Facebook, Google e Microsoft patrocinam evento que nega mudanças climáticas

Empresas nunca perdem a oportunidade de tomar para si pautas importantes para a sociedade, como é o caso da proteção do meio ambiente. Por diversas vezes, grandes companhias já participaram de campanhas de promoção da proteção ambiental e contra o aquecimento global. Já foi o caso, por exemplo, de gigantes como a Google, o Facebook e a Microsoft. Estas empresas já vieram a público alertar sobre os perigos do aquecimento global. Portanto, é bastante curioso – e alarmante – que essas três empresas de tecnologia tenham patrocinado uma conferência que promoveu a negação das mudanças climáticas a jovens americanos.

É isso mesmo: segundo o portal americano Mother Jones, as três companhias patrocinaram a LibertyCon, uma convenção anual do grupo libertário Students for Liberty, que ocorreu em Washington, capital dos EUA. O Google foi quem mais deu dinheiro para o evento, um “patrocinador platina”: foram 25.000 dólares arrecadados. Facebook e Microsoft, “patrocinadores ouro”, contribuíram com 10.000 dólares cada. As doações colocam as empresas de tecnologia na companhia de três grupos conhecidos por atacar a ciência por trás das mudanças climáticas e tentar minar os esforços para reduzir as emissões de carbono.

Entre as mais notáveis entre estas ​​está a CO2 Coalition, um grupo fundado em 2015 para divulgar notícias positivas a respeito do CO2, um gás de efeito estufa cujo aumento na atmosfera está ligado às catastróficas mudanças climáticas em nosso planeta. Segundo a matéria do Mother Jones, essa organização é financiada por fundações conservadoras que já apoiaram outros esforços de negação das mudanças climáticas. “Estas incluem a Fundação Mercer Family, que nos últimos anos doou centenas de milhares de dólares para think tanks de direita envolvidos na negação da mudança climática, e o Instituto Charles Koch, o braço de caridade de um dos irmãos por trás das Indústrias Koch, a gigante do petróleo e do gás”.

A matéria da jornalista Stephanie Mencimer descreve alguns dos momentos mais “marcantes” da conferência. “No salão de exposição da LibertyCon, a CO2 Coalition distribuiu folhetos informando que seu objetivo é ‘explicar como nossas vidas e nosso planeta Terra serão melhorados com mais dióxido de carbono atmosférico’. Uma brochura afirmava que ‘mais dióxido de carbono ajudaria a todos, inclusive gerações futuras de nossas famílias ‘e que o ‘recente aumento nos níveis de CO2 teve um efeito positivo mensurável sobre a vida vegetal’, aparentemente porque o gás de efeito estufa fará com que as plantas cresçam mais rapidamente”, descreve.

“Em uma apresentação de sábado, Caleb Rossiter, professor de estatística aposentado e membro da CO2 Coalition, fez uma apresentação (…) na qual disse aos estudantes reunidos que o impacto das mudanças climáticas nos padrões climáticos tem sido muito exagerado. ‘Não houve aumento de tempestades, em intensidade ou frequência. Os dados não mostram uma tendência preocupante’, disse. Ele insistiu que quando ouvir a notícia de que os níveis de dióxido de carbono na atmosfera estão subindo, estará celebrando. Isso porque, segundo ele, o dióxido de carbono “é um fertilizante” que tornou a África mais verde e aumentou a produção de alimentos lá, reduzindo a miséria humana”.
Rossiter também afirmou que as emissões de dióxido de carbono estão correlacionadas com a riqueza e que o gás de efeito estufa “melhora a expectativa de vida” porque os países pobres que começam a queimar combustíveis fósseis têm uma fonte de energia mais consistente e podem limpar sua água. “Fico feliz quando o dióxido de carbono está em alta, porque significa que a pobreza está em baixa”, declarou durante a convenção.

Mencimer destaca que as declarações de Rossiter o colocam “nas margens mais distantes do mundo da negação das mudanças climáticas”. Isso porque nem mesmo a Exxon, gigante do petróleo, está mais defendendo tais argumentos pseudo científicos.

Outra instituição que luta contra a ciência das mudanças climáticas que patrocinou o evento foi o Instituto Heartland. Esta organização tem, há muito tempo, feito esforços financiados pela indústria para minar a ciência do clima e afastar os esforços para reduzir as emissões de carbono. A conservadora Heritage Foundation, que pressionou o governo Trump a retirar-se dos acordos climáticos de Paris e que há muito tempo apresenta especialistas que argumentam que o aquecimento global é um mito, também era um dos patrocinadores.

Contradições

Declarações e companhias como estas estão muito distantes do que Google, Facebook e Microsoft defendem publicamente. As três empresas, além de falarem sobre os perigos do dióxido de carbono, se comprometeram a reduzir suas próprias pegadas de carbono. A Microsoft prometeu cortar as emissões de carbono em 75% até 2030. A Google afirma estar comprometida com um futuro “zero carbono” e está buscando “agressivamente” fontes de energia renováveis ​​para reduzir suas emissões de carbono e ajudar a combater as mudanças climáticas. E o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, criticou o presidente Donald Trump depois que anunciou que os Estados Unidos se retirariam do acordo climático de Paris. “Parar a mudança climática é algo que só podemos fazer como comunidade global e temos que agir juntos antes que seja tarde”, declarou na época.

A explicação para a presença de gigantes da tecnologia na lista de patrocinadores de uma conferência libertária é que libertários têm por característica a defesa da propriedade privada. Em um momento em que governos de todo o mundo tentam regulamentar as mídias sociais e a privacidade online, as empresas de tecnologia enxergam os libertários como aliados naturais na luta contra a regulamentação – a Google, por exemplo, patrocinou duas sessões diferentes na conferência, uma sobre por que a “inovação sem permissão” precisa ser defendida e outra sobre se o governo “continuará deixando a Internet ser incrível”.

Segundo Mencimer, um porta-voz do Facebook respondeu a perguntas sobre o patrocínio da LibertyCon enviando um link para a página de engajamento político da empresa, que diz: “Às vezes apoiamos eventos que destacam questões de mídia social e da Internet” e apresenta uma longa lista de grupos de terceiros com quem eles trabalharam no passado. Ele observou que a LibertyCon atendia aos critérios de apoio da empresa e citou o número de sessões não relacionadas à mudança climática do evento.

Um porta-voz do Google defendeu o patrocínio da LibertyCon dizendo: “Todos os anos, patrocinamos organizações de todo o espectro político para promover fortes leis tecnológicas. Como deixamos claro em nosso relatório de transparência de políticas públicas, o patrocínio ou a colaboração da Google com uma organização de terceiros não significa que endossamos toda a agenda da organização ou concordamos com outros palestrantes ou patrocinadores”.