ENTREVISTA EXCLUSIVA: Francisco Simeão Rodrigues Neto

Mônica Pinto / AmbienteBrasil

Francisco Simeão Rodrigues Neto é presidente da Associação Brasileira da Indústria de Pneus Remoldados – ABIP – e o principal responsável pela iniciativa de elaboração e aprovação da atual legislação – Resolução CONAMA nº 258/99 – que obriga os fabricantes e importadores de pneumáticos a coletar e destruir, de forma ambientalmente adequada, os pneus inservíveis existentes no território nacional, na proporção em que cada um participa do mercado brasileiro.

Ex-secretário de Indústria e Comércio do Estado do Paraná, em 1983, no governo José Richa, hoje ele é também presidente da BS Colway Pneus, principal indústria de pneus remoldados do Brasil, localizada em Piraquara, num terreno com 130 mil m2 de área, onde a empresa recuperou e mantém um bosque com 80 mil m2.

Brasileiro, natural de Londrina, casado e pai de três filhos, o empresário demonstra seu pendor para a responsabilidade social/ambiental ainda em outra vertente: junto com o sócio, Luiz Bonacin Filho, ele criou, em 93, o Projeto Bom Aluno, que apóia crianças carentes em seu desenvolvimento escolar, a partir da 5ª série do Ensino Fundamental, até a universidade. Selecionadas entre as de melhor desempenho nas escolas públicas e oriundas de famílias de baixa renda, as crianças recebem como complemento à educação formal, aulas de computação, línguas estrangeiras e reforço escolar, o que garante a marca de 100% de aprovação no vestibular, mantida já há oito anos, desde que o primeiro bom aluno prestou o concurso. Já são 159 os alunos aprovados no vestibular e 35 formados.

Francisco Simeão é o criador do programa Rodando Limpo, que já recolheu do meio ambiente e reciclou de forma ambientalmente adequada mais de 8,5 milhões de pneus inservíveis. Nessa entrevista, ele revela novas perspectivas para esta ação.

AmbienteBrasil – Como nasceu a idéia do programa Rodando Limpo e quando ele foi lançado?
Francisco Simeão Rodrigues Neto –
Em 1998, elaboramos texto/sugestão de Resolução, que levamos pessoalmente ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), em reunião plenária, sugerindo que lá fosse formado um grupo de trabalho para avaliar a oportunidade de sua edição.
Constituído o Grupo de Trabalho sugerido, dele participamos voluntariosamente até que fosse estabelecido texto consensual, para ser levado à apreciação de todos os Conselheiros, em reunião plenária.
Precedente à reunião citada, conversamos com a maioria dos conselheiros de cada Estado, procurando com nossos argumentos demonstrar a eles que a exigência de contrapartida ambiental proposta era viável de ser cumprida e seu cumprimento da parte de importadores e fabricantes de pneus, igualmente, seria a solução para o problema do “lixo-pneu” e também um passo importantíssimo para erradicar a dengue no Brasil.

AmbienteBrasil – E a receptividade à proposta?
Francisco –
Culminou com a Resolução Conama nº 258/99 sendo aprovada em 26.08.99 (DOU 02.12.99). Ela estabeleceu a obrigação aos importadores e fabricantes de, em síntese, coletar no território brasileiro e destruir, de forma ambientalmente adequada, um pneu para cada outro colocado no mercado brasileiro, obrigação esta exigida a partir de primeiro de janeiro de 2002, para que as empresas responsabilizadas tivessem tempo de se adequar.
Foi quando nos demos conta de que os debates sobre pneus velhos promoviam uma incandescência rara em qualquer fórum, chamando a atenção da sociedade. A partir de tal percepção, decidimos utilizar o tema “pneus velhos” como alavanca para chamar a atenção das comunidades, incluindo a coleta de outros resíduos sólidos, tudo através de coletadores organizados em associações constituídas com nossa ajuda, muitos deles tornando-se verdadeiros agentes de saúde e da defesa do meio ambiente honorários, que esclarecem às donas de casa as tarefas – todas simples – que devem ser realizadas para o efetivo combate do mosquito Aedes aegypti, que transmite a dengue e a febre amarela urbana.

AmbienteBrasil – Qual foi a primeira experiência concreta do projeto?
Francisco –
Inicialmente em parceria com a Prefeitura de Curitiba, integrando os esforços da Secretaria Municipal de Saúde e a da Educação, a custo zero para o erário, criamos o CURITIBA RODANDO LIMPO, que o prefeito Cássio Taniguchi levou para o Fórum Rio +10, Eco 2002, onde foi aplaudido pela ONU e está sendo recomendado a seus países membros como exemplo de ação de compromisso pós-consumo.

