Beira, um dos centros urbanos mais antigos de Moçambique e o quarto maior do país, costumava ser, em dias comuns, uma cidade portuária espetacular, debruçada sobre o Oceano Índico.
Fundada no século 19 pelos portugueses, a paisagem de Beira é pontilhada de edifícios que evocam a memória da arquitetura colonial no segundo maior país lusófono do mundo.
Mas os dias em Beira estão longe de ser comuns. Em 14 de março, a cidade foi atingida pelo devastador Idai, o maior ciclone tropical a se abater sobre o país desde o Jokwe, que chegou ao solo moçambicano em 2008.
“Desde sexta-feira e até hoje cedo, não tivemos acesso a nenhuma rede de telefonia móvel. A maioria dos prédios teve suas janelas estilhaçadas, torres de comunicação móvel e postes de eletricidade também foram arrancados. Edifícios de escolas estão acomodando os deslocados pelas inundações”, conta Samuel Fenis, morador do bairro de Macurungo.
A tempestade, que também afetou os países vizinhos Malauí e Zimbábue, trouxe desafios para as vidas da população de Beira, estimada em cerca de 500 mil pessoas. Por anos, a cidade costeira esteve suscetível a desastres relacionados ao clima, como tempestades violentas e cheias recorrentes.
Até o momento, as autoridades moçambicanas afirmam que pelo menos 200 pessoas morreram devido aos danos causados pelas cheias de dois grandes rios, o Buzi e o Pungwe. Mas o número real só ficará mais claro depois que as águas baixarem nos três países afetados.
“Beira está praticamente paralisada, com muitos moradores passando fome e sem comida e abrigo. As conexões de transporte pelas estradas entre Beira e outras cidades, como Maputo, foram cortadas, pois as enchentes danificaram as principais rodovias, deixando-as intransponíveis”, acrescenta Fenis em entrevista à ONU Meio Ambiente.
O impacto do ciclone Idai demonstra claramente a necessidade de desenvolver melhores ferramentas de conscientização e preparação para emergências, a fim de fortalecer a resiliência das comunidades locais aos impactos dos desastres.
“O ciclone é mais um lembrete da necessidade de um maior e mais urgente investimento na redução de riscos de desastre baseada nos ecossistemas e na adaptação às mudanças climáticas, para reduzir o custo humano e financeiro dos desastres naturais. A gestão ambiental responsável, os impactos das mudanças climáticas e as respostas aos desastres estão intimamente ligados e exigem uma abordagem mais sistemática e abrangente para a gestão de riscos de desastre”, afirma a diretora regional da ONU Meio Ambiente para a África, Juliette Biao.
Em outubro de 2018, o Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNISDR) lançou um relatório que frisava o alarmante impacto financeiro dos desastres relacionados ao clima. No período 1998-2017, países atingidos por desastres relataram perdas econômicas diretas de 2,9 bilhões de dólares. As catástrofes associadas ao clima respondiam por 2,245 bilhões do montante — 77% do total.
Após o vazamento de gás em Bhopal, na Índia, em 1984, a ONU Meio Ambiente tomou medidas para prevenir desastres e reduzir os seus impactos, por meio da elaboração do Manual de Conscientização e Preparação para Emergências no Nível Local.
“O manual ajuda comunidades a prevenir mortes, prejuízos à saúde, ao bem-estar e aos meios de subsistência, a minimizar danos às propriedades e a proteger o meio ambiente. Ele é aplicável independentemente do caráter da emergência ambiental — quer se trate de um acidente industrial, desastre natural ou uma combinação de eventos, como pode ocorrer na sequência de um terremoto ou tsunami ou de uma tempestade como o Idai”, explica Saidou Hamani, coordenador de Resiliência a Desastres e Conflitos do Escritório Regional da ONU Meio Ambiente para a África.
O manual visa motivar e empoderar lideranças locais, para que se preparem para emergências de modo mais efetivo e construam resiliência.
Como a principal autoridade ambiental global, a ONU Meio Ambiente desenvolveu em 2015 a segunda edição da publicação. O volume enfatiza a importância de uma abordagem integrada, voltada para a gestão de perigos múltiplos, além de ressaltar a importância do engajamento de diferentes partes interessadas e de toda a sociedade.
A agência das Nações Unidas, que define a agenda ambiental global, está trabalhando para lidar com os desastres naturais, acidentes industriais e crises provocadas pelos seres humanos. O organismo internacional apoia dezenas de países, como Afeganistão, Haiti, Iraque, Sudão e Sudão do Sul.
Fonte: ONU