Furacões são as maiores e mais violentas tempestades do planeta e a cada ano, entre os meses de junho e novembro, afetam a região do Caribe, do Golfo do México e da costa leste dos Estados Unidos. A depender de sua força, podem arrasar populações e cidades inteiras.
Seus homólogos são os tufões, que afetam o noroeste do oceano Pacífico, e os ciclones, que ocorrem no sul do Pacífico e no oceano Índico.
Todos eles são ciclones tropicais, mas o nome furacão é usado exclusivamente para os do Atlântico norte do nordeste do Pacífico.
Uma bomba de energia
O mecanismo mais comum de formação de furacões no Atlântico — que provoca mais de 60% desses fenômenos — é uma onda tropical.
A onda começa como uma perturbação atmosférica que cria uma área de relativa baixa pressão. Isso acontece geralmente no leste da África, a partir de meados do mês de julho.
Se essa área de baixa pressão encontra as condições adequadas para se manter e se desenvolver, ela começa a mover-se de leste a oeste, com a ajuda dos ventos alísios.
Quando chega ao oceano Atlântico, a onda tropical pode ser o início de um furacão, mas, para que ele se forme, precisa de fontes de energia, como a umidade, o calor e o vento adequados.
Em concreto, é preciso que a temperatura da superfície do oceano seja superior aos 27º C, assim como a da camada de água que se estende por pelo menos 50 metros logo abaixo da superfície.
Também são necessários tipos de vento específicos. Por um lado, ventos com rotação horizontal, para que a tempestade se concentre.
Por outro, é preciso que os ventos subindo a partir da superfície do oceano mantenham sua força e velocidade constantes.
Se houver cortante de vento, ou seja, variações no vento com a altura, isso pode interromper o fluxo de calor e umidade que faz com que o furacão tome forma.
Também é preciso que haja uma concentração de nuvens carregadas de água e alta umidade relativa na atmosfera.
Tudo isso precisa ocorrer nas latitudes adequadas, em geral entre os paralelos 10° e 30° do hemisfério norte, já que nesta região o efeito da rotação da Terra faz com que os ventos possam convergir e ascender ao redor da área de baixa pressão.
Quando a onda tropical encontra todos estes ingredientes, cria-se uma área de cerca de 50 a 100 metros, onde eles começam a interagir.
“O movimento da onda tropical funciona como o disparador dessa tempestade”, explicou à BBC News Brasil Jorge Zavala Hidalgo, coordenador geral do Serviço Meteorológico Nacional do México.
E esta tempestade funciona como um catalisador: começa um balé de calor, ar e água.
A área de baixa pressão faz com que o ar úmido e quente que vem do oceano suba e se esfrie, o que alimenta as nuvens.
A condensação desse ar libera calor e faz com que a pressão sobre a superfície do oceano baixe ainda mais, o que atrai mais umidade do oceano, fortalecendo a tempestade.
Os ventos convergem e ascendem dentro desta área de baixa pressão, girando em direção contrária às agulhas do relógio — por influência da rotação da Terra.
É essa rotação que dá aos furacões sua imagem característica.
À medida em que a tempestade fica mais poderosa, o olho do furacão, uma área central de até 10 km permanece relativamente tranquilo.
Ao seu redor se levanta a parede do olho, composta de nuvens densas, onde ficam os ventos mais intensos. Para além dela, ficam as faixas em forma de espiral, onde há mais chuvas.
A velocidade dos ventos é a que determina em que momento podemos chamar esse fenômeno de furacão. Em seu nascimento é uma depressão tropical, quando sua força aumenta passa a ser uma tempestade tropical e se torna um furacão quando passa dos 118 km/h.
A partir daí, eles podem ser classificados em cinco categorias segundo a velocidade sustentada de seus ventos. Para medir o poder destrutivo dos furacões do Atlântico, se utiliza a escala Saffir-Simpson.
A força dos ciclones tropicais é tanta que seus ventos poderiam produzir energia equivalente a quase a metade da capacidade de geração de eletricidade do mundo inteiro, segundo a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês).
No entanto, os principais responsáveis pela destruição e pela perda de vidas quando passa um furacão são as marés de tempestade nas cidades costeiras e as inundações provocadas pelas chuvas que ele traz.
Nos Estados Unidos, por exemplo, as marés de tempestade foram responsáveis por quase a metade das mortes relacionadas aos ciclones tropicais do Atlântico entre 1963 e 2012, segundo dados da Sociedade Americana de Meteorologia.
Além destes fatores, a destruição causada por um furacão depende de outras circunstâncias, como a velocidade com a qual ele passa, a geografia do território e a infraestrutura da região afetada.
“Não necessariamente a destruição ou o perigo associados a um ciclone tropical correspondem a sua categoria. Por exemplo, um ciclone de categoria maior não tem por que ter mais chuva”, disse Jorge Hidalgo à BBC News Brasil.
México, Estados Unidos e Caribe: as zonas mais vulneráveis
Um dos fatores que explica que essa região seja mais propensa a receber furacões é que o oceano Atlântico, nas latitudes tropicais, tem a temperatura adequada para sua formação durante mais meses no ano.
Outro fator é a circulação dos ventos que empurram os furacões.
