Voracidade do mercado chinês ameaça espécies em risco de extinção

A China é um dos principais países abastecedores e consumidores do mundo de espécies ameaçadas e, embora o governo tenha lançado uma campanha para frear esta tendência, os especialistas garantem que a solução está na educação. “Nunca vi uma campanha tão dura desde a aplicada em meados dos anos 80 para proteger o urso panda. Mas a chave é legislar e educar para reduzir a demanda”, assegurou nesta sexta-feira (15) à Agência EFE Craig Kirkpatrick, diretor da rede ecologista Traffic para o leste da China.

A publicidade é uma das melhores armas para conscientizar a sociedade sobre o perigo de um mercado que movimenta ao ano 160 bilhões de dólares no mundo todo. Como exemplo, Kirkpatrick recorreu a uma campanha imaginária na qual recém casados chineses posam sorridentes ao lado de uma massa ensangüentada de tubarões “mancos”.

Isso porque o hábito ancestral de consumir barbatanas de tubarão em ocasiões especiais como o casamento se tornou um dos melhores exemplos da voracidade dos chineses depois da decolagem econômica, que transformou o gigante asiático no principal mercado para o produto.

O responsável da Traffic, principal rede internacional de controle do comércio ilegal de espécies ameaçadas, falou na capital chinesa, Pequim, sobre a situação específica na China, depois do encerramento, quinta-feira (14), da reunião da Cites – Convenção Internacional sobre o Comércio de Espécies Ameaçadas da Fauna e Flora Silvestre, na Tailândia.

Na opinião do ecologista, a liberalização econômica, o surgimento de uma classe rica e as “frágeis e contraditórias” políticas explicam o papel central que a China assumiu no comércio ilegal de animais e plantas silvestres, muitos deles ameaçados de extinção e outros que perigam entrar na lista.

É o caso das tartarugas de água doce. Cerca de 90% das espécies vivem na Ásia e dois terços estão ameaçadas. Isso não impediu, porém, que elas se tornassem um ingrediente valorizado na China, onde são usadas no preparo de sopas exóticas. Os mesmos fatores citados por Kirkpatrick estão por trás do fato de a China ter desbancado o Japão no topo da lista de importadores de marfim ilegal e de madeira de espécies como o ágar, matéria-prima de incensos, cuja comercialização a reunião da Cites decidiu regularizar.

Os chineses não precisam esperar para conhecer as conseqüências da depredação do meio-ambiente. Basta relembrar experiências passadas com espécies como o almíscar, que praticamente desapareceu do território e é “procurado em outros países”, manifestou Kirkpatrick.

Algo parecido acontece com o uso incontrolado de plantas para a medicina tradicional; 40% das exportações procedem da China, com destino sobretudo a Coréia do Sul, Japão e Taiwan. Neste campo, a estratégia dos ecologistas é apoiar as pesquisas dos cientistas para encontrar substitutos efetivos destas plantas ou passar a cultivá-las, uma via que a Traffic acaba de introduzir na China depois de implantá-la na Coréia do Sul.

Apesar das sombras que ainda cobrem o gigante asiático em relação ao tráfico ilegal de espécies, Kirkpatrick garante que o governo chinês começou a dar passos positivos. “Há dois anos, quando lhes falávamos sobre o grave impacto da captura indiscriminada de animais e plantas sobre o meio-ambiente, eles se mostravam um pouco ofendidos. Mas agora começam a atuar, mostram um dinamismo que não tinham antes”.

A China tem pela frente o desafio de “utilizar o poder do mercado e converter os consumidores em agentes da mudança, nos principais protetores da natureza”, cumprindo, assim, um dos pensamentos de Mao Tsé-tung, que pregava a necessidade de “transformar sua principal fraqueza em sua principal fortaleza”, concluiu Kirkpatrick. (Terra.com)