OPINIÃO: A ECOLOGIA QUE EMBURRECE!

por Luciano Pizzatto(*)

Milênios de evolução nos trouxeram ao magnífico momento da ecologia ser pauta integrada das demais funções como a social e econômica, onde toda história de erros e acertos pode ser revista e a ciência aplicar o conhecimento, desde na recusa de modelos energéticos até a urbanização ou o uso do meio rural.

No Brasil, com milhões de profissionais das áreas da Engenharia a Biologia, pesquisadores ou detentores do conhecimento experimental da vida, como aqueles que vivem e sobrevivem junto à natureza, seja nas florestas amazônicas aos campos de produção intensiva de soja que criaram o plantio direto ou o manejo de micros bacias, sinto a frustração de estarem se submetendo a estatização do conhecimento e a normatização dos procedimentos, como se a vida fosse homogênea.

Um país, que difunde ter a maior diversidade, seja biológica a cultural, com bilhões de espécies da fauna a flora, ainda se depara com a mesmice de achar que para um país diverso e heterogêneo, pode adotar uma lei homogênea e imutável de controle do ambiente a exemplo dos limites das APPs ou abandonar milhões de ribeirinhos proibindo genericamente o uso de várzeas ou os apicuns pré mangues.

Triste cena dividir o ambiente florestal carente de recursos para sua conservação com milhões de árvores mortas limitada ilegalmente de corte sob alegação de que sua queda será traumática ao meio, quando na maioria dos casos é necessária a este meio, com a abertura do dossel e insolação, ao estimulo do ser heliófilo, da diminuição da concorrência ou do uso do conhecimento silvicultural do homem para devolver o recurso utilizado na forma de enriquecimento. Ver capacidade imensa da carcinicultura ou da própria piscicultura presa a idolatria de um ecossistema, que se realmente cuidado e conservado em um vasto percentual pode e deve ser utilizado em parcelas onde o conhecimento sabe de qual forma.

O discurso do medo do erro, da dúvida, criado pelo caos da leitura equivocada do princípio 15 da Agenda 21, o Princípio da Precaução, originalmente construído com a ressalva de só poder ser aplicado se as partes suportarem economicamente as restrições e sobre dúvidas fundadas, chega ao ápice de exigir uma verdade verdadeira, algo do campo teológico junto a Deus, onde a ciência só sobrevive no caminho contrário do erro e acerto, da experimentação e da constante dúvida.

Afastar a certeza momentânea é impedir que se descubra suas dúvidas intrínsecas continuando o permanente processo evolutivo da vida. É voltar ao obscurantismo.
No Brasil, vivemos uma ecologia que emburrece.

As frases de efeito e a lógica do tipo a terra é plana, se impõe sobre a difícil tarefa de dizer que já sabemos que a terra é redonda, agora sabemos que é levemente expandida na linha do equador, e no futuro talvez tenhamos de mudar tudo com inversões magnéticas ou mudanças geológicas.

No caráter de controle do poder público, um grupo acha ser detentor de todo conhecimento, com a capacidade de aprovar ou não aquilo que milhões de profissionais com curso superior, mestrado, doutorado, pós doutorado e a experiência prática afirmam. Não se conteve o Poder Público em criar limites e padrões para emissões e impactos ambientais. Chamou a si o direito de dizer se a atividade proposta serve e a colecionar toneladas de papel de descrições já conhecidas e repetidas e muito pouco de um novo saber.

Não determina a cor, densidade e sabor do café. Exige determinar também qual “coador” deve ser usado, recriando o paradigma de que a ordem dos produtos na soma e subtração não altera o resultado.

Na nossa ecologia, para alguns, a ordem dos produtos altera a equação, e ponto final! E como é simples explicar isto para sociedade do que fundamentar na matemática básica o efeito da falta de ordem em uma equação da adição e subtração.

Alguns sussurros de revolta surgem nas entidades de classe. Outros responsáveis por órgãos públicos ousam dizer que o modelo é necessário, mas está errado e precisamos rever. Temos de ter o Poder Público fazendo sua parte no tocante a informações, zoneamento e fomento as atividades sustentáveis, em detrimento ao falido modelo só de licenciamento e fiscalização.

A Lei de crimes ambientais foi mutilada por um decreto que criou inúmeros outros tipos penais, colocando sob solo infértil, o princípio da pré existência da lei, e a justiça frente a uma comunicação incrível de fatos muitas vezes não relacionados à ecologia, teme até discordar de tal arbitrariedade.

Tentativas de organizar a fiscalização, obrigando respeitar e ouvir os responsáveis técnicos são descumpridas pelo próprio órgão federal, e absolutamente nada é feito. O fim tem justificado os meios, e uma passagem pelo “youtube” vendo vídeos de fiscalização do tipo “rambo” ou “tropa de elite” já seria caso de direitos humanos para uma corte internacional. Só que estamos salvando o planeta, então tudo pode.

Cidades esbarram em limitações de uma lei feita para o meio rural, desde sua mensagem original há décadas, até a tramitação limitada a agricultura.  E arquitetos, engenheiros, sanitaristas, geólogos, e tantos outros consultam o departamento jurídico e não mais os laboratórios de pedologia, botânica ou outros para suas decisões.

Neste marasmo não precisamos de revoluções. Basta passarmos a coexistir e respeitar os seres humanos como indivíduos de princípio bons, e os maus frutos de exceções ou falta de orientação. Desburocratizar a ciência ambiental, e fomentar o uso do que sabemos e a busca de soluções pela experimentação das dúvidas.

Parar de impedir o uso até de animais atropelados para que sedentos estudantes de veterinária possam aproveitá-los em estudos e com isto depois ajudar os outros ainda vivos a sobreviverem em nosso meio. Falar a verdade do que já sabemos. Dizer que a água potável é um problema sem amedrontar pelo fim da água como molécula em respeito às leis da física, pelo menos. Fazer uma lista de espécies ameaçadas com caráter gênico e não ideológico ou de paixão. Dar transparência, respeitar princípios, o estado de direito e o tempo evolutivo da sociedade de modelos predatórios para outros menos agressivos.

Já passou do tempo para explicar que se criamos Unidades de Conservação – UCs, com justiça social ou não – outro assunto difícil – é porque as demais áreas são para uso flexível, dinâmico e não restringidas de forma tão ou mais limitantes do que as próprias UCs. Temos de usar a força policial e de controle para consolidar os milhões de hectares destas UCs, atraindo ainda a academia e seus pesquisadores e alunos para estes laboratórios naturais, e ainda se possível fiscalizar o privado, pois no atual modelo não fazemos nem um nem outro, e o bem público se transforma em terra de ninguém e o privado uma área de insegurança funcional e jurídica.

Por último, mas não o final, precisamos de homens públicos que sirvam a sociedade, e não que queiram que a sociedade os sirvam. De órgãos ambientais a serviço da população, porque se são tão importantes – e realmente são – a quase totalidade das pessoas que se relacionam com eles por necessidade ou mera busca de respostas não deveria temê-los ou odiá-los! É inexplicável, salvo não estarem cumprindo com suas metas.

Temos de falar menos de meio ambiente e reestudar o termo “ecologia”.

* Luciano Pizzatto, Eng. Florestal, Empresário do setor, Diretor de Parques Nacionais e Reservas do IBDF/IBAMA 88/89, Deputado de 1989/2003, detentor do Prêmio Nacional de Ecologia.