As fronteiras da devastação na Amazônia estão se ampliando para além do arco do desmatamento. Segundo um levantamento inédito do Imazon – Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia obtido pela Folha de São Paulo, pelo menos 15% da perda de cobertura florestal de 2001 a 2003 ocorreu numa faixa de 3.000 km que vai da Terra do Meio, no Pará, a Lábrea, sudoeste do Amazonas.
Nessas áreas, o desmatamento está fortemente associado à grilagem de terras públicas e à expansão de estradas clandestinas – estas, resultado da ação de madeireiros e garimpeiros ilegais. Os pesquisadores do Imazon estimam, com base em imagens de satélite e dados obtidos em campo, que haja mais de 90 mil km de estradas informais na região.
“Ficamos surpresos. Achávamos que seriam 40 mil km”, disse à Folha de São Paulo o engenheiro florestal Adalberto Veríssimo, do Imazon. Ele é um dor autores do estudo, coordenado por Carlos Souza Júnior e Amintas Brandão.
Quatro frentes de expansão, nas quais não havia perda significativa de floresta em 2001, passaram em 2003 a responder por 10 mil km2 de desflorestamento, contra um total de 65 mil km2 para toda a Amazônia nesse período.
As frentes correspondem, no Pará, à Terra do Meio (região entre os rios Iriri e Xingu), principalmente os municípios de São Félix do Xingu, Altamira e Tucumã; e à área da rodovia BR-163 (municípios de Novo Progresso, Itaituba e Trairão). No Amazonas, englobam a porção sul ( Lábrea, Humaitá e Boca do Acre) e sudeste (Apuí, Manicoré e Novo Aripuanã). Três municípios – São Félix, Altamira e Novo Progresso – foram os campeões de desmatamento em área absoluta em toda a Amazônia no período 2001-2003.
Sem contato – Segundo Veríssimo, a presença de estradas clandestinas explica por que razão regiões de floresta que não são conectadas por rodovias oficiais têm um índice tão alto de desmatamento.
As estradas facilitam o acesso tanto do setor produtivo quanto dos grileiros à floresta e são o principal vetor de ocupação. “Quando você joga o mapa das estradas endógenas, você explica por que há desmatamento em áreas onde não se esperava que houvesse”, diz Veríssimo.
Para produzir tal mapa, ele e seus colegas usaram imagens do Landsat, o mesmo conjunto de satélites que fornece as imagens processadas pelo Inpe – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais para dar os dados anuais do desmatamento, mas numa escala mais detalhada. Isso permitiu enxergar áreas desmatadas menores que 6 hectares, algo que o processamento feito pelo Inpe não consegue distinguir. “Estamos dando um zoom nessas estradas, que são indicadores fortes de pressão humana”, diz Veríssimo.
O estudo do Imazon aponta ainda que é a grilagem de terras quem dá as cartas na nova geografia da destruição. Em São Félix do Xingu a pecuária ainda é importante, e ao longo da BR-163 ela começa a ganhar força. Mas há regiões como a do rio Iriri (PA) e Apuí (AM) onde a atividade produtiva não justifica o desmatamento. “A pecuária que se produz ali é de qualidade muito baixa”, diz Veríssimo. “O sujeito ganha mais na poupança.”
Segundo Veríssimo, a avidez para tomar posse de terras públicas é encarada como “investimento”. A princípio, a grilagem não tem objetivo de produzir nada. O desmatamento de áreas extensas ajuda os grileiros a consolidar sua presença. “É mais especulativo do que produtivo”, diz. (Claudio Angelo/ Folha Online)