Fósseis do período Cretáceo – quando ainda existiam dinossauros – identificados nos últimos anos em sítios paleontológicos na região de Jales, no interior de São Paulo, correm o risco de extinção. A ameaça vem, principalmente, das plantações de cana-de-açúcar e da criação de animais que invadem os depósitos fossilíferos, localizados em propriedades particulares. Em defesa do patrimônio natural, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação civil pública, com pedido de liminar, para que os sete sítios identificados até agora sejam preservados.
A ação aponta entes das três esferas de poder – União, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Estado de São Paulo e os municípios de General Salgado, Auriflama e São João de Iracema – como responsáveis pela preservação do local, que já é considerado por cientistas como um dos maiores complexos fossílíferos do País. Na região, os cientistas já individualizaram 17 espécimes de répteis do período Cretáceo, pertencentes a três diferentes espécies crocodiliformes de médio a grande porte, duas delas originalmente descritas a partir desses achados, a Baurussuchus e Armadillosuchus Arrudae.
Em General Salgado, onde estão concentrados a maioria dos sítios paleontológicos, diversos fósseis foram encontrados desde a década de 90. “Além dos esqueletos fossilizados, foram encontrados diversos outros vestígios de vida daquele período (icnofósseis), como cascas de ovos, gastrólitos (pedras presentes em sistema digestório de animais que não possuem dentes para triturar alimentos), coprólitos (fezes conservadas por processo de mineralização) e rastros de vertebrados e invertebrados conservados nas rochas”, revela a ação.
As descobertas foram publicadas pela Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos. Segundo a publicação científica, “no período Cretáceo, a região onde se encontra a Bacia Bauru possuía muitas peculiaridades climáticas e o depósito fossilífero de General Salgado, devido a sua variedade e estado de conservação, possibilita a realização de estudos de notável importância científica”.
O entusiasmo com as descobertas é tão grande que a comissão encaminhou ao Global Indicative List of Geological Sites (Lista Indicativa Global de Sítios Geológicos, Gilges na sigla em inglês) uma recomendação para que o Sítio Fossilífero de General Salgado, localizado na Fazenda São José, seja incluído como Patrimônio Mundial da Humanidade.
Desconhecimento – O MPF começou a investigar as ameaças aos sítios paleontológicos da região de Jales a partir de uma notícia, publicada pela imprensa local, informando que seis sítios estariam sendo ameaçados pelo cultivo da cana. “Oficiadas, as três prefeituras responderam não ter conhecimento sequer da existência dos sítios paleontológicos nas áreas de seus municípios”, revelou o procurador da Republica Thiago Lacerda Nobre.
O MPF requisitou ao DNPM um laudo técnico sobre a importância dos sítios arqueológicos da região. “O relatório, bastante detalhado, noticia que em todos os pontos inspecionados foram realizadas descobertas, algumas no próprio ato da vistoria, concluindo ser grande o potencial para novas descobertas na região”, informou Nobre.
Amparada pelo laudo técnico, o MPF expediu recomendação às três prefeituras para que implementassem medidas de preservação dos sítios. “As prefeituras foram evasivas, limitando-se a tentar justificar a impossibilidade de consecução das ações com argumentos que não se sustentam”, lamentou o procurador.
Nobre também entrou em contato com o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), que manifestou interesse em colaborar para a criação de um museu apto a receber os achados paleontológicos da região. Para ele, só o desinteresse das administrações, nas três esferas de poder, explica a falta de providências para preservação dos sítios paleontológicos.
Liminar – Em caráter liminar, o MPF pede que todos os réus sejam obrigados a elaborar, em conjunto, no prazo máximo de 60 dias, um mapeamento dos sítios arqueológicos da região e apresentar um plano emergencial de preservação. Esse plano deverá ser implantado em até 30 dias após a sua apresentação. A ação requer a apresentação, em 120 dias, de um projeto para a criação de Unidades de Conservação, que deverão ser implantadas em até 90 dias após apresentação do projeto.
O MPF também quer que os órgãos listados na ação apresentem, no prazo de 30 dias, um projeto para implantação de um museu apto a receber os achados fósseis da região, a ser apresentado ao Instituto Brasileiro de Museus. “Os danos ao meio ambiente são de difícil reparação. Não há ação humana capaz de recuperar uma espécie ou patrimônio extintos”, defende Nobre. (Fonte: Portal Terra)