: por que as embarcações não são 100% elétricas? Isso funciona em barcos menores e de missões mais curtas. Quando são maiores e fazem viagens mais longas, de quatro dias, por exemplo, ou transportes que vão de um continente a outro, não há muita opção além do combustível fóssil”, diz Salles, que é professor da Escola Politécnica da USP e especialista do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), organização dedicada ao avanço da tecnologia. Antes de embarcar no projeto, há cerca de três anos, foi professor visitante na Universidade de Harvard, estudando esse tipo de bateria.
O projeto também apontou uma facilidade de implementação desse suporte elétrico: podem ser colocadas em contêineres sobre o convés. Isso também ajudaria a controlar a temperatura (idealmente entre 15º C e 45º C) para garantir maior tempo de vida das baterias.
Mas os materiais ainda estão em estudo, mesmo porque esse uso em navios estressa muito as baterias, algo como dez vezes mais que um carro elétrico. “O avanço [de baterias como fonte de energia] cresceu muito, mas a melhor tecnologia a ser utilizada ainda não está definida”, afirma o engenheiro.
Agora falta estimar o impacto econômico desse uso combinado de energia, algo que o projeto — que também teve colaboração de pesquisadores do RCGI (Centro de Pesquisa para Inovação em Gás), do GeePs (ou Grupo de Engenharia Elétrica), da Universidade de Paris-Saclay, e do Tanque de Provas Numérico da USP — deve apresentar no próximo ano.
Fonte: Revista Galileu