Terra de aves, Brasil desperdiça potencial turístico de observação

O Brasil é segundo país do mundo com maior diversidade de aves. Com 1.822 espécies, fica atrás somente da Colômbia (1.865 espécies). Contudo, o turismo para observação desses animais, mais conhecido pelo termo em inglês “birdwatching”, ainda é fraco por aqui.

Segundo Guto Carvalho, coordenador da Avistar (Encontro Brasileiro de Observação de Aves), o país recebe cerca de 2.000 observadores de aves por ano. Se forem consideradas as pessoas que vêm ao país a negócios e que aproveitam para praticar a avistagem, o número sobe para 5.000. É pouco para o potencial da biodiversidade brasileira.

O terceiro país em diversidade de aves, o Peru (com 1.820 espécies), recebe em média 18 mil pessoas por ano, segundo Omar Barreda, da Comissão de Promoção do Peru para Exportação e Turismo. Hoje, a maioria dos turistas de observação de aves no Brasil é estrangeira.

“Cada turista fica em média de uma semana a dez dias. Nesse tempo, gasta cerca de US$ 2.000. Mais até, se incluirmos as passagens internacionais e guias. É difícil prever, mas a médio prazo esse mercado pode crescer de 300% a 500%. Assim, se continuar a incentivar esse tipo de turismo, o Brasil pode ganhar US$ 10 milhões por ano”, afirma Carvalho.

Para tentar estimular a atividade, a Abeta (associação brasileira do ecoturismo) criou um material sobre a observação de aves no Brasil, em inglês, para ser distribuído no exterior. A ação tem o apoio da Embratur e do Ministério do Turismo. Em agosto, o folheto já foi distribuído na British Bird Fair, em Londres.

Israel Waligora, diretor socioambiental da Abeta, ressalta que foi “a primeira vez que o Brasil esteve presente institucionalmente nessa feira”. “Em anos anteriores, algumas empresas e guias participavam de forma isolada e desarticulada”, afirma o dirigente.

O país, porém, muitas vezes não facilita a prática e até a atrapalha. Segundo José Fernando Pacheco, diretor do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos, o melhor horário para fazer observação é ao nascer do Sol, mas muitos parques só abrem após as 8h. “No Bosque da Barra, no Rio, se você faz jogging pode entrar antes de o parque abrir oficialmente, mas se está com binóculos não pode”, diz. “Alguns até tentam fingir que são corredores.”

Pacheco conta também que na reserva biológica Sooretama, no Espírito Santo, não são mais permitidos observadores de aves. Segundo ele, a justificativa é que o uso de “playbacks” de cantos de pássaros – as “iscas” sonoras para atrair as aves – estressa os animais. “Mas em 30 anos eu nunca vi problema nenhum. Nos EUA, em que num espaço pequeno existem 500 pessoas usando “playback”, pode haver prejuízo, mas aqui é diferente”, afirma.

Conservação – Na opinião dos organizadores da atividade, a observação de aves pode ajudar na conservação das espécies e, também, no aumento de conhecimento científico. Muitos observadores passam dicas sobre novas aves a cientistas ou redescobrem espécies consideradas extintas. Delta Willis, da entidade americana Sociedade Nacional Audubon, diz que há cem anos observadores de aves têm participado da contagem anual de animais feita pela instituição.

“Essas informações vão para o relatório da situação das aves, que contém boas e más notícias. “Birdwatchers” documentaram, por exemplo, o retorno da águia-americana, que esteve à beira da extinção, e o declínio de aves comuns, como a codorna “bobwhite” (Colinus virginianus)”, afirma Willis.

Apesar de a observação de aves ainda não ser popular no Brasil, um evento com congressos sobre o tema, o Avistar, cresce ano a ano. Em 2006, o público foi de 3.000 pessoas, no ano seguinte, passou para 15.000 e, neste ano, 25.000.

“A observação de aves era um assunto de pequenos clubes e de cientistas, ornitólogos. De alguns anos para cá esse número começou a crescer exponencialmente”, diz Carvalho. Mas ainda é pouco se compararmos com os EUA – uma pesquisa do governo mostrou que, em 2006, 47,7 milhões de americanos observaram aves.

Riqueza biológica – A América do Sul é o continente mais rico do mundo em aves, assim como a África se destaca por mamíferos. Boa parte dessa diversidade se deve aos Andes. “A Colômbia (que possui 1.865 espécies) tem três cadeias de Andes, uma área de floresta amazônica, um pedaço de Caribe com floresta própria, entre outros ambientes”, diz Pacheco. Naquele país, porém, a violência das Farc atrapalha o turismo na Amazônia.

No Brasil, o número passou de 1.590 espécies em 1981 para 1.822 espécies em 2008 – um aumento de 14,5%.

A razão do crescimento é principalmente a descoberta de “espécies escondidas”, ou seja, perceber que animais classificados como subespécies são, na verdade, outras espécies. Isso só acontece ao estudar melhor os animais e seus hábitos.

Mesmo havendo muitas espécies, não se pode ignorar que elas têm sofrido com a perda de seus habitats por meio do desmatamento. No Brasil, há 160 espécies na lista de ameaçadas de extinção do Ministério do Meio Ambiente (9% do total).

Pedro Develey, diretor de conservação da Save (Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil), diz que, enquanto ainda se descobre a biodiversidade da Amazônia, o país perde populações de outras espécies na mata atlântica e no cerrado. (Fonte: Afra Balazina/ Folha Online)