Seis vulcões submarinos escondidos bem debaixo de nossos olhos


Um mergulhador do exército italiano, Carabinieri, coleta rochas de um dos vulcões recém-descobertos, Actea, em fevereiro de 2019. Ao estudar a química das rochas, a equipe espera entender melhor quando erupções anteriores ocorreram e saber mais sobre a evolução do sistema vulcânico.
FOTO DE OF EMANUELE LODOLO

Quando o monte rochoso balançou em sua tela de computador a bordo da embarcação R/V OGS Explora, o geofísico Emanuele Lodolo não conseguiu acreditar no que via. A apenas cerca de 6,4 quilômetros da costa da Sicília, a equipe havia tropeçado em um vulcão ainda desconhecido, que possuía um fluxo de lava solidificado ao longo de cerca de 4 quilômetros a oeste no leito do mar.

“Ficamos muito surpresos, pois realmente estávamos muito perto da costa”, diz Lodolo, pesquisador do Instituto Nacional de Oceanografia e Geofísica Experimental da Itália.

A estrutura, batizada de Actea, é um dos seis vulcões recentemente descobertos durante uma atividade de mapeamento da paisagem submarina do Canal da Sicília, uma movimentada via navegável na costa sudoeste da ilha. Embora Actea seja a estrutura localizada mais próximo da costa, as demais foram todas encontradas no lado noroeste do canal, a 22,5 quilômetros da terra firme, relatam pesquisadores no periódico Marine Geology.

Os vulcões não são especialmente altos, comparativamente falando, atingindo cerca de 15,8 a 106,6 metros de altura a partir do leito do mar. Mas, pelo fato de estarem localizados em um canal raso, seus topos não ficam em águas muito profundas; o pico do Actea é o mais superficial a apenas 33,5 metros de profundidade.

As erupções desses vulcões submarinos podem representar riscos às embarcações que navegam pela região e às populações próximas. Lodolo adverte que mais estudos são necessários para entender melhor os possíveis riscos que as estruturas recém-encontradas oferecem, e outros geólogos concordam que, se houver risco, provavelmente é mínimo. Mas a revelação de que seis vulcões se escondem sob uma região de alto tráfego marítimo ressalta a importância de explorar completamente o que está por baixo das ondas.

“Às vezes, quando você observa uma área relativamente desconhecida, não tem ideia do que pode encontrar”, diz Jackie Caplan-Auerbach da Universidade Western Washington, que estuda vulcões submarinos. “O oceano possui grandes mistérios ainda não desvendados”.

A peculiaridade geológica da Itália

A presença de mais seis vulcões próximo à Itália talvez não seja tão surpreendente, já que estruturas desse tipo salpicam a paisagem. A palavra “vulcão” tem suas raízes na fumegante ilha de Vulcano, ao norte da Sicília, um local onde o deus romano do fogo, Vulcano, supostamente fabricava armas.

O vulcanismo da Itália se deve ao fato de o país estar próximo a um ponto de colisão entre várias placas tectônicas — fragmentos da crosta terrestre e do manto superior envolvidos em um paralelo geológico ao “carrinho de bate-bate”. Nos locais onde as placas colidem, uma geralmente mergulha por debaixo da outra, formando o que se conhece como zona de subducção.

Mas, na Itália, a situação é especialmente complexa. O país fica onde as placas euroasiática e africana colidem, e a pequena microplaca do Adriático está aninhada entre as duas, a leste da Itália, onde discretamente gira no sentido anti-horário. A situação fica ainda mais complicada no sul da Sicília. Lá, o leito do mar está começando a se separar, formando o que se conhece por fratura, devido a uma discreta rotação no sentido horário das regiões situadas a sudeste da Sicília.

“As coisas estão bem estranhas”, diz o vulcanólogo Boris Behncke, do Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia da Itália, por mensagem direta do Twitter.

Basicamente, a superfície movediça está espremendo e puxando a região de várias maneiras, provocando o surgimento de vulcões tanto no mar quanto na costa. Embora a maior parte dos vulcões submarinos do Canal da Sicília esteja em silêncio desde o início dos registros escritos, um deles ganhou vida em 1831, formando a ilha de Ferdinandea, agora submersa, a cerca de 40 quilômetros da costa.

