Dezoito anos de olho no Universo

Nenhum instrumento astronômico recente teve um impacto tão grande na ciência nem se tornou tão popular como o telescópio espacial Hubble. E isso depois de um início desastroso, quando logo após ter sido lançado, em abril de 1990, descobriu-se que tinha um defeito justamente em seu espelho principal, o que impediu a obtenção de imagens com a nitidez esperada.

Mas três anos depois, outra missão do ônibus espacial norte-americano consertou a “miopia” do Hubble com a adição de óculos, ou melhor, de dois espelhos menores que deram ao principal uma visão perfeita. O que se seguiu foi a produção de algumas das mais célebres imagens astronômicas, como a da nebulosa Cabeça de Cavalo ou a da nebulosa da Águia, foto que se tornou conhecida como “Pilares da Criação”.

Está prevista para maio, durante o Ano Internacional da Astronomia, a quinta e derradeira missão do ônibus espacial destinada a reparos no Hubble. A manutenção dará ao telescópio espacial um futuro tão brilhante como o seu passado, ainda que não tão longo, segundo Julianne Dalcanton, professora da Universidade de Washington que há uma década usa o instrumento em seus trabalhos de pesquisa.

Julianne, que também é pesquisadora do Instituto Max Planck de Astronomia, na Alemanha, é autora de um artigo de dez páginas na edição atual da revista Nature sobre os 18 anos do Hubble e suas principais contribuições à astronomia, a maioria das quais não seria possível apenas com os telescópios em terra, ainda que muito maiores e mais modernos.

“Localização, localização, localização”, disse a astrônoma sobre o principal motivo do sucesso do telescópio das agências espaciais norte-americana (Nasa) e européia (ESA), que está em órbita a cerca de 560 quilômetros da Terra, longe dos efeitos da atmosfera que limitam a eficácia dos telescópios terrestres.

O Hubble também se beneficia da escuridão do espaço. “Em terra, o céu noturno não é exatamente escuro. Átomos nas camadas mais elevadas da atmosfera absorvem energia solar durante o dia e reirradiam a energia como luz durante a noite. Da mesma forma que vemos mais estrelas sobre uma área escura do que em uma rua iluminada, no espaço o Hubble pode medir detalhes astronômicos muito mais tênues do que os telescópios baseados em terra”, disse.

Entre os legados do Hubble estão a revolução na compreensão dos buracos negros e do papel desses objetos na formação das galáxias, observações detalhadas de estrelas pulsantes (cefeidas) que ampliaram a capacidade de avaliar as enormes distâncias envolvidas na astronomia estelar e, mais recentemente, a produção da primeira evidência direta de um planeta em órbita de outra estrela além do Sol.

“O Hubble aumentou a precisão com que fazemos nossa pesquisa. E as imagens produzidas instigaram o interesse do público. São fotos que ocupam os fundos e os descansos de telas de computadores em todo o mundo”, apontou Julianne.

Segundo a cientista, outro dos motivos do sucesso do telescópio é a “democratização dos dados”. Astrônomos envolvidos na missão recebem sugestões de interessados em realizar observações específicas. Algumas vezes, até mesmo o público em geral pode participar, como na nebulosa Cabeça de Cavalo, cuja observação foi escolhida por meio de uma votação pela internet.

Julianne espera que os novos reparos permitam pelo menos mais cinco anos de bons serviços por parte do Hubble, até que seja substituído por outro telescópio espacial, o James Webb, previsto para entrar em funcionamento a partir de 2013.

O artigo 18 years of science with the Hubble Space Telescope, de Julianne Dalcanton, pode ser lido por assinantes da Nature em www.nature.com. (Fonte: Agência Fapesp)