Infratores recorrem e não pagam multas por queimadas

O Ibama – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis, em Mato Grosso, recebeu em dinheiro apenas 0,03% do montante de multas aplicadas em 2004 por queima irregular. Dos R$ 15,62 milhões notificados no ano passado, foram pagos apenas R$ 6,15 mil ao Instituto. A razão para a impunidade indireta é o direito de defesa do infrator, que pode recorrer da multa em várias instâncias e protelar o pagamento.

O déficit de funcionários no órgão também justifica o pagamento retardado. De acordo com o analista ambiental da Divisão de Controle Operacional e Fiscalização, Eduardo Engelmamn, embora o prazo para julgamento do processo seja de 30 dias, a avaliação final pode demorar até três anos (ou mais). E mais: quando notificado, o infrator fica, teoricamente, impedido de explorar a área. Entretanto, o Ibama não acompanha a atividade na propriedade para verificar se a ordem está sendo cumprida. Novamente, a justificativa do órgão é a falta de fiscais para avaliar queimada ilegal. “Na verdade, autuamos, mas não temos controle para saber se ampliou ou não a área de queima”. Em geral, o retorno à propriedade ocorre apenas quando há denúncia.

Na contramão da queimada irregular (37 autos de infração correspondentes aos R$ 15 milhões), o número de documentos para a queimada legal é 2.593 para arrecadação de R$ 1,78 milhão. Apesar da quantia ser pequena, quando comparada às multas, vale lembrar que corresponde a mais da metade recolhida no Brasil (R$ 2,86 milhões). Isso se explica pelo preço da autorização. Enquanto a multa corresponde a no mínimo R$ 1 mil por hectare, a concessão é de R$ 3,5 (até 13 hectares, mais R$ 3,5 por hectare excedente).

Apenas o Ibama libera autorização para queimada no Estado. Diante da situação, em 2004, o órgão criou uma cartilha para orientar produtores rurais. Nela, há, além de informações gerais sobre o fogo, legislação, licença e preços de autorização e multa.

Indagada sobre o porquê dos grandes produtores rurais de grande porte queimarem mesmo em época proibitiva, a assessora jurídica da Famato – Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso, Elisete Araújo Ramos, responde que a maioria deles não ateia fogo propositadamente e que “ele pega” em circunstâncias imprevisíveis. “Tem muita gente que joga resto de cigarro pela janela na estrada”, exemplifica. Ela ainda diz que as condições naturais do Estado favorecem ao alastramento incontrolável das chamas. E, por fim, ela atribui a responsabilidade pela maior parte das queimadas aos assentados e aos pequenos produtores rurais.

É com indignação que Altamiro Stochero, líder do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, reage. “Isso é um absurdo. Os fazendeiros é que desmatam e desrespeitam a lei, eles é que sempre desrespeitaram as leis. Aliás, muitas vezes, quando os sem-terra são assentados na terra não encontram mais uma árvore se quer em cima dela, porque latifundiários já queimaram tudo”.

A assessoria jurídica da Famato admite que, “como em qualquer profissão”, há os grandes fazendeiros infratores e “que, mesmo sabedouros das regras, se arriscam, assim como médicos infratores”. Outra parte, diz ela, queima por desconhecimento mesmo.

Agricultura – A queima irregular em Mato Grosso está ligada ao avanço da fronteira agrícola. O analista ambiental da Divisão de Controle Operacional e Fiscalização do Ibama, Eduardo Engelmamn, explica que a maioria das multas são aplicadas a produtores rurais, que colocam fogo na propriedade para preparar solo antes do plantio. Para se ter uma idéia, as áreas onde mais houve registro de queima foram na agricultura (225 mil hectares) e pastagens (69,73 mil ha).

Quando notificado, o infrator pode recorrer ao pagamento da multa em 20 dias, apresentando uma defesa. Neste caso, o processo é encaminhado ao procurador do Ibama, que teoricamente teria 30 dias para julgar o processo. Até a avaliação final, o produtor só poderá queimar a área com recursos legais, como mandado de segurança.

Depois do julgamento no Ibama, o infrator ainda poderá recorrer ao presidente do Instituto, MMA – Ministério do Meio Ambiente e Conama – Conselho Nacional de Meio Ambiente. Porém, apenas os processos com multas acima de R$ 50 mil reais têm direito a estes recursos. Em 2004, apenas sete dos 37 autos de infração foram abaixo deste valor. Outra alternativa para o infrator é pagar a multa sem questionamento, com ganho 30% de desconto.

A briga judicial, conforme o analista, pode levar até 5 anos. Embora o Ibama não tenha dados sobre número de decisões favoráveis ou desfavoráveis, Engelmamn acredita que maior parte deles não recorram em todas as instâncias. “As justificativas são usadas na gerência regional”. (Graciele Leite – Gazeta Digital/MT)