LIVINGSTON, GUATEMALA Jose Baudillo inclina-se sobre uma fina tora de jacarandá apoiada em uma cama de lascas de madeira vermelha, e envolve uma fita métrica em volta de uma de suas pontas. “Essa é jovem”, menos de 40 centímetros, ele diz para seu chefe, Eddy Ottoniel Palencia.
Essa tora havia sido cortada ilegalmente em Izabal, um dos 22 departamentos da Guatemala. Apreciado por sua durabilidade, coloração viva e aroma perfumado, o jacarandá, do gênero Dalbergia, é uma madeira tropical densa usada na produção de instrumentos musicais, desde violões e marimbas a violinos, além de móveis de alta qualidade, principalmente na China.
O jacarandá é tão cobiçado que é hoje o produto natural mais contrabandeado do mundo, por valor e volume, mais que o marfim, chifres de rinoceronte e escamas de pangolim somados. De acordo com o Fundo Mundial para o Meio Ambiente, uma parceria internacional entre governos, a sociedade civil e o setor privado para apoiar a conservação, o comércio ilegal de animais silvestres corresponde entre 5 e 20 bilhões de dólares por ano. Ele é muitas vezes classificado como o quarto negócio mais lucrativo do mercado negro, atrás dos narcóticos, tráfico de pessoas e o comércio de armas.
De acordo com a Interpol, o tráfico de madeira é estimado entre 30 e 100 bilhões de dólares ao ano, e é responsável por 15 a 30% do comércio mundial de madeira. Sam Lawson, diretor da Earthsight, uma organização sem fins lucrativos baseada em Londres que investiga crimes ambientais globais, estima que o valor anual do jacarandá contrabandeado possa exceder um bilhão de dólares.
Palencia e Baudillo trabalham na Fundação para o Desenvolvimento Econômico e Conservação (Fundaeco), uma organização guatemalteca sem fins lucrativos que administra 18 áreas de proteção nacionais em parceria com o governo. A tora de jacarandá que estavam medindo foi cortada em um trecho de floresta dentro de uma fazenda privada próxima à Área de Uso Múltiplo do Rio Sarstún, cujas árvores remanescentes de jacarandá se tornaram alvo de contrabandistas. Avisados pelo proprietário da terra, a equipe da Fundaeco vem conduzindo há meses um esforço de gato e rato para pegar os madeireiros ilegais em ação.
“Para cortarem uma árvore tão pequena assim”, diz Palencia, balançando a cabeça, “quer dizer que não há mais nenhuma árvore”.
A primeira vez que oficiais florestais guatemaltecos perceberam que tinham um problema com o jacarandá foi em 2011, de acordo com documentos submetidos à Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Silvestres Ameaçadas de Extinção (CITES), o órgão que regula o comércio internacional de espécies silvestres, incluindo madeira rara. Foi nesta ocasião que três containers de madeira preciosa foram descobertos no Puerto Santo Tomas de Castilla, um dos dois portos comerciais da Guatemala.
No ano seguinte, mais containers registrados como resina, materiais reciclados, papelão e outros produtos de madeira foram interceptados no mesmo porto e no Puerto Quetzal, diz César Beltetón, diretor florestal do Conselho Nacional de Áreas Protegidas (CONAP). O CONAP é uma agência governamental que administra as 338 áreas de proteção da Guatemala, que cobrem quase um terço do país.
O surgimento do comércio ilegal do jacarandá na Guatemala tem sido movido, em boa parte, pela demanda dos novos ricos chineses para a confecção de móveis tradicionais no estilo das dinastias Ming e Qing. Entre 2009 e 2014, informações alfandegárias analisadas pela Agência de Investigação Ambiental, uma organização britânica sem fins lucrativos, mostraram um aumento de 14 vezes nas importações chinesas de jacarandá de todo o mundo. Esse aumento coincidiu (e contribuiu) com a dizimação do jacarandá no sudeste asiático, que antes havia substituído o jacarandá nativo sobre explorado do sul da China. Os compradores pesquisaram novas fontes e a Guatemala, que abriga pelo menos quatro das espécies desejadas comercialmente, era uma delas.
Foi como uma “corrida do ouro”, lembra Byron Renato Morales Gallen, um dos procuradores da Divisão de Crimes Ambientais do Ministério Público, especializada no tráfico de jacarandá.
Outrora conhecida como o pulmão da América Cental, a Guatemala, um país do tamanho do estado do Tennessee, perdeu 17% de suas florestas entre 2001 e 2017, de acordo com o Global Forest Watch, um site desenvolvimento pela World Resources Institute para monitorar dados florestais. Hoje, o país apresenta a quarta maior taxa de desmatamento do mundo, com os departamentos de Petén, Alta Verapaz e Izabal, onde cresce boa parte do jacarandá extraído ilegalmente no país, sofrendo as piores perdas.
