A opinião é do professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB), Donald Sawyer, especialista nos biomas do Cerrado, da Caatinga e Amazônico.
“Os satélites poderão nos ajudar a saber, de forma mais precisa, qual é a realidade dos biomas brasileiros. Os números que já saíram sobre o desmatamento no Cerrado são bastante desencontrados. As estimativas mais realistas apontam que a área desmatada anualmente vai de 1,1% a 1,5%. Proporcionalmente, é um número bastante superior ao registrado na Amazônia”, argumenta o professor.
Sawyer adverte que haverá dificuldades técnicas para detectar o desmatamento por satélite no Cerrado e na Caatinga. “Ainda não é possível diferenciar o que é campo sujo, um tipo de vegetação original do Cerrado, do pasto sujo, que está relacionado ao desmatamento”, explica.
O desafio, segundo ele, será grande. “Mas o Brasil está entre os mais desenvolvidos em termos de monitoramento por satélites”, completa.
Apesar da dificuldade, Sawyer vê o uso de satélites para o monitoramento dos biomas brasileiros como um “passo importantíssimo na política ambiental do país, fundamental para entender os ecossistemas no seu conjunto”. Ele explica que há, entre esses biomas, uma grande interdependência e que, portanto, monitorar o Cerrado também ajuda a proteger os outros biomas.
“Embora a Amazônia seja importante, focar as ações apenas nela pode resultar em prejuízos tanto para o meio ambiente quanto para o desenvolvimento, causando, inclusive, implicações em outros países e em regiões vizinhas por causa da distribuição das chuvas”, afirma.
Sawyer argumenta que o padrão de precipitação das chuvas na Amazônia depende, em parte, da cobertura vegetal de outras formações, responsáveis por devolver umidade para a atmosfera. Combinado aos efeitos do aquecimento global, o desmatamento pode interromper os fluxos interregionais da umidade atmosférica.
“O Cerrado é a caixa d’água do Brasil, onde nascem e crescem os afluentes dos rios Paraná, São Francisco e dos afluentes do Amazonas”, explica o professor. “As principais bacias hidrográficas dependem da água que vem desse bioma, por meio da Amazônia”, completa.
Segundo o professor, o ar úmido do Atlântico entra na Amazônia e cai na forma de chuva. “Grande parte dessa água acaba voltando para a atmosfera por meio de evapotranspiração (evaporação da água do solo, das superfícies líquidas e por meio da transpiração das plantas).”
Ao evaporar novamente, essa água segue para os Andes e, depois, rumo ao Sul, passando pelas regiões Centro-Oeste e Sudeste. “São os chamados rios voadores”, informa o professor. “Precisamos entender melhor o que está acontecendo com o desmatamento em todos os biomas porque eles estão interligados”, acrescenta.
“O mundo todo só pensa na Amazônia e esquece que ela depende dos outros biomas. O desmatamento no Cerrado pode resultar na falta de água para a região e, conseqüentemente, para o resto do país, prejudicando as atividades agrícolas, o abastecimento e também as hidrelétricas dos sistemas hídricos do São Francisco e do Paraná”, adverte o professor da UnB.
Para a diretora de Gestão do Conhecimento da organização não-governamental SOS Mata Atlântica, Márcia Hirota, a utilização de satélites para monitorar desmatamentos em todos os biomas brasileiros é uma “demonstração de que o Poder Público está atuando em prol da proteção das florestas e biomas naturais do país e de seus recursos”.
Hirota afirma que, com essa medida, será possível evitar que os 7% restantes da Mata Atlântica brasileira sejam desmatados porque poderão ser melhor monitorados.
“Já temos uma parceria com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que nos possibilita fazer um monitoramento desse tipo a cada cinco anos. Mas, sem a menor dúvida, essa ferramenta nos dará condições de beneficiar de forma mais significativa e eficiente a proteção de nossa biodiversidade”, argumenta. (Fonte: Pedro Peduzzi/ Agência Brasil)