A advertência veio pelo celular: o nível das reservas de água potável eram “preocupantes”, alertou no final de junho o aplicativo NINA, do Departamento Federal para Proteção da População e Auxílio em Catástrofes (BBK), responsável em nível federal pela defesa civil.
Herford, uma região do estado da Renânia do Norte-Vestfália estava particularmente afetada. Alguns quilômetros mais ao norte, a situação era semelhante: parte da população da cidadezinha de Lohne, na Baixa Saxônia, sofria falta d’água, especialmente à noite saia quase nada das torneiras. Ambos os exemplos mostram algo a que ninguém está habituado na Alemanha: água é um recurso natural, e ele é finito.
Na Alemanha, país rico em recursos hídricos, essas situações eram, a rigor, impensáveis. De acordo com a Agência Federal de Meio Ambiente (UBA), em 2013 foram captados 25 bilhões de metros cúbicos de água, portanto a Alemanha utilizara apenas 13% da água doce disponível.
Desde então, porém, um verão com recorde de calor em 2018, um inverno de pouca precipitação, e dias quentes e secos no verão de 2019 transformaram o lençol freático na principal fonte de água para o país.
Lutz Neubauer, da sucursal da Federação de Proteção Ambiental da Alemanha (Nabu) na Baixa Saxônia, considera que somente em seu estado “o nível das águas subterrâneas diminui entre 1,5 cm e 2 cm por ano”. Isso significa menos água disponível, enquanto, devido às fases de calor seco, quase nenhuma água nova é adicionada.
Ao mesmo tempo, o calor provoca uma maior demanda de água. O gramado de casa fica seco, todos anseiam por se refrescar na piscina, e isso já basta para criar problemas para os fornecedores de água. No nordeste da Renânia do Norte-Vestfália, chegou-se a impor multas aos moradores que encheram suas piscinas ou lavaram seus carros com água fresca.
Nos últimos anos, porém, um outro grupo passou também a necessitar água subterrânea com urgência cada vez maior: os agricultores. “Uma situação de competição pela água se anuncia. Deveríamos pensar a tempo sobre uma distribuição eficiente”, alerta Jörg Rechenberg, especialista em água na Agência Alemã de Meio Ambiente (UBA).
Até agora, os agricultores não dependiam dos lençóis freáticos, pois a chuva bastava para irrigar seus campos. Mas isso mudou, as ondas de calor deixaram os campos totalmente secos. “O número de requerimentos de agricultores para captar água subterrânea aumentou significativamente”, sublinha Neubauer, da Nabu-Baixa Saxônia, sobre a sua região.
O prefeito de Lohne, Tobias Gerdesmeyer, está entre que primeiro perceberam os efeitos dessa tendência. Quando a cidade na Baixa Saxônia ficou seca em junho, a culpa não era da falta de água subterrânea, e sim das tubulações velhas que não comportam mais o volume hídrico. A partir de setembro uma nova tubulação deverá remediar a situação, e todos os moradores voltarão a ter água na torneira a qualquer hora do dia.
No entanto Gerdesmeyer não esconde que a água é um grande problema em sua cidade: “Podemos observar uma competição pela água aqui, e estamos muito atentos a esse tema.” Ele também observa a demanda crescente de água subterrânea por parte dos agricultores. Ao mesmo tempo, um grande matadouro na região consome enormes volumes: “Precisamos de concepções inovadoras sobre como usar a água de forma eficiente.”
É também importante não desperdiçar água doce, ressalva o prefeito. Até agora, a maior parte da água pluvial se infiltra no solo, não sendo armazenada, e isso a cidade de Lohne quer mudar. “Atualmente estamos considerando armazenar a água das chuvas fortes em câmaras sob os ginásios esportivos, para que possa ser usada mais tarde.”
No fim são operadoras como a Associação de Águas de Oldenburg-Frísia Oriental (OOWV) que distribuem o recurso. Ela abastece cerca de 1 milhão de clientes, metade dos quais agricultores ou empresas industriais que usam água subterrânea de forma privada. Axel Frerichs, diretor-geral adjunto, está ciente da situação: suas 15 estações de tratamento d’água estão na fase “crescimento positivo”, o que significa que a demanda por água subterrânea está muito alta. Em meados de julho, o consumo foi maior do que nunca, nos 71 anos de história da associação.
Ela apelou aos consumidores para serem mais econômicos, e reduziu a pressão da água. Mas Frerichs espera medidas adicionais: “Dentro de 50 anos, os clientes aqui poderão estar vivendo num clima como o de Toulouse [Sul da França], hoje. Precisamos melhorar nossas estações de tratamento para produzir mais água.”
Como Rechenberg, da UBA, quase todos os especialistas, concordam que ainda não há escassez d’água na Alemanha. De fato, o país não sofre o chamado estresse hídrico, que, segundo a UBA, significaria “um risco crescente de problemas ambientais e dificuldades econômicas”.
“Não há razão para pânico ou medidas radicais”, frisa Rachenberg. “Contudo está mais do que na hora de começarmos a implementar programas para que no futuro continuemos a ter água de qualidade em nossas torneiras.”
O Diálogo Nacional da Água, com representantes de vários grupos, como agricultores e associações industriais, tem sido realizado em intervalos regulares há dez meses, organizado pelo Ministério alemão do Meio Ambiente. A meta é, até o terceiro trimestre de 2020, desenvolver a estratégia de longo prazo com o promissor nome “Futuro: Água”.
Fonte: Deutsche Welle