Na noite de 26 de maio de 2019, a Alemanha pôde vivenciar por um momento o que significa quase 20 milhões de cidadãos levantarem a voz. A eleição para o Parlamento Europeu provou que os jovens do país se interessam pelo mundo em torno de si – e são barulhentos.
A participação nas urnas cresceu, os partidos estabelecidos observaram, assustados, como seus níveis de aprovação caíam, o partido do clima Aliança 90/Os Verdes, triunfou: tudo isso, mérito dos eleitores abaixo dos 30 anos de idade.
Por isso, já se fala na Alemanha de uma nova geração politizada, só comparável aos “jovens selvagens” de 1968, que colocaram em questão os valores do pós-guerra no país. Assim como mais de cinco décadas atrás, esta “geração do clima” também poderia causar uma reviravolta na máquina política tradicional, criar novos valores, impor uma agenda própria.
Mais de 19 milhões dos 80 milhões de habitantes da Alemanha tem menos de 25 anos: no Oeste, eles são cerca de 24% da população, no Leste, 19%. Nem todos podem ainda votar, mas o Fridays for Future conseguiu mobilizar muitos deles: em meados de março, o movimento ambientalista conclamou à primeira greve mundial pelo clima; no fim de maio, à segunda.
Na Alemanha mais de 300 mil protestaram em março, a maioria escolares e universitários, e 31% iam às ruas pela primeira vez, segundo uma enquete do Instituto para Pesquisa de Protestos e Movimentos.
A sueca Greta Thunberg, de 16 anos, que fundou o movimento climático em seu país, é um modelo para muitos. Segundo o especialista em assuntos da juventude Simon Schnetzer, ela “rompeu uma barragem” e “vai entrar para a história como a pessoa que mudou o discurso”. “Com o Fridays for Future, muitos menores de 18 anos, que ainda não podem votar, sentiram pela primeira vez como é codeterminar a agenda mundial”, analisa.
Onda progressiva
Na Alemanha, no momento, é como se todo um país tivesse repentinamente descoberto seus cidadãos de menos de 30 anos. Universitários são convidados para os mais importantes talkshows televisivos e estampa a capa da conceituada revista Der Spiegel.
E, no entanto, essa é apenas a manifestação de algo que se anunciava há tempos: o Estudo Jovem Shell já acusava em 2015 que 41% dos entrevistados se declaravam interessados pela política, contra 30% em 2002. No entanto uma coisa mudou, nos últimos anos: a nova cultura de protesto é feminina. Uma pesquisa da Universidade Técnica de Chemnitz mostrou que nos protestos Fridays for Future em Amsterdam, Florença, Varsóvia e Viena 70% dos manifestantes eram mulheres.
Além disso, a nova cultura de protesto opera para além das instituições. Já em 2016, um estudo da Fundação Friedrich Ebert registrava que apenas 16% dos consultados se consideravam politicamente engajados no sentido mais estrito do termo, ou seja, eram filiados a um partido ou sindicato.
Enquanto nas grandes legendas políticas é preciso bastante tempo até se ser escutado, a nova geração politizada conta com um poderoso aliado: as redes sociais. Pouco antes do pleito para o Parlamento Europeu, o youtuber alemão Rezo causou reboliço na cena política nacional.
Num vídeo que foi clicado mais de 14 milhões de vezes, ele criticava as grandes legendas governamentais União Democrata-Cristã (CDU) e Partido Social-Democrata (SPD), sobretudo por negligenciarem a proteção climática. Em seguida, mais de 70 outros youtubers alemães desaconselharam de votar na CDU ou no SPD.
Para a fundadora do podcast Y-Politik, Tanja Hille, é decisiva a influência dos astros das redes sociais que normalmente não apresentam conteúdos políticos. “Minha geração precisava ir procurar ativamente por informações”, recorda a cientista política de 27 anos. “Hoje, os youtubers levam os temas políticos à casa dos jovens, eles têm que se ocupar deles.” Também por isso, diz, teve tanto sucesso o vídeo de Rezo, até então só conhecido por conteúdos de entretenimento.
Política estabelecida na defensiva
Na política estabelecida, contudo, as novas vozes ainda não se fizeram escutar; nas bancadas do parlamento federal há apenas poucos deputados jovens. E os grandes partidos também se mostram desajeitados na forma de lidar com forças novas, como os “influenciadores”.
A CDU respondeu na internet ao vídeo de Rezo no Youtube com um documento PDF de 11 páginas. “Quem reage assim, não entendeu a juventude. Ninguém lê uma coisa dessas até o fim”, afirma Anna Nell, de 19 anos, do grupo apartidário Junges Freiburg.
A youtuber Diana zur Löwen critica, acima de tudo, a postura defensiva dos partidos: “Acho que muitos estão fartos é de políticos sem sangue nas veias. Queremos ver novamente paixão, e também políticos que nos levem junto para o dia a dia deles, no Instagram.”
Por enquanto, o Fridays for Future é impulsionado principalmente por jovens cultos da classe média. E tampouco é tão apartidário quanto pareça: alguns dos representantes mais destacados do movimento pertencem ao Partido Verde ou do A Esquerda.
Porém a eleição europeia já mostrou que os jovens são capazes de estabelecer a agenda política. “Acho que só estamos vendo o começo. A máquina política está sendo revolucionada porque os jovens não só têm opiniões extremamente fortes, mas também conseguem alcançar um público gigantesco”, analisa o especialista em juventude Schnetzer.
Fonte: Deutsche Welle