Antes mesmo de os proprietários de terra desmatarem áreas de floresta para a criação de gado e plantação de borracha, banana e óleo de palma africano, a Guatemala, diferentemente de países africanos como Madagascar e Nigéria, que também são vítimas do frenesi, não tinha abundância de jacarandá. Isso se deve ao fato de o país ter áreas limitadas de pantanais, preferidas pelas espécies locais da árvore. O jacarandá guatemalteco cresce cerca de um centímetro por ano, e pode levar até um século para chegar à maturidade, então qualquer extração ilegal compromete a população geral.
Myrna Herrera Sosa, chefe do Laboratório de Identificação e Descrição de Madeira da Universidade de San Carlos, na Cidade da Guatemala, lidera os esforços de pesquisa para estabelecer o estoque remanescente de jacarandá no país. Em um ecossistema normal e saudável, ela diz, deveria haver de 150 a 200 jacarandás em meio a milhares de árvores. Mas quando ela e sua equipe vão hoje à floresta, encontram não mais que algumas árvores amplamente espalhadas, talvez não mais que 10 em um único local. Há tão poucos jacarandás, ela diz, que “nem podem ser chamados de populações”.
Alarmados pela vulnerabilidade crescente do jacarandá, a Guatemala liderou em 2016 esforços globais para que todas as 300 espécies fossem elevadas ao Anexo II do CITES, que estabelece regulamentações mais rigorosas às exportações de jacarandá: Todas as exportações devem conter uma declaração certificando a proveniência legal e sustentável da madeira.
Quando as novas regulamentações da CITES entraram em vigor, as apreensões de jacarandá na Guatemala já haviam começado a diminuir, diz Beltetón. Mesmo as árvores se tornando mais difíceis de encontrar, os contrabandistas estavam ficando cada vez melhores em fugir da fiscalização.
Os ladrões de jacarandá
Uma vez que o jacarandá é naturalmente escasso na Guatemala, encontrá-lo e extrai-lo requer conhecimento local e trabalho intenso. Aldeões pobres com pouco a perder seguem para as florestas com suas motosserras e, às vezes, burros para limpar o caminho, encontrar e derrubar as árvores, limpar a casca e o alburno para expor a valiosa madeira, moldar as toras e arrastar as ripas para a estrada para serem levadas ao porto.
Quando os caminhões chegam, o material ilegal é muitas vezes escondido sob outros produtos para evitar ser descoberto, mas como mostram os registros policiais e os relatórios do Ministério Público, se o comprador intermediário ou a pessoa responsável pelo transporte houver subornado a polícia para garantir sua passagem pelos postos de controle, a madeira é transportada à vista.
A próxima parada será em um dos dois maiores portos da Guatemala, onde containers de jacarandá são carregados em navios com destino a Hong Kong ou China. De acordo com Beltetón, alguns jacarandás fazem viagens maiores de caminhão, seguindo para o México, El Salvador e Honduras. Na China, a madeira é vendida a partir dos armazéns dos portos na costa e no rio Yangtze para fabricantes de móveis no interior, que transformam as toras em mobiliário elegante.
A ripa de jacarandá que Palencia e Baudillo encontraram na fazenda em Izabal não foi o primeiro caso de extração ilegal na região. Em uma patrulha de rotina alguns meses antes, um guarda-florestal descobriu uma pilha de toras aguardando coleta em uma clareira entre a floresta e a estrada de acesso.
Essas descobertas indicam o aumento da extração de jacarandá em Izabal nos últimos dois anos, diz Oswaldo Calderón, diretor regional da Fundaeco. Antes, ele diz, a maioria dos jacarandás vinha de Petén ou de Belize, do outro lado da fronteira. De fato, de acordo com os dados sobre crimes ambientais do Ministério Público, 60% dos 19 casos ativos de tráfico de jacarandá de 2017 a 2018 envolveram apreensões em Izabal.
Departamentos rurais na Guatemala com os maiores incidentes de tráfico de jacarandá, Izabal, Petén e Alta Verapaz, também estão entre os mais pobres do país. Eles são devastados por conflitos entre o governo nacional e grupos indígenas quanto ao direito de permanecerem nas terras, de acordo com o Centro de Monitoramento de Deslocamento Interno, baseado em Genebra. O grupo, estabelecido pela organização sem fins lucrativos Conselho Norueguês de Refugiados, monitora o desalojamento interno em todo o mundo.
Muitas vezes, grupos sem-terra já foram remanejados repetidamente, seja pela guerra civil da Guatemala, que acabou em 1996, pela conversão de terras de fazendas de pequena escala em agronegócio e indústrias extrativistas, e pelas mudanças climáticas. Eles foram deslocados para as únicas terras ainda disponíveis, as quais muitas vezes estão inseridas em áreas protegidas que têm restrições de uso e apropriação.
