O presidente Jair Bolsonaro anunciou nesta quarta-feira (24/03) a criação de um comitê composto por representantes do governo federal, do Congresso e parte dos governadores para combater a covid-19, mais de um ano após o início da pandemia e no dia em que o país deve ultrapassar a marca de 300 mil mortos pela doença.
A decisão foi comunicada após reunião no Palácio da Alvorada com governadores de seis estados, ministros, o vice-presidente Hamilton Mourão e os presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux.
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Bolsonaro, que durante a pandemia confrontou governadores e prefeitos em relação a medidas de distanciamento social, recusou possibilidades de contratos antecipados com produtores de vacina e estimulou o uso de medicamentos não eficazes contra a doença, está sob pressão de setores do Congresso que apoiam a sua gestão para reagir à alta constante de novos casos e mortes diários e despolitizar o enfrentamento da covid-19.
Com os sistemas de saúde em colapso em diversos estados, o Brasil é hoje o principal epicentro mundial da pandemia e lidera disparado em número de novas mortes diárias. Na segunda-feira, 26% das pessoas que morreram no mundo com covid-19 estavam no país, ou uma a cada quatro.
O país também tem uma das maiores incidências de novas mortes por dia por milhão de habitantes, que já considera o tamanho da população de cada país. Na segunda-feira, essa taxa no Brasil era de 10,9, 60% acima da média da América do Sul e mais que o dobro da registrada na União Europeia. Para 79% dos brasileiros, a pandemia está fora de controle no país.
“A vida em primeiro lugar. Resolvemos, entre outras coisas, que será criada uma coordenação junto aos governadores com o senhor presidente do Senado Federal. (…) Sem que haja qualquer conflito, sem que haja politização, creio que seja esse o caminho para o Brasil sair dessa situação bastante complicada que se encontra”, disse Bolsonaro. Ele afirmou que o comitê se reunirá semanalmente para “decidirmos ou redirecionarmos o rumo do combate ao coronavírus“.
Esboço de coordenação
O encontro desta quarta foi organizado por Bolsonaro para tentar demonstrar coordenação de ações de combate à pandemia, ao mesmo tempo em que compartilha a responsabilidade pela gestão da crise com os governadores.
A baixa adesão de representantes dos governos estaduais na reunião, porém, joga dúvidas sobre a efetividade do comitê. Participaram do encontro os governadores Ronaldo Caiado (Goiás), Wilson Lima (Amazonas), Romeu Zema (Minas Gerais), Ratinho Júnior (Paraná), Marcos Rocha (Rondônia) e Renan Filho (Alagoas). Nenhum deles faz oposição declarada a Bolsonaro.
Em diversos momentos ao longo da pandemia, o presidente investiu contra o sistema federativo e contestou decisões de governadores e prefeitos que estabeleceram restrições ao comércio e à circulação de pessoas para reduzir a contaminação do vírus, medida considerada essencial por epidemiologistas.
O lance mais recente dessa estratégia de confronto ocorreu na semana passada, quando o presidente acionou o STF para tentar derrubar decretos dos governos do Distrito Federal, da Bahia e do Rio Grande do Sul que determinaram restrições de circulação de pessoas. O pedido foi negado nesta terça-feira, em caráter liminar, pelo ministro Marco Aurélio Mello.
Após a reunião desta quarta, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que a liderança para buscar uma coordenação de esforços no combate à pandemia deve ser de Bolsonaro.”Essa união significa um pacto nacional liderado por quem a sociedade espera que lidere, que é o presidente da República”, afirmou.
O presidente do Supremo, Luiz Fux, disse que a Corte não participará do comitê, mas buscará formas de agilizar as decisões em processos judiciais que tratem do combate à pandemia.
“Tratamento precoce” e vacinação
Ao sair da reunião, Bolsonaro voltou a mencionar um suposto “tratamento precoce” contra a covid-19, conjunto de medicamentos que não tem eficácia contra a doença, como a cloroquina e a ivermectina, e que pode levar a outras complicações de saúde se usado indiscriminadamente.
“Tratamos também de possiblidade de tratamento precoce. Isso fica a cargo do ministro da Saúde, que respeita o direito e o dever do médico off-label de tratar os infectados”, afirmou o presidente.
Na terça-feira, a Associação Médica Brasileira pediu o banimento do uso de remédios sem eficácia contra a doença. O anúncio marcou uma virada no posicionamento da entidade, que vinha defendendo o direito de os médicos terem “autonomia” para receitar os remédios que julgassem adequados para seus pacientes.
O presidente também não mencionou em sua fala nesta quarta a necessidade de as pessoas fazerem isolamento social para evitar a propagação do vírus.
Bolsonaro defendeu, porém, a importância de acelerar o programa de vacinação, em meio a atrasos constantes na entrega dos imunizantes. O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que tomou posse nesta terça, defendeu também uma coordenação entre União, estados e municípios para ampliar a vacinação nos próximos meses.
Na terça-feira, Bolsonaro fez um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV no qual tentou defender as ações do governo no combate à crise, mas mentiu e distorceu dados sobre as decisões do governo em relação à compra e aplicação de vacinas.
Fonte: Deutsche Welle