O principal motor de extinção da vida selvagem não são as mudanças climáticas, mas a captura voraz de espécies pela humanidade e o nosso crescente impacto agrícola, disseram pesquisadores em um artigo publicado na quinta-feira, acompanhado de um apelo para que haja uma redefinição das prioridades de conservação.
Em uma análise de 8.688 espécies “ameaçadas” ou “quase ameaçadas”, os cientistas descobriram que três quartos delas estão sendo sobre-exploradas para comércio, lazer ou subsistência.
A demanda por carnes e partes do corpo levaram, por exemplo, o gorila do ocidente e o pangolim chinês à beira da extinção, assim como o rinoceronte de sumatra, cujo chifre é usado na China na fabricação de remédios falsos.
E mais da metade das espécies de animais e plantas avaliadas estão sofrendo devido à conversão de seus habitats naturais em fazendas industriais e plantações, principalmente para criar gado e plantar commodities para combustível ou alimentação.
Em comparação, apenas 19% dessas espécies estão atualmente afetadas pelas mudanças climáticas, relataram os pesquisadores no estudo publicado na revista científica Nature.
Os orçamentos para a conservação devem refletir essa realidade, disseram os cientistas.
“Voltar-se para os antigos inimigos, a caça excessiva e as atividades agrícolas, é a chave para reverter a crise de extinção da biodiversidade”, disse o autor principal do estudo, Sean Maxwell, professor da Universidade de Queensland, na Austrália.
Essas ameaças, em vez das mudanças climáticas, “devem estar no topo da agenda de conservação”, disse Maxwell em um comunicado.
Um grupo de 43 especialistas em conservação, por sua vez, emitiu recentemente um apelo público para salvar a cada vez menor megafauna terrestre do mundo, desde grandes felinos até os elefantes e macacos gigantes.
A menos que o financiamento para salvá-los aumente pelo menos dez vezes, eles “podem não sobreviver ao século XXII”, escreveram os especialistas na revista BioSciences.
O apelo provocativo na Nature – que provocou reações afiadas – chegam um mês antes de uma reunião crucial da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), um grupo de governos, indústrias e ONGs.
A IUCN também gerencia a Lista Vermelha de espécies ameaçadas, rastreando e catalogando a saúde da flora e fauna da Terra.
Evento de extinção em massa – As mudanças climáticas têm ofuscado prioridades mais tradicionais de conservação ao longo da última década, desviando recursos limitados e dinheiro das necessidades mais urgentes, argumentaram os autores.
A análise na Nature reconhece que o aquecimento global poderia se tornar uma ameaça cada vez mais dominante para a biodiversidade nas próximas décadas.
“Mas, esmagadoramente, a ameaça mais imediata vem da agricultura e da sobre-exploração”, disse o coautor James Watson, um especialista em biodiversidade da Wildlife Conservation Society.
“A menos que ataquemos estes problemas agora, muitas espécies podem já ter desaparecido quando os impactos das mudanças climáticas realmente começarem”, disse Watson.
A Terra, ele apontou, entrou agora em um “evento de extinção em massa”, no qual as espécies estão desaparecendo 1.000 a 10.000 vezes mais rapidamente do que um ou dois séculos atrás.
Outros conservacionistas criticaram a análise e o apelo publicados na Nature.
“Não há necessidade de fazer trocas entre diferentes prioridades de conservação – precisamos de todas elas”, disse à AFP Peter MacIntyre, especialista em ecologia na Universidade de Wisconsin.
“De que serve proteger um habitat que se torna privado de oxigênio ou muito quente para suas espécies devido ao aquecimento global, ou quando os níveis dos lagos diminuírem devido a mudanças nos padrões de precipitação?”, questionou.
Em outras palavras, não faz sentido olhar para diferentes problemas isoladamente.
Christopher Wolf, um especialista em grandes carnívoros da Universidade do Estado de Oregon, concorda com a análise na Nature, observando que a caça e as perdas de habitat são – pelo menos para os grandes felinos e os lobos – perigos muito maiores no curto prazo.
Mas as diferentes pressões sobre a biodiversidade do planeta têm uma coisa em comum, acrescentou Wolf: “Todas as ameaças enfrentadas pelas espécies são causadas pelo homem”. (Fonte: UOL)