Ferramentas de pedra no Piauí foram feitas por macacos-prego, sugere estudo

Artefatos de sítios do período Pleistoceno, que se acreditava serem dos primeiros humanos das Américas, na realidade teriam sido feitos pelos animais há 50 mil anos

Macaco-prego quebrando nozes usando uma pedra como martelo e outra maior como bigorna no Nordeste do Brasil – FOTO: Tiago Falótico/CONICET

Ferramentas de 50 mil anos descobertas em escavações no Piauí e que se acreditava terem sido feitas por humanos antigos, na verdade, teriam sido criadas por macacos-prego (Sapajus) no passado. É o que sugere um estudo publicado em 15 de novembro de 2022 na revista The Holonece.

Os itens foram encontrados em 800 sítios pré-históricos do Pleistoceno que se acreditava terem sido lares de hominídeos. Entre eles, os sítios de Pedra Furada, Sitio do Meio, Vale da Pedra Furada e Toca da Tira Peia.

“Estamos confiantes de que os primeiros sítios arqueológicos do Brasil podem não ser de origem humana, mas podem pertencer a macacos-prego”, escreveram Agustín M. Agnolín e Federico L. Agnolín, autores do estudo que atuam no Instituto Nacional de Antropologia e Pensamento Latino-americano (CONICET), na Argentina.

Ao compararem os fragmentos de pedra de quartzito e quartzo com ferramentas atualmente feitas por macacos-prego no Parque Nacional da Serra da Capivara, também no Piauí, os pesquisadores encontraram semelhanças notáveis.

Segundo eles, os sítios do Piauí compartilham com os locais dos macacos a ausência de “atributos humanos inequívocos” como lares, ossos marcados, matérias-primas exóticas e vestígios de comportamento simbólico.

Instrumentos de martelar pedras usados ​​por macacos-prego no Brasil — Foto: Tiago Falótico

“Nosso estudo mostra que as ferramentas da Pedra Furada e de outros sítios próximos no Brasil nada mais eram do que o produto de macacos-prego quebrando nozes e pedras cerca de 50 mil anos atrás”, concluiu Agnolín em entrevista ao site Artnet News.

Além de usar rochas como martelos para quebrar nozes, os macacos também usaram pedras para cavar e comer sementes e frutas, até mesmo lambendo a poeira para adicionar minerais às suas dietas. As fêmeas jogam os objetos em parceiros para demonstrar interesse sexual.

A hipótese de que os animais eram responsáveis ​​pelos depósitos líticos de aparência humana foi levantada pela primeira vez em 2017 pelo arqueólogo Stuart J. Fiedel na revista PaleoAmerica, observando que os macacos-prego podem estar usando ferramentas há 100 mil anos.

A: artefatos do Vale da Pedra Furada; B: artefatos da Toca da Tira Peia (ambos no Piauí) — Foto: Elsevier

As novas descobertas podem ter um grande impacto em nossa compreensão de quando os primeiros humanos chegaram às Américas. Os achados vão de encontro com uma teoria que há muito sustentava que as geleiras impediram a colonização significativa do Hemisfério Ocidental até cerca de 14 mil anos atrás.

Esta hipótese é conhecida como teoria do “Clóvis primeiro”, pois se refere à cultura Clóvis, supostamente o povo mais antigo das Américas, cujos artefatos foram encontrados perto da cidade de Clovis, nos Estados Unidos.

Nas últimas décadas, sítios arqueológicos como o complexo Buttermilk Creek, nos Estados Unidos, que tem evidências de humanos que datam de 15 mil anos, e Monte Verde, no Chile, datado de 18,5 mil anos atrás, desafiaram essa hipótese, sugerindo uma presença humana pré-Clóvis.

Mas o estudo das ferramentas dos macacos-prego do Brasil indica que os humanos chegaram mais recentemente nas Américas. “Nosso trabalho reforça a ideia de que o assentamento humano nesta parte do continente americano é mais recente e está de acordo com os estudos que determinam sua chegada cerca de 13 mil ou 14 mil anos antes do presente”, disse Agnolín.

Fonte: Galileu