Antes de construir um navio, é necessário avaliar o projeto em uma escala reduzida.
A construção das embarcações em escala reduzida, que poderão ser testadas em um tanque de provas, é feita hoje por um sistema de usinagem robotizada.
O robô parte de uma imagem de CAD e desbasta automaticamente um grande bloco de poliuretano, até deixar apenas a embarcação em miniatura. Essa miniatura servirá como molde para a fabricação da maquete em fibra de vidro.
O grande problema desse processo é o grande desperdício de material.
“Entre 20% e 45% de cada bloco do material vira cavaco e é irremediavelmente desperdiçado. Ao final do processo, e dos testes, mesmo o poliuretano aproveitado no molde que gerou o modelo de embarcação em fibra de vidro vira sucata. Mesmo destino tem o modelo,” explica o pesquisador Fábio Villas Boas, do Centro de Tecnologia Naval e Oceânica (CNaval), em São Paulo.
Ou seja, sem um programa de reciclagem, 100% do poliuretano utilizado na confecção dos moldes das embarcações vai para o lixo. Sem contar que trata-se de um material polimérico caro, cujos resíduos do processamento robotizado geram desconforto, riscos à saúde e ao ambiente.
Cera de carnaúba – Agora, os pesquisadores do CNaval estão testando uma alternativa bem brasileira e ecologicamente correta: a cera de carnaúba.
A carnaúba (Copernicia prunifera) é uma árvore endêmica no semi-árido do nordeste brasileiro, sendo inclusive a árvore símbolo do Estado do Ceará.
A equipe teve que começar do zero, devido à inexistência de estudos anteriores sobre o uso do material em aplicações de usinagem.
“O que não existe é uma fórmula pronta para esse tipo de cera. Conscientes do desafio que tínhamos pela frente, iniciamos a pesquisa da cera para moldes estimulados pela vantagem deste material ser 100% reaproveitável, com a fusão dos cavacos em novos blocos, com perdas mínimas,” conta Fábio.
Na verdade, os pesquisadores analisaram 100 amostras, incluindo ceras naturais e ceras industriais disponíveis no mercado nacional.
Ao final dos testes, apenas 5% das amostras tiveram desempenho promissor. “Levamos as cinco amostras finalistas para o centro de usinagem, no qual estabelecemos um programa padrão para avaliar a ‘usinabilidade’ das peças, o que determinou uma só formulação, a nossa ‘campeã’,” diz Fábio.
A formulação ideal, hoje em fase de patenteamento, emprega cera de carnaúba, que é muito barata em relação aos outros materiais utilizados, parafina e resina polimérica, entre outros materiais.
Entre suas principais vantagens destacam-se a boa disponibilidade da matéria-prima no mercado interno, a dureza satisfatória (maior que a do poliuretano, o que torna o processo mais estável e com menos vibrações, dando maior precisão geométrica aos cascos), a baixa capacidade térmica (aquecimento) durante a usinagem, a propriedade autolubrificante (que reduz o desgaste da ferramenta) e a flexibilidade do material (que diminui as quebras dos protótipos).
Uma semana para esfriar – Um aspecto comparativo fundamental é o custo e o desempenho alcançado para esta formulação com cera, que garante uma competitividade equivalente à do poliuretano.
“Com a possibilidade de reaproveitamento da cera muito próximo a 100%, seu custo inicial tenderá a cair rapidamente”, estima Fábio.
A próxima etapa do projeto consistirá no aperfeiçoamento dos métodos de moldagem, o que exigirá uma planta de fundição de cera e um sistema para bombeamento da cera fundida para o molde.
“Nossa meta imediata é chegar à produção de bloco com oito toneladas de cera, que é a capacidade máxima para carregar o robô do CNaval,” diz Fábio.
Saindo do forno a cerca de 120ºC, esse volume cera levará cerca de uma semana para resfriar no interior do molde.
Além dos moldes, a cera também poderá futuramente ser usada nos protótipos, em substituição à fibra de vidro. No final da linha produtiva dos ensaios, modelos e moldes não precisarão mais ficar estocados ou ir para o lixo. Será tudo derretido e reaproveitado. (Fonte: Site Inovação Tecnológica)