Avanço imobiliário ameaça água no subsolo de São Paulo

Na rua Leopoldo Couto de Magalhães Júnior, no Itaim Bibi (zona oeste de São Paulo), três prédios em construção, quase vizinhos, competem pela atenção de potenciais compradores. Na mesma via, ao menos dois edifícios ficaram prontos nos últimos anos; outro começará a ser construído em breve.

O local é um exemplo do “boom” imobiliário que atingiu a cidade há alguns anos e que trouxe, além de novas opções de residência, prejuízos ao ambiente, como o rebaixamento do nível do lençol freático.

A redução tem causado rachaduras em imóveis, afundado o asfalto de ruas, ajudado a secar lagos e, a longo prazo, pode afetar o nível dos rios da cidade.

De 1997 a 2007, 3.179 prédios residenciais e comerciais foram construídos em São Paulo, segundo a Sempla (Secretaria Municipal de Planejamento). O líder foi o Itaim Bibi (212), na zona oeste, onde, nos últimos dez anos, o lençol freático ficou 4 m mais baixo, diz Milton Golombek, diretor da Abeg (Associação Brasileira de Empresas de Projetos e Consultoria em Engenharia Geotécnica).

A diminuição também foi percebida por ele em Moema e na Vila Mariana (ambos na zona sul), segundo e terceiro colocados em lançamentos imobiliários nos últimos dez anos.

Para construir prédios em áreas onde o lençol freático está mais próximo da superfície, as construtoras precisam drenar a água. E muitos prédios continuam bombeando essa água para a rua, mesmo depois de o imóvel estar pronto, para evitar que o subsolo, onde ficam as garagens, inunde.

Reflexo na superfície – Se grande número de prédios faz isso numa mesma região, o lençol freático não tem tempo de voltar ao nível normal. O rebaixamento gera reacomodação do solo, que reflete na superfície e causa rachaduras e fissuras em imóveis, quando o solo é de qualidade ruim.

Alguns lagos também podem secar, já que não são realimentados pela água do lençol, como ocorreu no parque Água Branca (zona oeste), há seis anos.

Não há um estudo que mostre a quantidade de água do lençol que é bombeada pelos edifícios de São Paulo, segundo a Promotoria do Meio Ambiente, que pretende entrar com ação civil pública contra a prefeitura no início de 2009, para que esse bombeamento seja controlado.

Antes de começar a fundação das obras, no entanto, as construtoras têm que analisar a profundidade da água. Foi em uma dessas medições que Golombek, que também é diretor da Consultrix, empresa que projeta fundações para a maioria das construtoras do país, notou que na rua Tabapuã, no Itaim Bibi, o lençol estava mais profundo do que há dez anos, quando executou outra obra no local.

Mina – O fato também foi percebido por Ariston Santana Pereira, 58, zelador de um prédio na rua Leopoldo Couto de Magalhães Júnior, três ruas distante da Tabapuã. “Faz dez anos que isso aqui não vaza. Era uma mina, tinha que bombear água de hora em hora”, diz, referindo-se à água do lençol freático.

As possíveis conseqüências disso no edifício são um muro rachado e um pequeno afundamento na entrada da garagem, que já teve de ser reformada pelo mesmo motivo há um ano. O asfalto da frente do prédio também foi refeito há três meses e já está empoçando água em alguns pontos devido a buracos.

Casas interditadas – Um engenheiro de uma construção na Vila Mariana, que não quis se identificar, também afirmou que, em um intervalo de três anos e seis meses, o lençol da região baixou cerca de 1 m. A observação foi feita após medições para o início de obras. De 2005 até 2007, 54 edifícios foram construídos no bairro.

Nas ruas Tumiaru, Joinville e Curitiba e na travessa Ponder, em maio de 2007, casas apresentaram rachaduras e fissuras; algumas foram interditadas. Na época, três prédios de luxo estavam sendo construídos. Hoje, as casas passam por reformas, pagas pelas construtoras. (Fonte: Talita Bedinelli/ Folha Online)