No ano passado, após se tornar o primeiro barco a energia solar a circundar o globo, o Turanor Planetsolar poderia ter pegado seus 510 metros quadrados de células fotovoltaicas e oito toneladas de baterias de íon-lítio e navegado em direção ao pôr-do-sol.
Porém, ele está se transformando em uma embarcação científica, pelo menos durante este verão do hemisfério norte. O barco, um catamarã de 100 pés e US$17 milhões que foi projetado por um aventureiro suíço e bancado por um empresário alemão, cruzará a Corrente do Golfo estudando o papel dos aerossóis atmosféricos e do fitoplâncton na regulação do clima, sob o comando de Martin Beniston, um climatologista da Universidade de Genebra.
O cruzeiro de pesquisa, com cinco tripulantes e até quatro pesquisadores a bordo, começou em Miami, há algumas semanas, e fará uma parada em Terra Nova e na Islândia, para monitorar a corrente do nordeste. A viagem deve terminar em Bergen, na Noruega, em agosto.
Na semana passada, o barco parou na cidade de Nova York por alguns dias a caminho do norte. A embarcação de fibra de carbono e seu grande deque, dominado pelo conjunto fotovoltaico, pareciam um pouco deslocados em meio aos iates de luxo e outros barcos mais convencionais ancorados na marina perto do distrito financeiro da cidade.
De certa forma, o barco está equipado para pesquisas. Sendo totalmente alimentado pelo sol – as células solares de alta potência carregam as baterias que alimentam motores elétricos conectados às duas hélices da embarcação –, ele não produz emissões de dióxido de carbono ou outros gases que possam contaminar amostras do ar. E o barco não tem problemas em ir devagar, se necessário, enquanto coleta amostras da água – a velocidade média é de 5 nós.
“Mas claramente ele não é uma embarcação de pesquisa”, declarou Bastiaan Ibelings, ecologista microbiano da Universidade de Genebra que está trabalhando no projeto.
O catamarã precisou ser montado com equipamentos de pesquisa, incluindo uma “caixa de balsa”, criada originalmente para balsas no Mar Báltico, que registra constantemente a temperatura, salinidade e outras características da água. Ele também tem uma “caixa biológica”, criada pelo departamento de física aplicada da universidade, que usa um laser para analisar o número e os tipos de aerossóis em amostras de ar.
A questão dos aerossóis gerados pelo oceano – partículas sólidas ou líquidas suspensas na atmosfera que podem ter um impacto na formação de nuvens, no reflexo da luz solar e em outros processos – é algo relativamente novo na ciência do clima, afirmou Beniston.
“Acreditamos que o oceano deva ser um colaborador bastante grande” de aerossóis através da ação das ondas e do vento, disse ele, mas não se sabe sua abundância e como diferentes tipos são distribuídos.
“Seu papel exato ainda está aberto a discussões”, acrescentou ele.
A Corrente do Golfo é uma das correntes oceânicas mais estudadas do mundo, mas o plano de Beniston é examinar algumas de suas estruturas em menor escala. Estas incluem os redemoinhos, ramificações giratórias da corrente (que, mesmo sendo menores do que a Corrente do Golfo, ainda podem ter mais de 300 quilômetros de diâmetro).
Os redemoinhos costumam ter maior afloramento de águas mais frias e profundas do que a própria Corrente do Golfo; assim, um objetivo é examinar se diferentes condições da água produzem tipos diferentes de aerossóis. Com sua pesquisa de plânctons, Ibelings quer descobrir se a condição da água em redemoinhos resulta em menos ou mais diversidade biológica do que em outros locais.
As modificações ao catamarã – que também incluíram novas hélices e o remodelamento dos aposentos para oferecer espaço de trabalho aos pesquisadores – foram realizadas em um estaleiro francês depois que o barco terminou sua circunavegação de 19 meses e 60 mil quilômetros, em maio de 2012. Essa viagem pretendia demonstrar mais as capacidades gerais da energia solar do que a praticidade de barcos movidos à energia solar (afinal, embarcações alimentadas eficazmente por energias alternativas já existem há séculos – elas se chamam veleiros).
“Ele é um embaixador da energia solar”, explicou Gérard d’Aboville, atual comandante do Planetsolar.
“Mas eu teria de ser louco para dizer que precisamos pedir 20 barcos como este.”
Excetuando os problemas de custo e velocidade, ainda assim o Planetsolar apresenta alguns desafios únicos. Além do vento, ondas e corrente, d’Aboville precisa analisar constantemente a quantidade de luz solar atingindo as células fotovoltaicas, para manter as baterias o mais carregadas possível – para o caso de longos períodos com tempo nublado (totalmente carregadas, elas podem alimentar o barco por cerca de 72 horas).
Ele conta com a ajuda de um laptop onde recebe mapas detalhados (e constantemente atualizados) da agência nacional meteorológica da França, a Météo-France, mostrando o potencial ganho solar (calculado através da cobertura de nuvens e outros fatores). Se houver uma nuvem no horizonte, ele pode decidir contorná-la, imaginando ser possível ganhar mais energia com o céu limpo do que perder com o desvio. (Fonte: Portal iG)