De acordo com a análise mais abrangente já feita sobre o impacto do sistema alimentar no meio ambiente, reduções enormes no consumo de carne no mundo todo são essenciais para evitar mudanças climáticas perigosas.
Isso significa que o cidadão médio precisa comer 75% menos carne bovina, 90% menos carne de porco e metade do número de ovos, enquanto triplica o consumo de feijões e leguminosas e quadruplica o de nozes e sementes.
A pesquisa também descobriu que enormes mudanças na agricultura são necessárias para evitar a destruição da capacidade do planeta de alimentar as 10 bilhões de pessoas o habitarão dentro de algumas décadas.
Esse é o estudo mais completo já feito até o momento, combinando dados de todos os países para avaliar o impacto da produção de alimentos e propondo soluções para a crise alimentar iminente.
“Esverdear o setor de alimentos ou comer o nosso planeta”
A produção de alimentos já causa grandes danos ao meio ambiente. Estamos falando dos gases de efeito estufa provenientes da pecuária, do desmatamento, da escassez de água e das vastas zonas mortas oceânicas devido à poluição agrícola.
Se não fizermos nada, seu impacto ficará ainda pior à medida que a população mundial aumentar em 2,3 bilhões de pessoas até 2050 e a renda global triplicar, permitindo que mais pessoas se alimentem com dietas ocidentais ricas em carne.
Essa trajetória extrapolaria os limites ambientais críticos além dos quais a humanidade poderá sobreviver.
“É muito chocante”, disse Marco Springmann, da Universidade de Oxford (Reino Unido), que liderou a equipe de pesquisa. “Estamos realmente arriscando a sustentabilidade de todo o sistema”.
“Alimentar uma população mundial de 10 bilhões é possível, mas apenas se mudarmos a maneira como comemos e a maneira como produzimos alimentos”, complementou o professor Johan Rockström, do Instituto Potsdam para Pesquisa sobre o Impacto Climático (Alemanha). “Esverdear o setor de alimentos ou comer o nosso planeta: é isso que está no cardápio hoje”.
Dieta “flex”
Recentemente, cientistas alertaram que temos apenas cerca de doze anos para manter o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius. Se passarmos sequer meio grau, isso piorará significativamente os riscos de seca, inundações e calor extremo.
O novo estudo explica que comer menos carne e laticínios é importante para manter essa meta, mas as tendências atuais seguem na direção oposta.
Os pesquisadores descobriram que uma mudança global para uma dieta “flexitariana” é necessária para manter a mudança climática abaixo de 2 graus Celsius. Isso reduziria pela metade as emissões de efeito estufa.
Nas nações ricas, as mudanças dietéticas necessárias são ainda maiores. Os cidadãos do Reino Unido e dos EUA precisam reduzir a carne bovina em 90% e o leite em 60%, enquanto aumentam o consumo de grãos entre quatro e seis vezes. Já milhões de pessoas em países pobres estão desnutridas e precisam comer um pouco mais de carne e laticínios.
O quadro acima mostra, à esquerda, o que precisamos comer menos para evitar que a temperatura global suba mais de 2° C até 2050: carne de porco, carne de vaca, cordeiro, aves, açúcar e leite. A faixa laranja corresponde à diminuição de consumo necessária em cidadãos de países desenvolvidos, e a faixa amarela à diminuição de consumo necessária globalmente, em média. A coluna da direita mostra o que precisamos comer mais: legumes, nozes e sementes, vegetais, frutas e óleo vegetal.
Peça a seus governantes que salvem o meio ambiente
A redução do consumo de carne pode ser obtida por meio de uma mistura de educação, impostos, subsídios para alimentos vegetais e mudanças nos cardápios escolares e locais de trabalho.
Para deter o desmatamento, a escassez de água e a poluição causada pelo uso excessivo de fertilizantes, mudanças profundas nas práticas agrícolas são necessárias, o que inclui aumento das colheitas nas nações mais pobres, armazenamento mais universal de água e uso mais cuidadoso de fertilizantes.
Todas essas opções já estão sendo implementadas em algum lugar do mundo. Na Holanda e em Israel, os fertilizantes e a água estão sendo mais bem utilizados, enquanto jovens estão fazendo grandes cortes no consumo de carne em algumas cidades.
Mas uma mudança global é essencial. “Eu acho que podemos fazer isso, mas realmente precisamos de muito mais governos proativos para fornecer a estrutura correta. As pessoas podem fazer uma diferença pessoal mudando sua dieta, mas também batendo nas portas de seus políticos e dizendo que precisamos de melhores regulamentos ambientais – isso também é muito importante. Não aliviem para os políticos”.
Não há outra opção
“Em última análise, vivemos em um planeta finito, com recursos finitos. É uma ficção imaginar que existe uma solução tecnológica que nos permita produzir tanta comida quanto desejaríamos, permitindo-nos comer demais e desperdiçar muito”, esclarece o professor Tim Benton, da Universidade de Leeds (Reino Unido), que não fez parte da equipe de pesquisa.
O peso ambiental do atual sistema alimentar prejudica a capacidade das gerações futuras de viverem em um planeta estável e ecologicamente rico.
“Sabemos que as escolhas alimentares são muito pessoais, e que a mudança de comportamento pode ser difícil de encorajar, mas as evidências são inequívocas – precisamos mudar nossas dietas se quisermos ter um futuro sustentável. O fato de que isso também nos tornará mais saudáveis faz com que seja uma escolha óbvia”, finaliza Peter Smith, da Universidade de Aberdeen (Reino Unido).
A pesquisa foi publicada na revista científica Nature.
Fonte: Hypescience