Técnicas que utilizam células-tronco germinativas para preservação de animal em risco de extinção, incluindo peixes, e impactos da hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu (PA) são alguns dos temas discutidos no primeiro dia do II Simpósio de Biologia e Pesca em Água Doce, nesta segunda-feira (13). Promovido pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC), o evento segue até sexta-feira (17) no instituto com palestras e minicursos.
A palestra de abertura sobre Espermatogênese e transplante de espermatogônias tronco em peixes foi proferida pelo diretor do Inpa Luiz Renato de França, que é professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde desenvolve pesquisas sobre reprodução animal, indo de peixes até os mamíferos, incluindo o homem. França deu uma visão geral da técnica e das possibilidades de transplante com células germinativas em mamíferos e peixes.
“Essa técnica é uma ferramenta muito valiosa para diversos objetivos e cada pesquisador vai desenvolver o seu de acordo com sua necessidade, como preservação de animal em perigo de extinção, reprodução de animais que não se reproduzem em cativeiro, produção de animais com o objetivo de melhorar zootécnica e geneticamente, entendimento de mecanismos e muitos outros”, conta França, que aproveitou a oportunidade para divulgar o 11° Simpósio Internacional de Fisiologia da Reprodução de Peixes, que acontecerá em Manaus de 03 a 08 de junho de 2018. Mais informações no endereço http://isrpf2018.com.br/pt/home/
Em peixes, as pesquisas apresentam-se com enorme potencial econômico da piscicultura no mercado mundial de alimentos, a exemplo dos estudos desenvolvidos no Japão para produção de atum, na República Tcheca para esturjão e na França com a truta. Na UFMG já são realizados estudos com o pirarucu, espécie que demora a se reproduzir. Em cativeiro, o peixe leva de quatro a cinco anos.
Nativo da Amazônia e um dos maiores peixes de água doce do mundo, o pirarucu, segundo França, é uma espécie que não se reproduz em condição laboratorial de cativeiro ou a reprodução não é boa, além disso, a espécie tem apenas uma gônoda (órgão onde são produzidas as células sexuais, os gametas, necessária para a reprodução), tem poucos alevinos e a viabilidade das larvas é pequena.
O pirarucu tem atraído o interesse dos piscicultores pelo seu grande porte, que pode chegar a três metros de comprimento e atingir 200 quilos, possuir carne branca, magra, saborosa e permitir cortes sem espinhas de excelente qualidade.
“Então, o que estamos tentando fazer é criar um mecanismo para no futuro o pirarucu possa se reproduzir em outras condições e também melhorá-lo geneticamente. Para isso, estamos utilizando a tilápia como peixe-receptor como se fosse uma ‘barriga de aluguel’”, explica França, lembrando que a tilápia é um peixe resistente, de rápido crescimento e não sazonal, considerado um “modelo perfeito” para pesquisas laboratoriais.
Até a sexta-feira o Simpósio receberá cerca de 40 palestrantes de várias áreas, entre estudantes e egressos da pós-graduação, pesquisadores e professores do Inpa e de outras instituições ligados ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas Biologia de Água Doce e Pesca Interior (Badpi). Para esta terça-feira estão programadas palestras como Peixes da Amazônia: desafios ambientais (Dr. Adalberto Val/Inpa), Potencial Impacto de novas hidrelétricas andinas sobre o ecossistema fluvial amazônico (Dr. Bruce Forsberg/ Inpa) e golfinhos da Amazônia (Marcele do Valle/ Ampa).
De acordo com a organização do evento, o Simpósio é uma oportunidade de divulgação de pesquisas e de integração entre professores e estudantes da pós-graduação (mestrado e doutorado) e da graduação, que serão os futuros alunos do curso. O evento acontece a cada dois anos.
“Esse é um espaço de temas variados, indo desde as cinco linhas de pesquisa do Badpi, como biologia, ecologia e conservação de peixes e distribuição e conservação da biodiversidade, até o papel da mulher na ciência e a depressão na pós-graduação”, explicou a pesquisadora do Inpa e uma das organizadoras do evento, Cláudia de Deus.
Hidrelétrica no rio Xingu
A estudante de doutorado do Badpi Alany Gonçalves falou sobre a Hidrelétrica no rio Xingu: o que perdemos com Belo Monte?. Segundo a bióloga, a construção da hidrelétrica com o desvio do leito do rio provocou sérios impactos ao ambiente e a população, como perdas com relação aos peixes, outros organismos aquático e terrestre – ariranhas e lontras estão se afastando da região e o gavião-real está perdendo seu habitat –, e aumento da violência na região.
Das 24 turbinas previstas, dez estão em operação e o restante está previsto para começar a funcionar até 2019. “Houve um grande índice de desmatamento e isso acabou retirando o habitat de diversas espécies. E essas mudanças que vão ocorrer no ambiente aquático também estarão impactando uma série de espécies que são endêmicas do xingu, que ocorrem somente lá”, conta Gonçalves.
No rio Xingu, região de muitas cachoeiras, a estimativa é que existam mais de 460 espécies de peixes, sendo 50 endêmicas do Xingu. Dentre essas, há um conjunto de espécies que ocorre somente na região de Volta Grande, onde a hidrelétrica é construída. “E são peixes que têm uma dependência muito grande de substrato, da qualidade da água e de onde estão vivendo”, conta a doutoranda.
Conforme Gonçalves, as mudanças no leito do rio geram um impacto significativo sobre várias espécies, com algumas correndo o risco de desaparecer como é o caso do acari-zebra (Zebra), que está na lista oficial de espécies ameaçadas do Brasil, sendo um peixe ornamental com alto valor de mercado pela sua raridade e beleza.
“Essa região em especial a da Volta Grande, onde é construída a hidrelétrica e onde tem essa quantidade de espécies endêmicas elevada, a previsão é que ela fique apenas com 20% do volume de água original. Então será se esse volume reduzido de água com todas as mudanças que acabará ocorrendo com o aumento da temperatura da água, variações na qualidade de água vai suportar as espécies que habitam esses ambientes?”, questiona.
Fonte: Inpa