O Brasil aderiu à criação do Observatório Espacial do Clima, uma iniciativa da França para aprimorar o estudo das mudanças climáticas. Até o momento, 23 países assinaram uma declaração de interesse no projeto, promovido pelo Centro Nacional de Estudos Espaciais francês, o Cnes. Entre eles, estão potências do setor como a China, enquanto a Rússia se posiciona como observadora.
O lançamento oficial da iniciativa foi feito pelo presidente Emmanuel Macron, na segunda-feira (17), durante o Salão de Aeronáutica de Le Bourget. A maior ambição do observatório será compartilhar os dados de observação do planeta pelo espaço, como hidrometria e medidas de CO2 na atmosfera, e associá-los às informações locais de cada país, como demografia e os planos diretores das cidades. Por enquanto, não há coordenação no uso desses dados.
Antecipar fenômenos com mais precisão
Com os cruzamentos, os governos e entidades terão dados muito mais específicos sobre os impactos das mudanças climáticas nas populações. “Nós já somos capazes de medir o aumento dos níveis das aguas, mas não sabemos ainda qual vai ser, concretamente, o impacto nas populações. Para isso, é preciso juntar com dados demográficos, que saibamos onde exatamente há pessoas e plantações”, explica Laurence Monnoyer-Smith, conselheira de Clima do Cnes. “Poderemos determinar, por exemplo, qual será o efeito da salinidade da água nas culturas agrícolas.”
Desta forma, os governos poderão antecipar ações que serão necessárias na agricultura e no urbanismo nos anos seguintes, e saberão determinar onde é mais urgente agir face à iminência e fenômenos extremos, seca ou elevação dos níveis das águas, entre outros problemas.
Combate ao desmatamento clandestino
O presidente da Agência Espacial Brasileira, Carlos Moura, assinou o termo de interesse no projeto, em cerimônia que contou também com a presença do ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes. No caso do Brasil, é o combate ao desmatamento ilegal que poderá ser fortalecido. As imagens de satélite utilizadas atualmente não mostram o que ocorre acontece embaixo das copas das árvores, uma falha que poderá ser corrigida com a colaboração internacional, salienta Monnoyer-Smith.
“Hoje, com as imagens de satélite mais sofisticadas que nós temos, pelo uso de lidares especiais, podemos saber o que acontece nas camadas inferiores das árvores. Com passagens regulares, poderemos ver melhor como o desmatamento da Amazônia é realizado”, afirma. “As autoridades brasileiras poderão enviar a polícia ou militares para coibir as práticas clandestinas, feitas embaixo das copas.”
As maiores agências espaciais do mundo estão envolvidas na criação do observatório, a exceção da mais ambiciosa delas, a americana Nasa. Nos Estados Unidos, o governo de Donald Trump desmantela os órgãos federais ligados às mudanças climáticas – por isso, a ausência dos americanos no projeto é vista com naturalidade pela especialista francesa.
“Agora, entramos na fase de definição do funcionamento e dos primeiros experimentos que serão realizados em, no máximo, dois anos. As agências espaciais, a ONU e centros de pesquisa convidados vão começar a definir como vai ser a governança do observatório, que será internacional, embora ele seja uma iniciativa da França”, frisa a especialista.
Compartilhamento de dados com os mais pobres
Não apenas os países que colaboram com dados espaciais poderão se beneficiar da iniciativa. Um dos principais objetivos, assegura Monnoyer-Smith, é poder auxiliar as nações menos desenvolvidas a se adaptar aos desafios impostos pelo aquecimento do planeta.
“Será uma verdadeira cooperação internacional e ajuda aos países mais vulneráveis. A comunidade espacial vai disponibilizar dados para a África ou para o Bangladesh, e eles poderão fazer os cruzamentos com os dados deles”, indica conselheira de Clima do Cnes. “Não à toa, o projeto conta com o apoio da Pnud, o programa da ONU para o Desenvolvimento. Ele vai poder se focalizar em estudos muito específicos que alertam sobre zonas vulneráveis às mudanças climáticas.”
A ideia do Observatório Espacial do Clima surgiu durante a Cúpula do Clima de Paris, em 2015. O projeto foi lançado dois anos depois, no One Planet Summit, também realizado na França.
Fonte: RFI