Maior macaco do continente americano, pacífico e morador de maior parte da Mata Atlântica em anos passados, o muriqui agora corre o risco de desaparecer.
Os muriquis, que podem chegar a medir até um metro de altura, estão na lista dos 25 primatas mais ameaçados em todo mundo. Segundo estimativa de pesquisadores, havia mais de um milhão de exemplares da espécie quando Pedro Álvares Cabral desembarcou no Brasil.
Hoje, sobram pouco mais de dois mil. De cada cinco sobreviventes, um vive na fazenda Montes Claros, em Caratinga, Minas Gerais. A bióloga Tatiane Cardoso passa nove horas por dia na mata anotando detalhadamente tudo que os animais fazem. “Todos têm identidade, conhecemos cada um por seu nome. Eles são muito amorosos mesmo. Estão sempre se abraçando. Em um momento de estresse se abraçam, em um momento de medo”, conta.
A reserva particular foi criada por Feliciano Miguel Abdala. Há 67 anos ele comprou a fazenda de um amigo, mas só depois de fazer um juramento. “Em 1944, sentou seu Feliciano e seu Bentinho de Abreu. Seu Bentinho virou para o seu Feliciano e falou: ‘estou te vendendo a fazenda, mas preserva a mata e preserva os macacos’. Seu Feliciano jurou preservar e preservou”, conta Antônio Bragança, gerente de campo da reserva ambiental Feliciano Abdala.
Feliciano teve de enfrentar madeireiros e caçadores armados. Mas manteve a promessa. “Resisti a ofertas muito importantes das siderúrgicas a respeito do carvão”, disse ele em uma entrevista dada em 1992. Hoje, 953 hectares da fazenda ainda são de mata virgem.
Feliciano morreu na virada do século 20, aos 92 anos de idade. Algumas semanas depois, um jequitibá centenário, a maior árvore da floresta, desabou sem explicação. O tronco da árvore tem 40 metros de comprimento e virou uma espécie de passarela.
Os filhos de Feliciano decidiram manter o juramento do pai. “Isso aqui toda vida foi orgulho de meu pai. Assim que ele morreu, fizemos uma reserva particular natural. Se depender da família, a mata é intocável”, diz Roberto Abdala, um dos filhos.
Há 33 anos, os primeiros cientistas descobriram a fazenda. Pouco depois eles ganharam de Feliciano uma casa para trabalhar e se abrigar. Com isso, a população de macacos multiplicou por cinco. Hoje são 320 animais, a maior concentração de muriquis do planeta.
“A população está crescendo e a reserva não cresceu. Qual a capacidade disso aqui, de suportar esse crescimento?”, questiona a bióloga. Há cinco anos, a organização não governamental (ONG) Preserve Muriqui batalha em busca de uma saída. Os técnicos prepararam 200 mil mudas de cedro, jatobá e outras árvores nativas da Mata Atlântica, orientaram os vizinhos a reflorestar os topos de morro para revitalizar as nascentes de água e ensinaram a produzir mais, usando uma área menor.
“Hoje, temos 43 proprietários que são nossos fiscais. Tudo que acontece em torno da reserva, eles estão aqui para fiscalizar. Hoje falamos com orgulho que não precisamos de guarda em torno da reserva. Nós temos os proprietários que são os guardiões da mata”, revela Antônio Bragança.
Com a orientação da ONG, Jardyr Silva aumentou a produção de leite e não vê a hora de receber na fazenda os vizinhos ilustres. “Nós estamos fazendo a casa dele. A porteira está aberta”, diz o vizinho da reserva. (Fonte: Globo Natureza)