Fluxo de água do rio Amazonas estava invertido 5 milhões de anos atrás

Faz muito tempo, pelo menos 5 milhões de anos, mas o rio Amazonas já teve todo o seu fluxo invertido. Ou seja, em vez de ir em direção ao oceano Atlântico, ele seguia o caminho totalmente inverso, conforme indica estudo feito na Ufam (Universidade Federal do Amazonas) e que será apresentado hoje nos Estados Unidos.

“Essa reversão ocorreu de forma simultânea ao levantamento da cordilheira dos Andes, processo que teve seu clímax entre 5 milhões e 7 milhões de anos atrás”, disse à Folha Angela Maria Vega, co-autora do estudo, juntamente com Afonso Nogueira e dois pesquisadores americanos.

Apesar de a suspeita sobre essa inversão no sentido das águas de um dos maiores rios mundo não ser nova, apenas agora evidências geológicas mais fortes estão sendo encontradas. O novo trabalho, que será mostrado na reunião anual da Sociedade Geológica Americana, na Filadélfia, está baseado em dois importantes conjuntos de dados. Juntos, eles mostram muito mais do que a simples idade da inversão do curso do rio Amazonas.

Barreira geográfica

Segundo a proposta defendida por Vega –a pesquisadora trabalha no Brasil, mas é colombiana de nascimento– antes de o rio Amazonas virar literalmente, houve um período em que ele, além de correr para o oeste, não se comunicava com o Solimões, como ocorre hoje.

Havia um enorme lago entre os dois “Na etapa anterior à da formação do atual Amazonas, havia um lago de água doce que foi sendo invadido ao longo do tempo pelo próprio rio”, diz a geóloga. Essas afirmações foram feitas com base nas análises de algumas camadas de sedimento da região.

Para chegar à idade da reversão do rio, os cientistas estudaram palinomorfos, ou seja, fósseis de várias estruturas vegetais, como o pólen ou os esporos das plantas. Esse trabalho em particular já havia sido apresentado por outros pesquisadores que também trabalham na Ufam.

A pesquisa da dupla norte-americana, que caminhou para o mesmo resultado daquela feita no Amazonas, teve como fonte os cristais do mineral zircão. Esse elemento é considerado um excelente relógio geológico.

Além de ser muito longevo e de sobreviver à erosão, esse tipo de silicato contém urânio radioativo, que decai para (ou seja, se transforma em) chumbo a um ritmo conhecido. Ao medir essa relação, os cientistas conseguem saber precisamente a idade dos cristais.

No caso dos zircões coletados na região de Manacapuru, município amazonense localizado na margem do rio Solimões, as datações mostraram cristais com pelo menos 1,3 bilhão de anos. “Os dados dos pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte comprovam a nossa teoria. Nas coletas feitas a leste do que seria o antigo lago, não há evidências (por causa principalmente da idade muito antiga) de material proveniente dos Andes. Ou seja, existia uma barreira tal qual nós estamos propondo.”

O estudo, portanto, mostra que a mudança de mão do Amazonas não ocorreu antes de uma fase intermediária. Exatamente aquela em que tinha um lago no meio do caminho. E ele foi transposto apenas depois de o fluxo vindo do oeste ganhar força para chegar ao Atlântico.
(Fonte: Eduardo Geraque / Folha de S.Paulo)