Um novo estudo que comprova uma teoria muito praticada, mas ainda controversa: a de que os corredores ecológicos são uma dádiva para a diversidade das plantas. Especialistas acreditam que as estreitas faixas de terra que conectam manchas isoladas de habitats naturais – como as reservas naturais geralmente cercadas por um mar de desenvolvimento humano – podem beneficiar a biodiversidade ao permitir o acesso de plantas e animais a uma gama maior de recursos.
Quando há escassez de água e alimento em uma das manchas de habitats, por exemplo, pode haver abundância em outras. Sem um corredor para ligar estas manchas, algumas espécies seriam incapazes de alcançar os recursos necessários.
Mas outros especialistas alegam que os corredores impõem maior risco às espécies que os utilizam, expondo-as a perigos como tráfego de veículos e poluição, que espreitam estas estreitas passagens.
As provas que os corredores ajudam a preservar várias plantas e animais em grandes escalas continuavam esquivas, até agora.
Um time de cientistas, liderado por Ellen Damschen, ecóloga da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara (EUA), dividiu uma vasta área de floresta de pinus na Carolina do Sul em seis lotes experimentais de 500 m².
Ao longo de cinco anos, as manchas de habitats que foram conectadas a outras manchas através de corredores apresentaram um crescimento de cerca de 20% no número de espécies de plantas em cada lote, comparando com as manchas isoladas.
“Os corredores têm um impacto positivo sobre a diversidade de espécies,” disse Damschen. Ela e seus colegas publicaram o estudo na edição da semana passada da revista Science.
Segundo Damschen, os conservacionistas popularizaram a teoria da utilização de corredores para a preservação das espécies nas décadas de 60 e 70. “Na falta de experimentos e estudos para fornecer conhecimento aos conservacionistas, eles adotaram a teoria”.
Atualmente, mais de 800 organizações norte-americanas e canadenses estão utilizando os corredores para criar redes de habitats protegidos entre o Parque Nacional de Yellowstone e de Yukon.
Na Índia, um corredor de 60 quilômetros de comprimento e 10 quilômetros de largura interliga importantes habitats de tigres no leste do Himalaia e nas Montanhas de Western Ghats.
No Chile, conservacionistas estão trabalhando para conectar três reservas naturais já estabelecidas com pequenas propriedades privadas.
Manchas de Pinus – Sem evidências científicas para demonstrar a eficácia dos corredores, os argumentos dos céticos continuavam válidos. “Este estudo”, diz Damschen, “é a evidência científica que estava faltando”.
A área em que Damschen e seus colegas realizaram os experimentos continha pinus jovens, árvores nativas daquela parte da Carolina do Sul. Plantações densas de pinus maduros cercavam as manchas experimentais.
Cada área tem aproximadamente o tamanho de 12 quarteirões, e inclui uma mancha de habitat central cercada com quatro manchas. Uma delas é conectada com a mancha central através do corredor. As outras três manchas possuem formas diferentes, mas áreas iguais às manchas conectadas ao seu corredor.
Entre 2000 e 2005 os pesquisadores coletaram informações sobre a diversidade de plantas nas manchas. Ao longo deste período, as manchas conectadas apresentaram um crescimento de 20% a mais no número de plantas não lenhosas do que as manchas não conectadas. A forma das manchas não conectadas não teve efeito sobre a diversidade total de espécies.
“Demonstramos que os corredores não são simplesmente um paradigma intuitivo da conservação. Eles são uma ferramenta prática para a preservação da biodiversidade,” concluem Damschen e seus colegas na Science.
Confirmação – Segundo estes pesquisadores, os corredores auxiliam a diversidade de plantas ao melhorar a dispersão das sementes e a polinização, e alterar a competição entre as plantas.
“Acreditava-se que as plantas fossem um grupo de espécies bastante sedentário, enraizados em um local,” disse Damschen. “Não era claro que conseguiríamos uma resposta ao longo dos cinco anos… (mas) vimos uma mudança drástica”.
O biólogo conservacionista, Stuart Pimm, da Duke University em Durham, Carolina do Norte (EUA), disse: “Os corredores permitem que as espécies saiam de áreas ruins para áreas boas quando há necessidade”.
Pimm não esteve envolvido com a pesquisa, mas salienta que este estudo é a “confirmação experimental” de que os corredores realmente funcionam.
As pessoas que lidam com a terra podem olhar este experimento e dizer, “Sim, temos um estudo que prova que mesmo corredores estreitos podem ser eficazes,” adicionou ele.
Iniciativa Nacional – No Brasil, o Ministério do Meio Ambiente coordena o Projeto Corredores Ecológicos, que visa reduzir ou prevenir a fragmentação das florestas por meio de interligação de diferentes modalidades de áreas protegidas. A finalidade do programa é contribuir para a conservação efetiva da biodiversidade do país com a criação de corredores de floresta tropical em dois dos mais importantes biomas brasileiros: a Floresta Amazônica e a Mata Atlântica.
O projeto, que começou a ser executado em 2002 e segue até 2010, conta com ações integradas de monitoramento e fiscalização, de apoio a iniciativas que visem ao uso sustentável de recursos naturais nas áreas subjacentes e de promoção de conectividade entre as áreas protegidas, além da implementação de planos de manejo para os corredores e de subprojetos em áreas de abertura.
O coordenador do Projeto Corredores Ecológicos, Militão Ricardo, lembra que a implementação dos corredores ecológicos, e seu conseqüente intercâmbio de fauna e flora, depende da participação da comunidade local . “A área dos corredores abrange muitas vezes terras privadas e o processo decisório é descentralizado em conselhos paritários locais”, avalia.
Considerando que os ecossistemas da Amazônia e da Mata Atlântica apresentam realidades distintas, a implementação de cada um dos corredores exige estratégias específicas. No Corredor Central da Amazônia, a estratégia é garantir a conectividade entre as áreas protegidas por meio de ações que visem à manutenção e à ampliação de zonas de conservação, além do apoio às políticas de utilização sustentável dos recursos naturais nas áreas de insterstício.
Já no Corredor Central da Mata Atlântica, a estratégia é assegurar a proteção dos remanescentes florestais significativos e incrementar, gradativamente, o grau de ligação entre porções nucleares da paisagem por meio do controle, proteção e recuperação da cobertura florestal e desenvolvimento de atividades de produção sustentável que contribuam com essa conecção.
Para isso foram estabelecidas estruturas de gestão que estimulam a implementação de estratégias voltadas para a conservação da diversidade biológica em áreas públicas e privadas, incluindo terras indígenas, com ativa participação dos diferentes agentes públicos e privados, promovendo a sustentação dessas a longo prazo. (Fernanda Müller e Sabrina Domingos/ CarbonoBrasil)