A adaptação de comunidades tradicionais e indígenas às mudanças climáticas e aos impactos de grandes empreendimentos foi discutida em uma sessão especial nesta quarta-feira (22), durante o 8º Fórum Mundial da Água (FMA). Não havia lideranças indígenas brasileiras presentes ao debate, mas a representante do Canadá, Sunny Lebourdais, deu exemplos de como a luta das lideranças impediu ações de uma mineradora na província Colúmbia Britânica.
Ela contou que foi necessário um processo de dois anos para que o governo local e as autoridades federais do Canadá determinassem o cancelamento de um projeto que colocaria em funcionamento uma mina a céu aberto.
“Na nossa conexão e entendimento sobre as mudanças climáticas sabemos que, se fosse desrespeitada essa área, poderíamos esperar um grande número de consequências, desde calor e seca até enchentes. Então a decisão saiu em março de 2017, quando eles finalmente reconheceram que as ações teriam impacto ambiental adverso”, relatou.
Segundo Victor Salviati, coordenador da Fundação Amazonas Sustentável, as estratégias de convencimento das comunidades amazonenses para o cuidado com as mudanças do clima passam por três pontos: engajamento social por meio de oficinas, soluções práticas e eficientes e a adaptação nos sistemas produtivos para a realidade dos povos. “Não funciona nada [se a solução for] trazida pelo homem branco ou outras pessoas de fota. Tem que ser uma coisa adaptada à realidade da comunidade”, explicou.
Citando exemplos de iniciativas científicas que podem reduzir os danos de tragédias, Victor Salviati disse que no ano passado foram promovidas 149 capacitações com as comunidades do estado do Amazonas. Segundo ele, as oficinas ocorrem durante dois dias para que os participantes possam dormir nos locais e, assim, acompanhar com toda a família as etapas da capacitação. O objetivo, frisou, é estabelecer uma “metodologia de engajamento” utilizando dinâmicas como desenho e teatro para que o “aprendizado possa ser facilmente incorporado” pelas comunidades.
O membro da Fundação Amazônia Sustentável mencionou as iniciativas bem-sucedidas de dois purificadores de água: o primeiro que utiliza a energia solar para o fornecimento de água limpa e o segundo, com sachês que são misturados à água do rio. Neste caso, informou, os purificadores que custam apenas R$ 0,15 são distribuídos para as comunidades que, após movimentarem a água de um balde, podem filtrá-la e, assim, utilizar para consumo humano. “Basta mexer durante cinco minutos e filtrar em um pano limpo. Diminuiu bastante as doenças transmitidas pela água, principalmente a diarreia”, disse Salviati.
Além disso, segundo ele, o Instituto Socioambiental (ISA) tem adotado a prática de distribuir cartazes com alertas sobre enchentes de rios. Foi o que aconteceu em 2014 e 2016 – e deve ocorrer novamente no fim deste ano. Antes das intervenções, foi exibido um filme do ISA sobre a devastação de terras indígenas próximo ao Rio Xingu. O vídeo mostrou também o impacto de queimadas no local que, em 2010, acabou com 10% do território indígena, em uma região na qual 16 povos convivem em diferentes áreas da floresta.
Citando o fogo como evento da ação humana, mas também como parte da cultura dos índios canadenses, Sunny Lebourdais lembrou que, no passado, algumas queimadas eram utilizadas pelos antecedentes dos indígenas do Canadá, tendo como objetivo a caça de animais. Ela observou, porém, que os recentes incêndios têm ocorrido de forma mais intensa. “Há um grande acúmulo de calor no chão. Notamos que ele queima mais forte. Algumas das lideranças e conhecedores da terra dizem que vai levar muito mais anos porque a vida microbial e elementos do solo não estão mais presentes”, alertou.