AmbienteBrasil – Como funciona exatamente o programa?
Francisco –
Conforme Termo de Compromisso, assinado entre o Governo do Estado do Paraná, a BS Colway e várias entidades, a tarefa foi assumida em MUTIRÃO, onde as Secretarias Municipais de Saúde e a Estadual, bem como as da Educação, realizam o trabalho que até então vinham realizando e mais algumas ações importantes para a tarefa assumida, sempre sem custos adicionais, enquanto a BS Colway realiza o trabalho de treinamento dos atores do Programa nas sedes de região de todos os municípios do Paraná, integrando os esforços de todos, incluindo o das prefeituras e associações comerciais, imprensa, rádios e outros meios de comunicação, mobilizando a sociedade para a realização das cerca de vinte tarefas orientadas pela Secretaria Estadual de Saúde, todas simples, porém trabalhosas quando se considera a necessidade de realizá-las ao mesmo tempo em todas as residências do Estado.
Os pneus inservíveis são coletados pelos coletadores de resíduos sólidos, que recebem um bom valor em seu pagamento, criando enorme interesse em coleta por se tornar uma commodity, a exemplo da latinha de alumínio, que por esta razão desapareceu do meio ambiente. A tarefa da CiaBrasil, OSCIP integrada ao projeto, é viabilizar negócios para os coletadores, para que se interessem à coleta de garrafas do tipo PET, de papel, papelão, vidros e plásticos, enfim, promovendo um saneamento no que se refere aos resíduos sólidos existentes em todo o território.

AmbienteBrasil – Em que estados o Rodando Limpo já foi implantado?
Francisco –
Paraná, Paraíba e Pernambuco.

AmbienteBrasil – Há perspectivas de expansão em breve para outras localidades?
Francisco –
A previsão é implantar, no prazo de 45 dias, no Ceará. Até o final do próximo ano, estará implantado na Bahia, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte, Piauí, Maranhão, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A perspectiva é que nos próximos três anos todos os Estados brasileiros sejam alcançados pelo programa RODANDO LIMPO.

AmbienteBrasil – Os poderes públicos são sempre parceiros na iniciativa? Têm demonstrado sensibilidade em relação a esse problema?
Francisco –
Sim. É importante a participação do poder público, integrando as tarefas que realiza com as ações que orienta ao RODANDO LIMPO, para que seja possível potencializar os resultados.

AmbienteBrasil – Afora os benefícios ao meio ambiente, o programa também viabiliza algum ganho econômico para os envolvidos?
Francisco –
A BS Colway, ao contrário de auferir qualquer benefício pecuniário, só tem custos com o RODANDO LIMPO, que desenvolve a título de “um dos compromissos que assumiu com a sociedade”, dentre os assumidos em OS CINCO FUNDAMENTOS DA BS COLWAY.
Os humildes coletadores de resíduos sólidos são os que mais se favorecem com o RODANDO LIMPO, quando passam a auferir renda digna, para que possam resgatar sua cidadania. As empresas cimenteiras, que assumem os maiores encargos financeiros, se beneficiam da economia dos custos do coque importado, que é substituído nos fornos de clínquer por pneus picados, com vantagem de poder calorífico.

AmbienteBrasil – Uma iniciativa como essa pode resolver por completo o problema da destinação de pneus inservíveis?
Francisco –
(enfático) Essa iniciativa vai resolver plenamente o problema da coleta e destinação de pneus inservíveis no Brasil. E o que é muito importante: a custo zero para o erário – municipal, estadual e federal.

AmbienteBrasil – Quais as maiores dificuldades no processo de implantação do Rodando Limpo?
Francisco –
O Ministério do Meio Ambiente e o Ibama, que durante todo o tempo combatem a liderança do RODANDO LIMPO.

AmbienteBrasil – Em locais onde não há indústria cimenteira, os obstáculos são maiores?
Francisco –
Sim. Porém, como as cimenteiras de várias empresas estão geograficamente instaladas de forma a que se organize, de forma razoavelmente econômica, o transporte a cada uma de suas fábricas, no conjunto o RODANDO LIMPO se viabilizará em todo o território brasileiro.

AmbienteBrasil – As fábricas e/ou importadoras de pneus estão agindo em conformidade com as determinações da Resolução 258/99, do Conama, que as obriga a “coletar e dar destinação final, ambientalmente adequada, aos pneus inservíveis existentes no território nacional”?
Francisco –
Todos os importadores estão cumprindo sua obrigação ambiental estabelecida na Resolução Conama 258/99, principalmente, ou talvez, unicamente, porque a liberação das importações está condicionada à prova ao Decex (Departamento de Operações de Comércio Exterior) de que tal encargo foi cumprido face ao Ibama.
Quanto às empresas fabricantes, elas não cumprem sequer a metade de sua obrigação, tendo sido, por esta razão, multadas pelo Ibama depois que a ABIP (Associação Brasileira da Indústria de Pneus Remoldados) ingressou com Representação Criminal contra seus presidentes, por crime contra o meio ambiente e contra o presidente do Ibama, por crime de prevaricação, por não fiscalizá-las, como deveria. A planilha abaixo mostra o valor das multas, bem como a quantidade equivalente em pneus de automóvel: