País atravessa período de defeso, quando a pesca enfrenta restrições.

Está proibida a pesca de lagosta das espécies vermelha (P. argus) e cabo verde (P. laevicauda) até 31 de maio, período correspondente ao defeso, que é a época de reprodução desses animais. Além disso, os indivíduos jovens são protegidos durante todo o ano pela proibição da captura, que não pode ser feita a menos de quatro milhas náuticas da costa, na área entre a fronteira da Guiana Francesa e o Brasil e a divisa do Espírito Santo e Rio de Janeiro.

Com o objetivo de proteger os estoques e minimizar os impactos ambientais, a atividade não é admitida por meio de mergulho de qualquer natureza, com uso de marambaia (todo e qualquer conjunto de estrutura artificial utilizado para concentrar organismos aquáticos vivos), nem com redes de espera de fundo do tipo caçoeira (utilizada por embarcações motorizadas e por veleiras). A proibição é feita com base na Lei nº 11.959/2009, e nas Instruções Normativas nº 138/2006 e 206/2008, editadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), instituição vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA).

A IN nº 138/2006 estabelece o tamanho mínimo de 13 centímetros de cauda para a lagosta vermelha e de 11 centímetros de cauda para a lagosta cabo verde. Esta regra vale, inclusive, no caso dos animais pescados fora dos limites das quatro milhas náuticas, respeitados o período de defeso e demais medidas de ordenamento da pesca.

Proteção necessária – O defeso, explica o oceanólogo e analista ambiental do Núcleo de Fiscalização dos Ilícitos Relacionados à Atividade Pesqueira (Nupesc) do Ibama, Luiz Roberto Louzada Jr, visa proteger um dos períodos mais vulneráveis das espécies, que é a fase de reprodução. A proteção vale para peixes, crustáceos e outros organismos aquáticos de valor comercial, marinhos e de água doce, em épocas e locais diferentes do domínio brasileiro.

A gerente de Projetos da Gerência de Biodiversidade Aquática e Recursos Pesqueiros (GBA) do MMA, Mônica Brick Peres, lembra que o defeso é feito por espécie, e, se a pescaria é multiespecífica (muitas espécies são capturadas com o mesmo petrecho, mesma rede), a proibição torna-se pouco efetiva porque o peixe protegido continua sendo pescado”.

Volta às origens – Nos rios, o período é conhecido como piracema e se caracteriza pelo retorno dos peixes às águas rasas, limpas e mais oxigenadas das cabeceiras para a desova. “Cada fêmea produz dezenas de milhares de ovos, variando de espécie a espécie, e capturar um peixe nesta fase do ano é o mesmo que matar uma fêmea grávida”, compara Luiz Louzada, pois, proteger esses animais garante a reprodução e continuidade das espécies.

A proteção é necessária considerando que menos de 1% (não chega a um mil) desses ovos consegue vencer todos os obstáculos, escapar aos predadores, intempéries, anzóis e redes de pesca e chegar à vida adulta, alerta o analista do Ibama. Segundo Louzada, a estratégia reprodutiva dos peixes é diferente da de outras espécies, que possuem cuidado parental, que é o ato que um ou ambos os progenitores realizam para assegurar que os seus descendentes adquiriram características que lhes permitam sobreviver por si próprios. Eles apenas liberam os ovos no ambiente, à própria sorte, o que diminui drasticamente a sobrevivência.

Quase extintos – No mar e nas bacias hidrográficas de água doce, os períodos do ano e áreas em que a pesca é proibida divergem conforme a espécie e a intensidade da pesca. Algumas variedades foram pescadas quase ao extermínio, justificando sua entrada na relação de ameaçadas, como ocorre, no mar, com o peixe cação-anjo (espécie de tubarão), e com a arraia viola, que constam das listas oficiais de fauna em risco de extinção.

Existem dezenas de combinações de piracema no Brasil, o que dificulta a fiscalização e o combate à captura ilegal em épocas de defeso e piracema, dizem os especialistas do Ibama, pois a entidade conta com apenas 1.156 fiscais para toda a extensão do território brasileiro e zona costeira. De acordo com o analista ambiental Maurício Brichta, o Ministério da Pesca e a Marinha do Brasil possuem um cadastro com mais de 70 mil embarcações de mar e rio, mas apenas 1.592, menos de 1%, são rastreáveis por satélite.

Algumas frotas pesqueiras, esclarece outro analista ambiental do Nupesc/Ibama, Alexandre Marques, não se submetem a qualquer período de defeso, como, por exemplo, o arrasto de peixe com rede. “Precisam apenas respeitar a captura nas áreas de exclusão de pesca marinha, diferentemente da pesca de arrasto do camarão, que tem local de exclusão e período de defeso”, diz. Marques lembra que o ordenamento pesqueiro precisa avançar e regulamentar as pescarias previstas no atual modelo de concessão de autorizações de pesca dada às embarcações, conforme consta da INI MPA/MMA nº 10/2011.

Contra o ilegal – Como a fiscalização não alcança patamar ideal, barcos sem sistema de rastreamento praticam captura ilegal e, para não serem identificados por helicópteros e barcos da Marinha do Brasil, cobrem os nomes com papelão ou lona. Falta conscientização para a necessidade de interromper a atividade no período reprodutivo dos animais, lamenta Maurício Brichta.

Mônica Peres, gerente da GBA/MMA, explica que o defeso é uma ferramenta de ordenamento importante para reduzir a pesca em épocas críticas, além de garantir a reprodução e reposição dos animais no ambiente. “Entretanto, a proibição não deveria ser por espécie mas sim para toda região (bacia hidrográfica) ou toda a frota de barcos”, sugere, o que tornaria a fiscalização mais efetiva.

Dificuldades – Nas bacias hidrográficas da região Amazônica, por exemplo, é bem difícil acompanhar as atividades pesqueiras durante a piracema e o defeso devido à enorme extensão territorial, o acesso complicado e a escassez de meios flutuantes para apoiar o trabalho dos fiscais, lamenta Alexandre Marques, do Ibama. Felizmente, segundo Marques, algumas comunidades e donos de barcos compreendem e aceitam a necessidade de para a atividade durante os períodos de reprodução, com vistas à sua própria perpetuidade.

Foi exatamente a falta de conscientização que colocou um conjunto enorme de invertebrados aquáticos e peixes na lista de ameaçados de extinção e sobreexplotados ou ameaçados de sobreexplotação. De acordo com a Instrução Normativa nº 5/2004, espécies ameaçadas de extinção são aquelas com alto risco de desaparecimento na natureza em futuro próximo, assim reconhecidas pelo Ministério do Meio Ambiente; as sobreexplotadas são as que as condições de captura de uma ou todas as classes de idade em uma população são tão elevadas que reduz a biomassa, o potencial de desova e as capturas no futuro a níveis inferiores aos de segurança; e as ameaçadas de sobreexplotação são aquelas cujo nível de explotação (retirada, extração, captura para beneficiamento, transformação e utilização), se mantido, levará ao estado de sobreexplotação. (Fonte: MMA)