Paula Rachel Rabelo Corrêa (*)
Araucaria angustifolia, também conhecida como pinheiro brasileiro, araucária ou pinho do Paraná representa mais de 40% dos indivíduos arbóreos da Floresta Ombrófila Mista (FOM), um dos mais exuberantes ecossistemas brasileiro, apresentando valores de abundância, dominância e freqüência bem superiores às demais espécies componentes desta associação. Neste ecossistema, a A. augustifolia ocorria naturalmente numa extensão de 200.000 mil Km2 entre a região sul e sudeste do Brasil, cobrindo, originalmente, 40% do estado Paraná, 31% de Santa Catarina, 25% do Rio Grande do Sul, e com manchas esparsas no sul de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Esta importante condição fitossociológica torna a araucária espécie referência da FOM. Por essa razão os estudos devem se concentrar nesta espécie pioneira de modo que os resultados encontrados podem ser extrapolados para todo o ecossistema.
Em termos históricos, a exploração da araucária foi mais intensa a partir de 1934, atingindo seu auge no período de 1950 a 1970. Até a década de 70, ela foi o principal produto brasileiro de exportação na área florestal, respondendo com mais de 90% da madeira remetida para fora do país. Além da sua relação de proximidade com o desenvolvimento do Brasil, houve tempos em que os produtores rurais tinham orgulho de ensinar aos seus filhos a plantar e a manter vários exemplares nas suas propriedades. O produtor sempre foi, na sua grande maioria, um preservador natural desta espécie e não o vilão de sua devastação como erroneamente se coloca hoje. Os grandes cortes desta espécie aconteceram no passado e foram impulsionados pela qualidade da madeira e pela facilidade de se obter matéria prima para o desenvolvimento deste país. Devemos mencionar, inclusive, a importância dessa matéria-prima na construção de Brasília.
Atualmente, sua devastação esta ligada a um total desconhecimento da sua variabilidade genética e a políticas públicas punitivas e preconceituosas com aqueles que sempre tiveram orgulho em preservar a espécie, mas que hoje, diante da legislação vigente, e por uma questão de sobrevivência, preferem não se envolver com a araucária. Como a espécie está colocada na lista de extinção, o produtor além de não poder aproveitar economicamente a extração de seus frutos (como o pinhão, por exemplo), ainda corre o risco de ter sua área declarada área de conservação. Diante deste quadro, ela perdeu totalmente sua sustentabilidade, que é a maneira mais barata e sensata de se proteger uma espécie.
Essa realidade precisa ser revertida porque compromete a preservação de uma das espécies florestais com maior potencial produtivo e econômico (papel, palito de fósforo, artesanato, ecoturismo, agronegócio, paisagismo, móveis, alimentação) do Brasil, mas que, infelizmente, não pode ser aproveitada por conta de uma lacuna a ser preenchida na legislação atual.
O cenário atual revela que as unidades de conservação existentes não estão sendo eficazes no cumprimento de suas funções, seja pela falta de regularização fundiária ou por carência de pessoal capacitado, ou até mesmo pelas precárias condições das instituições que deveriam zelar pela sua conservação. Aliado ao problema da legislação, a situação é ainda mais séria quando se avalia a mudança de comportamento cultural da população, que na atualidade, veem a araucária como uma praga e não como fonte de rentabilidade para sua propriedade.
A Araucária foi colocada na lista de espécies em extinção para supostamente ser protegida e para disciplinar a conservação e o uso do bioma da mata atlântica e seus ecossistemas, uma vez que não existiam critérios técnicos cientificamente embasados sobre a situação da espécie. Esta medida foi um verdadeiro tiro no pé, com as instituições públicas brasileiras insistindo em tentar reverter o desmatamento através de políticas repressoras, o que historicamente não funcionou em nenhum país onde estas medidas foram tomadas.
Para reverter este quadro é necessário cumprir com a Resolução nº. 317 do CONAMA que determina a elaboração de um plano Estadual, devidamente registrado no órgão ambiental competente para adequar a legislação vigente, e fixar critérios técnicos, cientificamente embasados que irão garantir a sustentabilidade da exploração comercial da espécie e ao mesmo tempo a manutenção da diversidade genética das populações, servindo de base para nortear políticas públicas e desenvolver estratégias de conservação e uso sustentável da espécie.
Esse estudo passa a ser instrumento indispensável para sobrevivência da espécie porque irá permitir que ela se torne auto-sustentável. Além disso, acredito que tal expediente deve ser combinando estratégias de conservação in situ e ex situ auxiliado por ferramentas moleculares. A conservação in situ permite preservar e estudar esta espécie no seu ambiente natural, formando um elo importante entre seus principais remanescentes. A conservação ex situ, por sua vez, é aconselhável porque ela pode garantir a sobrevivência da espécie e preservar a variabilidade genética existente nos fragmentos onde a conservação in situ não está garantida.
No entanto, para reverter o quadro calamitoso em se encontra a Araucária, ações rápidas de governo devem ser executadas paralelamente, como por exemplo: liberar o plantio comercial da espécie em áreas de agricultura, facilmente delimitadas pelo georeferenciamento via internet e de domínio público. Para melhorar o controle sobre as áreas liberadas para plantios comerciais, que não podem sobrepor às áreas de conservação, cabe ao estado disponibilizar imagens de satélite com alta resolução, dentro do bioma, que sofrem mais pressão antrópica e disponibilizar para o controle público as áreas onde os plantios estão liberados.
Com ações neste sentido teremos a população como parceira na conservação do nosso patrimônio florestal e participando justamente dos lucros e benefícios de possuir ecossistemas com tanta biodiversidade e que devem ser sustentavelmente utilizados para melhorar a qualidade de vida da nossa gente.
(*) Bióloga geneticista. Atualmente, faz doutorado na UFPR/ Embrapa Florestas na área de melhoramento florestal, com ênfase na seleção de resistência patógeno/hospedeiro. É sócia da Biogenomika Tecnologia em DNA, empresa incubada na UFPR. paularabelo@biogenomika.com.br