Em 2017, o produto interno bruto per capita da Guatemala era de aproximadamente 4.060 dólares, um montante que é significativamente menor em áreas rurais, onde há um índice de pobreza de 79% entre a população indígena e oito em cada dez crianças sofrem de desnutrição, de acordo com a UNICEF.
Moises Cardona, líder de uma comunidade em El Carrizal, um assentamento não autorizado dentro de uma área de proteção na fronteira guatemalteca com Belize, diz que isso explica por que se envolver com o desmatamento ilegal é atrativo para algumas pessoas. Desde o auge do boom do jacarandá, El Carrizal e vilas vizinhas ganharam a reputação de serem contrabandistas de jacarandá, além de sua posição contrária ao governo da Guatemala.
Na opinião de Cardona, não é justo que o impacto ambiental do desmatamento sem a devida autorização causado pelos guatemaltecos pobres e impotentes seja considerado ilegal, mas que “todo o óleo de palma e as enormes fazendas que destroem tudo” não seja.Cardona está se referindo ao Programa do Óleo de Palma da Guatemala, lançado em 2009, que visou converter terras “não utilizadas”, muitas vezes dentro de zonas de uso múltiplo em áreas protegidas onde algumas indústrias são permitidas, em plantações de óleo de palma. Esses negócios empregam fazendeiros indígenas de subsistência como trabalhadores sazonais, e seus impactos ambientais, como escassez de água, desmatamento e degradação do solo, são bem documentados.
Beltetón da CONAP diz que “é terrível que [o jacarandá] esteja distribuído nas regiões mais pobres da Guatemala, e que seja para esses lugares que os contrabandistas se dirijam, tirando proveito da pobreza e ignorância das pessoas que não têm outra opção”. Ele adiciona: “Claro, o governo também é responsável, por não fornecer serviços públicos e fazer cumprir a lei nas regiões mais disputadas e conflituosas, como na Área de Proteção dos Montes Maias de Chiquibul, onde está localizado El Carrizal.
Na noite de 1º de julho de 2018, após uma denúncia anônima sobre o transporte ilegal de jacarandá, três agentes policiais ambientais embarcaram em uma viagem de duas horas e meia do seu posto em La Libertad, Petén, até El Barillal, um vilarejo próximo a El Carrizal.
Ao se aproximarem do destino, em vez de encontrarem o suspeito, eles foram cercados por pelo menos 45 homens, alguns armados, de acordo com o relatório policial apresentado no dia seguinte. O relatório diz que os homens impediram a passagem do veículo, os ameaçaram, questionaram o motivo da sua presença, os detiveram por mais de uma hora e dispararam suas armas, embora ninguém tenha ficado ferido. No fim, os três policiais solucionaram o impasse retornando para La Libertad de mãos vazias.
Nos nove meses desde então, a polícia ambiental não retornou a El Barillal.
Interrompendo o comércio ilegal
A maioria dos países, incluindo a China, não tem leis contra a importação de madeira de procedência ilegal e, assim, nenhuma estrutura legal que dê às autoridades portuárias permissão para recusar cargas. Mas o agravamento da posição do jacarandá pela CITES mudou isso.
No ano passado, Aura Marina López Cifuentes, procuradora pública de crimes ambientais, ordenou o retorno da China de quatro containers registrados como borracha, reciclagem e embalagens. Ela diz que sua equipe notou certas “anomalias” na documentação, incluindo que ela havia sido assinada por um contrabandista de jacarandá conhecido, e que os containers carregando os produtos eram muito mais pesados do que deveriam.
“Nós rezamos para que fosse jacarandá, e quando abrimos, era”, lembra López.
A madeira confiscada está hoje sob custódia do CONAP em um armazém aberto em Izabal, e os casos contra os contrabandistas transitam nos tribunais. O armazém, que lembra uma madeireira abandonada, abriga quase 10 mil metros cúbicos de madeira confiscada, além de tratores, caminhonetes e até uma lancha solitária, equilibrada precariamente em uma pilha de ripas de madeira. De acordo com os guardas do armazém, 70% da madeira é jacarandá.
O combate ao crime ambiental na Guatemala está dividido por diversas agências governamentais e organizações da sociedade civil. O Instituto Nacional Florestal é responsável pela gestão florestal, mas o CONAP lidera a proteção das áreas e espécies protegidas do país.
Na administração das áreas protegidas, o CONAP emprega funcionários locais, incluindo guarda-parques que realizam patrulhas regulares, fazem contato com as comunidades e buscam atividades ilegais. A agência aprova as autorizações para exportação de jacarandá, supervisiona os planos de manejo florestais em áreas de proteção e é responsável por identificar e inspecionar os produtos florestais nos portos e em operações policiais.
