Para meteorologistas e cientistas do clima, as enchentes que afetaram o estado australiano de “Queensland” não foram inesperadas. Elas são vistas como efeitos colaterais do fenômeno climático La Niña, um resfriamento das temperaturas superficiais da água no Oceano Pacífico leste.
Enquanto um típico La Niña – a parte de baixa temperatura do ciclo conhecido como El Niño/Oscilação Sul – geralmente leva climas úmidos ao oeste do Pacífico, ele também leva condições secas ao sul dos Estados Unidos, incluindo o sul da Califórnia.
Desde o final de dezembro, porém, o sul da Califórnia tem sido atingido por fortes tempestades, com algumas regiões recebendo quase o equivalente a um ano de chuvas em apenas algumas semanas.
“Claramente, até agora, o padrão não tem sido o esperado para o sul da Califórnia”, disse Michelle L’Heurex, meteorologista do Centro de Previsão de Clima da Agência Oceânica e Atmosférica Nacional, em Camp Springs, Maryland.
Quando o La Niña está em efeito, fortes ventos leste no Pacífico tropical empurram a água mais quente da superfície para oeste, enquanto as águas mais frias se elevam no Pacífico leste para substituí-la.
O La Niña atual, que começou no último verão, é considerado como “moderado a forte” em intensidade, com temperaturas superficiais, em média, dois graus mais baixas do que o normal.
Águas mais frias no Pacífico leste significam menos chuvas naquela região.
“Durante o La Niña, as precipitações param quase completamente”, disse L’Heurex. A área de chuvas muda para o Pacífico oeste, e se move pela região.
“Você pode pensar no fenômeno como uma grande bolha de precipitação”, explicou ela. Nesta época do ano, ela se dirige para o sul do Equador, onde afeta partes da Austrália.
“Com base em registros históricos, provavelmente há alguma ligação entre o La Niña e as chuvas sobre o nordeste australiano”, afirmou L’Heurex.
A mudança na precipitação, por sua vez, leva às alterações nas correntes de ar que podem afetar os Estados Unidos. Além de condições mais secas que o normal no sul, o La Niña costuma trazer condições mais frias e úmidas ao norte, especialmente no noroeste do Pacífico (especialistas em clima não veem grandes ligações entre o fenômeno e o nordeste, porém – “Existem outros fatores climáticos acontecendo”, disse L’Heurex).
Até o momento, o sul da Califórnia experimentou o tipo de inverno que pode ocorrer num ano de El Niño forte, quando temperaturas superficiais maiores que o normal no Pacífico leste trazem mais chuvas à Costa Oeste dos EUA.
Mas os cientistas estão longe de jogar seus modelos pela janela. A explicação para a úmida quinzena do La Niña no sul da Califórnia não foge das estatísticas, como qualquer coisa, dizem eles.
“As previsões climáticas são probabilísticas”, disse L’Hereux. “É uma curva nas probabilidades. Estamos fadados a errar em algum momento”.
David Battisti, cientista do clima na Universidade de Washington, disse que o La Niña “desloca a distribuição das probabilidades”.
Num ano de La Niña, embora a média de chuvas de inverno seja mais baixa que o normal no sudoeste, a probabilidade de fortes tempestades é maior. Para o sul da Califórnia, à medida que as correntes de ar são empurradas mais ao norte, “o número médio de tempestades diminui, mas a probabilidade de ocorrer um temporal realmente terrível aumenta”, explicou o Dr. Battisti.
“Ainda assim, é um evento raro”, acrescentou ele. “As correntes de ar adentram a Califórnia com muita precipitação dentro delas”. Ele descreveu a ocorrência como um “alinhamento estatístico”, como um dia ruim numa rodovia – quando diversos fatores se combinam para causar um enorme desastre.
Depois das chuvas torrenciais do início do inverno, é possível que o restante da estação seja seca no sul da Califórnia, como já ocorre em grande parte do sul dos Estados Unidos.
A verdadeira pergunta, segundo L’Heurex, é o que acontecerá depois da primavera – ou o La Niña persiste, ou as temperaturas do mar voltam ao normal. A prorrogação do La Niña no verão poderia resultar em precipitações abaixo da média ao longo de uma grande parte da região central dos EUA, o que não seria nada bom para os agricultores do país. “Nós certamente não faremos essa previsão agora”, disse ela. (Fonte: Portal iG)