Os ventos alísios, principais ventos nas latitudes baixas tropicais, vão de leste a oeste, levando os ciclones até as costas do Caribe, do Golfo do México e dos Estados Unidos.
O percurso destes ventos também é influenciado pela rotação da Terra — o chamado efeito de Coriolis — que faz com que eles tendam a desviar-se em direção ao norte.
Normalmente, enquanto os furacões avançam, eles também se deslocam levemente para o norte.
Ao passar do paralelo 30°N, costumam encontrar-se com os ventos do oeste, outra das grandes correntes globais de ventos, que faz com que passem a ir em direção à leste. Daí por diante, se afastam do continente americano.
Mas em seu caminho, ainda no oceano Atlântico, os furacões se encontram com o enorme anticiclone das Bermudas-Açores, que pode determinar se eles vão se dirigir ao Golfo do México, ao Caribe ou aos Estados Unidos.
Os anticiclones são regiões de alta pressão atmosférica com ar mais seco, menos nuvens e ventos que giram na direção das agulhas do relógio no hemisfério norte.
O anticiclone dos Açores funciona como uma espécie de obstáculo que domina a parte norte do oceano Atlântico. Para avançar, os furacões precisam passar ao redor dele.
É por isso que o tamanho e a posição desse anticiclone podem influenciar a trajetória de um ciclone tropical.
Se o anticiclone está mais fraco e mais posicionado à leste, os furacões o rodeiam e seguem para o norte, se distanciando do Caribe.
Se, pelo contrário, ele estiver mais forte e mais posicionado ao sul e ao oeste, um furacão que passa ao redor dele acaba indo para o Golfo do do México, o sul dos Estados Unidos ou as ilhas caribenhas.
A posição do anticiclone muda de acordo com o ano, com as estações e pode variar também em questão de dias.
“Por causa dessas variações, um furacão pode ter uma trajetória muito diferente hoje do que outro que passar apenas três ou cinco dias depois”, explica Jorge Zavala Hidalgo, do Serviço Meteorológico Nacional do México.
Seguindo a mesma lógica, os anticiclones podem fazer com que furacões que já estão se afastando das Américas voltem atrás. Foi o que aconteceu com o furacão Sandy, em 2012.
Depois de tocar terra em Cuba, Sandy começou a se deslocar em sentido nordeste, afastando-se do continente. Mas um anticiclone na Groenlândia e uma frente fria bloquearam seu caminho. Isso fez com que ele voltasse para a costa leste dos Estados Unidos, causando destruição nos Estados de Nova York e Nova Jérsei.
A razão pela qual furacões são raros na América do Sul
Se a parte norte do Atlântico oferece as condições ideais para a formação de furacões, o mesmo não ocorre abaixo da linha do Equador.
“O Atlântico Sul é mais tranquilo porque lá não há onda tropical — é um fenómeno mais comum no hemisfério norte — e há mais variações na velocidade e na direção do vento, algo que inibe a formação de furacões”, disse à BBC News Brasil Gary M. Barnes, professor aposentado da Universidade do Havaí, nos Estados Unidos.
Além disso, os ciclones tropicais não costumam se formar se estiverem a menos de 500 quilômetros da linha do Equador, seja para o norte ou para o Sul.
Isso acontece porque, nessa faixa, o efeito de Coriolis é muito fraco para fazer com que os ventos girem e possam formar uma tempestade.
Apesar de depressões e tempestades tropicais já terem sido registrados no sul do Brasil, o único ciclone tropical registrado oficialmente na região foi o Catarina, em 2004.
O furacão atingiu o Estado de Santa Catarina, deixando mais de 10 mortos e mais de 500 feridos, além de cerca de 30 mil pessoas desabrigadas.
“Os ciclones nessa região costumam ser extratropicais, ou seja, que ocorrem em latitudes médias e têm núcleo frio. O Catarina foi assim. Mas ele adquiriu características de ciclone tropical e se tornou um furacão, algo que é raro de acontecer”, explicou à BBC News Brasil José Manuel Gálvez, meteorologista do Centro de Previsão Climática da NOAA.
A mudança climática pode impactar a formação de furacões?
“A mudança climática faz com que a temperatura da superfície e da capa espessa do oceano fiquem mais altas, e isso é um problema. Temos teorias que dizem que se o oceano ficar mais quente, isso pode se traduzir em tempestades mais fortes e intensas”, diz Gary Barnes.
Há indicações de que as áreas em que os ciclones tropicais encontram condições para se desenvolver e para sobreviver também estão ficando mais extensas ao longo do tempo, segundo Jorge Hidalgo, do Serviço Meteorológico do México.
“Talvez o número de ciclones não aumente, mas a distribuição de categorias pode mudar. Ou seja, podemos ter mais furacões de categoria maior e menos de categoria menor”, afirma.
Os cientistas concordam, no entanto, que é cedo para medir o impacto da mudança climática no fenômeno.
“É provável que os furacões se intensifique pouco a pouco, mas vamos precisar de muitos dados para provar que o aquecimento global vai provocar furacões mais fortes. Em 25 anos pode ser que tenhamos provas”, conclui o meteorologista Gary M. Barnes.
Fonte: G1