Ciência estuda influência meteorológica aos seres vivos

As nuvens tomam conta do céu, escondendo o sol e anunciando a chuva que deve vir a seguir. No entanto, a virada no tempo pode não surpreender quem sente no próprio corpo as mudanças meteorológicas. Mais do que uma crença popular, a associação entre variações no clima e na atmosfera e a influência desses fatores na saúde dos seres vivos encontra base científica em um campo de estudos bastante específico: a biometeorologia.

Subdividida em três áreas – humana, zoológica ou animal, e vegetal -, a biometeorologia começou a ser investigada em 1956, pelo pesquisador holandês Solko Tromp. Segundo o professor de bioclimatologia Roberto Gomes da Silva, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a finalidade é reunir informações, de forma interdisciplinar, para compreender os fenômenos biológicos e suas relações com o ambiente, em particular os aspectos atmosféricos.

Mais do que interferir na saúde dos organismos, o clima constitui um fator que condiciona a vida na Terra. “A variação de clima pode alterar, pelo menos em quantidade, os componentes químicos da atmosfera, como já aconteceu há milhões de anos”, diz o professor José Clênio Ferreira de Oliveira, do Instituto de Ciências Atmosféricas (ICAT) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Mas como as variações podem interferir na saúde dos seres humanos? As diferenças mais perceptíveis são em relação à tolerância das pessoas a baixas ou altas temperaturas. Por exemplo, o organismo de quem vive em uma região tropical, onde a amplitude térmica (diferença entre temperatura mínima e máxima) é pequena, não está preparado para enfrentar grandes variações, como ocorre fora dos trópicos. O contrário também acontece: quem está habituado a uma amplitude térmica maior pode sofrer mais em locais onde a temperatura permanece alta. “O organismo espera uma baixa, que não acontece”, diz o professor. “Da mesma forma que o morador da região tropical vai sentir quando a temperatura for abaixo de zero”, completa.

O professor Silva salienta que, no caso do homem, a tolerância a tais variações é a maior entre os seres vivos, pois há a possibilidade de criar proteções artificiais, como roupas e equipamentos como ar-condicionado ou aquecedores. “Enquanto isso, os animais podem usar apenas da sua limitada inteligência para criar métodos de abrigo ou de emigração”, afirma. Ele aponta também que a contínua exposição a um determinado fator (a alta temperatura, por exemplo) provoca mudanças no organismo, iniciando um processo de adaptação. Não há, no entanto, como prevenir esses efeitos.

Oliveira explica ainda que mudanças na temperatura, na umidade relativa do ar e na pressão atmosférica podem provocar reações no organismo, como dores nas articulações (agravadas em quem já sofre de problemas como artrite) e elevação da pressão sanguínea. Algumas vezes, ondas de frio ou de calor podem inclusive elevar o índice de mortalidade nesse período. “É comprovado cientificamente que, em épocas de umidade baixa, o número de óbitos de pacientes cardíacos aumenta”, conta o professor da UFAL. Segundo ele, é desaconselhável a essas pessoas subir a altitudes elevadas. “A pressão parcial do oxigênio diminui com a altitude. Isso acelera a pulsação cardíaca e o processo de ventilação do pulmão. O cardíaco começa a respirar mais forte e mais rápido e pode ter um infarto”, esclarece. Situação parecida acontece nas condições de ventos secos e baixa umidade.

Não se trata, contudo, de uma regra geral. Oliveira destaca que os estudos biometeorológicos detectam diferentes efeitos e formas de adaptação conforme a região geográfica. Em alguns casos, fatores que agravam uma doença podem contribuir para atenuar os efeitos de outra. O bacilo da tuberculose, por exemplo, não resiste à pressão do oxigênio a uma altitude de 2 mil metros, conta o professor. “Se você leva um paciente tuberculoso a uma montanha e passa uma semana com ele acima de 2 mil m, ele fica curado”, afirma.

A sensibilidade animal – As variações meteorológicas também influenciam a vida animal. O zootecnista João Batista Freire de Souza Junior, mestre em ciência animal pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa) e pesquisador há sete anos em biometeorologia animal, explica que os bichos têm diversos mecanismos termorregulatórios, para manter a temperatura corporal dentro dos limites sem que haja danos a sua fisiologia. Eles podem ser comportamentais (quando o animal busca maneiras de se aquecer/refrescar), autônomos (com alteração no controle das funções orgânicas, como fluxo sanguíneo ou sudorese) e adaptativos (mudanças de coloração no pelo ou na pigmentação da epiderme).

Um exemplo do caso adaptativo, segundo o professor Roberto Gomes da Silva, da Unesp, são as vacas holandesas, que vieram da Europa com um pelame espesso, de até 3 cm, que as protege da perda de calor corporal durante o inverno. “Em regiões tropicais, as vacas holandesas perdem tal característica e adquirem pelos curtos, de menos de um centímetro, e mais grossos, que facilitam a eliminação do calor corporal para a atmosfera”, afirma.

Mas o que acontece quando os animais fogem de uma área que, horas ou minutos depois, é devastada por um terremoto? Trata-se de uma mistura de instinto com certa capacidade de antecipar tais eventos. Segundo Silva, muitas espécies apresentam maior sensibilidade para variações de pressão atmosférica (que antecipam tempestades). O mecanismo, contudo, pode se aprimorar durante a evolução da população de uma espécie ao longo das gerações, a partir do acúmulo de informações sobre o perigo de determinadas condições ambientais. “Assim, ao serem percebidas tais condições, é disparado um sinal de alerta, que induz os animais a fugirem para locais mais seguros. Os primeiros sinais da aproximação do inverno, por exemplo, fazem com que aves migradoras como as andorinhas se preparem para a emigração a regiões mais quentes”, detalha o professor. (Fonte: Portal Terra)