O maior esforço internacional de pesquisa da história começa nesta semana. A partir desta quinta-feira (01), 50 mil cientistas de 63 países se voltam aos pólos da Terra, para entender como essas regiões estão mudando em decorrência do aquecimento global e como essas mudanças influenciarão o clima futuro do planeta.
O chamado Ano Polar Internacional unifica 228 projetos de pesquisa, com os objetivos de monitorar a saúde das calotas polares, dos ecossistemas ártico e antártico e das populações árticas. Do efeito da radiação solar na atmosfera polar à fauna marinha endêmica da Antártida, tudo será esquadrinhado com o auxílio de satélites, robôs, submarinos e navios.
Apesar do nome, o Ano Polar Internacional na verdade se estenderá por dois anos, até 2009, para que ambos os pólos possam ser estudados tanto no verão quanto no inverno.
O último evento do gênero aconteceu em 1957, conhecido como Ano Geofísico Internacional. Na ocasião foi construída uma base científica americana no pólo Sul e uma base russa no chamado pólo da Inacessibilidade, o lugar mais frio e inóspito da Terra, na Antártida.
Neste ano, os esforços se concentrarão menos em exploração e mais em pesquisa. Um objetivo central do projeto é esclarecer o papel dos gases de efeito estufa nas mudanças que ocorrem rapidamente em ambos os pólos.
“O aquecimento global é o maior desafio que a nossa civilização já enfrentou”, disse o cientista-chefe do Reino Unido, David King, durante uma solenidade realizada ontem simultaneamente na França, no Reino Unido e nos EUA, antes do lançamento do evento. “O gelo é um sistema de alerta para o aquecimento global.”
Segundo Chris Rapley, do BAS (Serviço Antártico Britânico), a mudança de fase de neve e gelo para água – o degelo polar – é o maior ponto de desequilíbrio do sistema terrestre. Para ele, a grande pergunta a ser respondida pelo esforço multinacional é: quanto degelo ocorre e o quão rápido ele é.
No último dia 2, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática) divulgou seu famoso relatório no qual afirma que o Ártico é provavelmente a região que mais aquece no planeta, e que esse aquecimento põe em risco a calota glacial da Groenlândia.
Se esse imenso bloco de gelo derreter, como derreteu há 125 mil anos (no último período interglacial), os mares poderão subir até 6 metros, o que seria um desastre global.
Por outro lado, a dinâmica das grandes geleiras árticas e antárticas ainda é pouco conhecida. Muitas delas podem inclusive ganhar massa com o aquecimento, devido à maior precipitação de neve -especialmente na Antártida.
Por falta de um quadro consistente, o IPCC excluiu a contribuição desse degelo na previsão do aumento do nível do mar para os próximos séculos.
Para determinar a resposta desses grandes sistemas – e conseqüentemente prever o quanto o degelo elevará o nível do mar – é preciso, por exemplo, saber quanta água está “vazando” por baixo das geleiras antárticas. “Só colocando todos os navios lá você pode ter um quatro completo do continente”, disse Eric Wolff, do BAS.
Também deverá ser instalado um sistema de monitoramento do oceano Ártico. Outro projeto inclui a perfuração de alguns lagos de água líquida que existem sob a calota polar antártica e que podem abrigar ecossistemas nunca vistos.
Indefinição brasileira – O Ano Polar terá verba disponível de US$ 1,5 bilhão (R$ 2,15 bilhões), em sua maior parte de programas preexistentes.
O Brasil destinará R$ 9,2 milhões ao programa, oriundos dos fundos setoriais. Até ontem, no entanto, o país ainda não sabia quantos projetos com participação nacional serão financiados.
Ao todo, 40 propostas foram enviadas ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Um mínimo de cinco e um máximo de 11 deveriam ser aprovadas, mas o CNPq ainda não havia fechado as cartas de aprovação, o que tem deixado alguns cientistas apreensivos. (Folha Online)