O diálogo entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e as comunidades quilombolas do Alto Trombetas I e II, localizadas ao longo do rio Trombetas, ambas no município de Oriximiná, no oeste do Pará, se fortaleceu nesta semana. Em reunião realizada em Brasília na terça e quarta-feira (29 e 30/08), o governo apresentou propostas de Contrato de Concessão de Direitos de Uso (CCDRU) e Termo de Compromisso para os remanescentes de quilombos que vivem e solicitam a titulação de território na Reserva Biológica (Rebio) do Rio Trombetas e na Floresta Nacional (Flona) do Rio Trombetas.
“Esse é um diálogo inovador. Estamos discutindo os caminhos com eles, caminhos que ninguém trilhou antes. Uma vez resolvido esse empasse, outros territórios terão esse precedente como modelo e as questões serão mais facilmente resolvidas”, explicou a secretária de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do MMA, Juliana Simões. A proposta, segundo a secretária, é que ambos os direitos, garantidos pela Constituição Federal, sejam reconhecidos: o dos quilombolas ao território e o do meio ambiente à conservação.
Para o gestor da Rebio Rio Trombetas e da Flona Saracá-Taquera, Marcello Borges, os diálogos têm se dado de forma franca e pautados na confiança mútua. “O caso de Trombetas tem esses dois direitos constitucionais de mesma hierarquia, e o nosso trabalho é conciliar esses dois direitos. De 10 anos para cá, com a criação do ICMBio, temos conseguido avançar nessas tratativas”, declarou.
Proposta – A reunião em Brasília definiu cinco novos encontros para dezembro, entre os dias 13 e 17, dois nas comunidades do território Alto Trombetas I e três no território Alto Trombetas II. As novas reuniões serão uma oportunidade de compartilhar informações com o maior número possível de pessoas, conforme os preceitos da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais.
Na ocasião, o Ministério do Meio Ambiente vai informar e debater a proposta de consolidação, uso e desenvolvimento do território com segurança. O MMA e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) propõem, enquanto o processo de titulação do território avança, assinar, na Flona, um Contrato de Concessão de Direitos de Uso (CCDRU), pautado no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). O CCDRU funciona, na prática, como um direito real, assim como o direito de propriedade, e permite o uso do território de maneira sustentável, além de acesso a todas as políticas do Incra. Na Rebio, o MMA sugere um termo de compromisso que não comprometa os atributos da reserva.
A Rebio, unidade de conservação de proteção integral, tem uma riqueza diferenciada de recursos (caça, peixes, castanhas e outros produtos da floresta) e grande relevância em termos de biodiversidade e população tradicional.
Quilombolas – As comunidades do Alto Trombetas I e II encontram-se em unidades de conservação, uma de proteção integral (a Rebio do Rio Trombetas) e outra de uso sustentável (a Flona do Rio Trombetas). Os quilombolas já têm um processo de titulação da terra em andamento, segundo direito garantido pela Constituição Federal. Na avaliação do Incra, que elaborou e publicou o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), as áreas apontadas pelos estudos são imprescindíveis para a reprodução física, social e cultural dos remanescentes, segundo seus usos, costumes e tradições.
Juntas, as áreas quilombolas demandadas ocupam 350 mil hectares, nos quais vivem 13 comunidades e cerca de 400 famílias. A região do rio Trombetas é historicamente habitada por remanescentes de quilombos e reúne alguns territórios já titulados. O primeiro território titulado no Brasil, em 1995, é a Terra Quilombola Boa Vista, que fica no Rio Trombetas.
As atividades mais desenvolvidas por elas são o extrativismo, principalmente, da castanha do Pará e de óleo-resina como a copaíba. A agricultura e a pesca, em pequena escala, de subsistência, também são praticadas. Entre as manifestações culturais presentes na região, há danças e manifestações religiosas.
Lideranças – Para o líder da comunidade de Tapagem, Aluízio Silvério dos Santos, 68 anos, que faz parte da associação Mãe Domingas (Terra Quilombola Alto Trombetas I) o encontro em Brasília com o governo foi positivo. “Achei bom, é um começo de negociação para chegarmos num consenso. Tivemos um debate que faz parte de qualquer reunião. Vamos concretizar, dar prosseguimento, e vai ser muito importante para nós e também para o governo. Ficou muito claro que esse diálogo com o governo, que nunca tinha tido, vai ajudar na demarcação da terra”, afirmou.
Já a coordenadora da comunidade da Tapagem, Maria Raimunda Adão Cordeiro, relatou que, após a reunião, ela poderá explicar a situação às pessoas da comunidade. “Para mim, deu pra começar a entender, evoluiu bastante e tenho como explicar na comunidade. A gente quer garantir as nossas terras, a gente vive de lá, fomos nascidos e criados lá. É uma garantia para nossos descendentes”.
Participam das reuniões com as associações e comunidades quilombolas do Alto Rio Trombetas o MMA, Incra, ICMBio, Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Fundação Cultural Palmares, Procuradoria-Geral Federal, Ministério Público Federal e Ministério Público do Pará. (Fonte: MMA)