Pequeninas bússolas

As estruturas recém-descobertas ficam mais perto da costa do que esses vulcões submarinos anteriormente conhecidos, entre uma série de falhas orientadas para o norte e para o sul, que os pesquisadores acreditam terem sido responsáveis por conduzir o magma expelido. Em duas viagens realizadas para fins de pesquisa em agosto de 2017 e fevereiro de 2018, a equipe estudou essas estruturas nos mínimos detalhes. Primeiro, eles mapearam as diferentes superfícies encontradas, criando mapas em 3D da topografia submarina — crateras, fluxos de lava, sinais de deslizamentos e outros aspectos.

Em seguida, utilizaram análise magnética para confirmar se as estruturas eram realmente vulcões e não apenas encostas submarinas. As rochas ígneas, formadas a partir da cristalização de lava ou magma, contêm uma boa quantidade de minerais magnéticos. Conforme as rochas esfriam, os minerais magnéticos agem como pequenas agulhas de bússola, codificando a orientação do campo magnético da Terra, explica Caplan-Auerbach.

“Eles meio que se curvam para o norte magnético e então se solidificam no lugar”, diz ela.

Isso significa que uma lâmina ou monte de rocha vulcânica, onde todas essas minúsculas bússolas se alinham, teria uma forte anomalia magnética — e foi exatamente o que a equipe observou ao analisar os lóbulos.

Os cientistas também mapearam a subsuperfície rasa em perfis sísmicos de alta resolução, emitindo sons a uma frequência capaz de penetrar o leito do mar e repercutir, revelando diferentes camadas de sedimentos e rochas. Lodolo compara o sistema a tirar uma radiografia da Terra, recurso que lhes permite distinguir as delicadas estruturas abaixo da superfície.

Anatomia de um vulcão

A partir dessas análises, a equipe deduziu que cinco dos vulcões parecem ter entrado em erupção apenas uma vez por volta do Último Máximo Glacial, cerca de 20 mil anos atrás. Eles provavelmente são um tipo de vulcão conhecido como vulcão monogênico, que normalmente se forma como um conjunto de cones, e cada cone entra em erupção apenas uma vez antes de ficar inativo. Atividade recente na região geralmente significa o nascimento de um novo cone vulcânico.

“De vez em quando, surge uma área e um novo vulcão é formado”, explica Bill Chadwick, geólogo especializado em processos do leito do mar no Laboratório Ambiental Marinho do Pacífico da NOAA.

No entanto Actea pode ter entrado em erupção novamente em uma data posterior, conforme evidenciado pelo fluxo de lava de 4 quilômetros de comprimento que a equipe encontrou solidificado perto de sua encosta. Atualmente, é o maior fluxo já encontrado no noroeste do Canal da Sicília, de acordo com Lodolo, que compara o tamanho do fluxo com o de fluxos expelidos por gigantes italianos, incluindo o Vesúvio e o Monte Etna.

Actea e um de seus vizinhos vulcânicos, chamado Climene, possuem outra característica fascinante: bolhas saindo de suas crateras. Sem análise química das bolhas, no entanto, é difícil identificar sua fonte, adverte Caplan-Auerbach. É possível que elas sejam o resultado de atividade biogênica que libera gás metano, mas também podem ser causadas pela atividade hidrotérmica.

Caso essa última seja confirmada, “significa que eles não estão totalmente inativos”, diz Chadwick, embora tal atividade não seja evidência de uma erupção iminente, mas sinalize a presença de rochas quentes a grandes profundidades no interior das estruturas.

Em seguida, Lodolo e sua equipe esperam estudar o gás expelido desses sistemas para entender melhor sua origem. Eles também planejam estudar a química das rochas para entender quando ocorreram erupções anteriores e saber mais sobre a evolução desses vulcões. Afinal, uma análise mais detalhada das estruturas poderia fornecer pistas sobre o vulcanismo na Sicília e talvez em outras regiões do mundo.

“Examinar as interações entre todos esses processos significa montar mais uma peça no quebra-cabeça que é o nosso planeta”, diz Caplan-Auerbach. “E quanto mais peças conseguimos montar, mais clara fica a imagem.”

Fonte: National Geographic – Maya Wei-Haas