Mas o CONAP enfrenta uma escassez de recursos. Ele conta com menos de 400 oficiais, que devem monitorar mais de 320 milhões de hectares (quase um terço do país), e com um orçamento anual, muitas vezes sujeito a cortes, de apenas 13 milhões de dólares.
Para compensar a escassez, o CONAP depende de organizações privadas sem fins lucrativos como a Fundaeco, que emprega seus próprios guarda-parques e equipe técnica, implementa programas de desenvolvimento e é muitas vezes a primeira a identificar atividades ilegais.
Mas ver é uma coisa, estar autorizado a agir é outra. Quando os guarda-parques que trabalham para o CONAP, Fundaeco, ou outras organizações parceiras encontram evidências criminais, eles não contam com a autoridade ou recursos para agir. Como Beltetón diz: “Você consegue imaginar um guarda-parque, que mal carrega um facão usado para limpar a mata, enfrentando um traficante armado com rifles Kalashnikov? Não, nossos guarda-parques não vão para as linhas de frente.”
Os guardas passam então as informações sobre as atividades criminais para a Diprona, a divisão ambiental da polícia nacional, a qual é responsável por conduzir operações policiais.
Os oficiais da Diprona podem ser acompanhados por especialistas técnicos do CONAP ou da organização parceira para identificar a madeira e entrevistar os guarda-parques que fizeram a denúncia inicial. Se a investigação os levar a um território particularmente perigoso, o exército guatemalteco pode oferecer uma proteção adicional.
Mas aDiprona também enfrenta uma escassez de recursos, com orçamento para apenas 600 policiais em todo o país. Devido ao tempo que pode levar para mobilizar uma equipe tão dispersa, o isolamento de muitas operações ilegais de extração e a necessidade de uma ordem judicial por parte dos oficiais antes de poderem pisar em propriedade privada, é possível que os criminosos e seu contrabando já estejam longe quando as ações policiais começarem.
O envolvimento de tantas entidades pode fazer parecer que a Guatemala esteja dedicada a solucionar o problema do jacarandá, mas na verdade, um sistema tão fragmentado deixa espaço para o não cumprimento de certas responsabilidades. “Há soluções, é claro, mas primeiro o governo deve estar disposto a realmente implementá-las”, diz Myrna Herrera, do Laboratório de Madeiras. A Guatemala pode ter o CONAP, o procurador público ambiental e a Diprona, ela adiciona, mas “para começar, eles precisam de leis claras e sólidas contra a extração e comércio ilegal de madeira”. Um exemplo desse tipo de lei? Determinar um diâmetro mínimo no qual o jacarandá pode ser cortado legalmente, um padrão que já existe para outras madeiras preciosas, como o mogno, diz Herrera.
Quando apreensões são feitas e há a coleta de evidências suficientes, os supostos crimes são investigados e tratados pela Divisão de Crimes Ambientais do Ministério Público. Os casos são normalmente julgados no Tribunal de Narcotráfico e Crimes Ambientais, mas outros tribunais especializados, incluindo aqueles dedicados ao crime organizado e corrupção, também tem sua função.
Redes criminosas
O que se sabe sobre as operações criminosas de jacarandá na Guatemala deve-se em grande parte aos esforços do gabinete de crimes ambientais da procuradora pública Aura López. Ela diz que eles identificaram quatro redes diferentes de tráfico de jacarandá, ou estruturas, como são chamadas por ela e seus colegas. “Não queríamos chamá-los de ‘grupos’ criminosos porque isso não reflete a realidade do nível de envolvimento dos oficiais do governo”, ela diz.
Essas redes criminosas são altamente sofisticadas e se assemelham às operações de tráfico de drogas. Como Palencia, da Fundaeco, observa: “A principal diferença entre o tráfico de drogas e o tráfico de árvores é que eles sempre podem produzir mais drogas”.
Após anos de investigações, quase todos os líderes e membros de uma das redes criminosas foram identificados e acusados, diz López. Apenas um único indivíduo continua foragido, que ela suspeita ter fugido do país. Ela diz que sua equipe está agora se aproximando de outra das quatro redes. Enquanto isso, 68 casos complementares, cada um envolvendo uma apreensão específica de jacarandá, permanecem sob investigação ou acusação.
O procurador Morales Gallen complementa que 50 indivíduos já foram julgados e que as ações contra cinco oficiais do governo, incluindo um fiscal alfandegário, um membro da força policial e um oficial sênior de segurança do CONAP, tiveram início em abril.
Mas mesmo com a melhoria da Divisão de Crimes Ambientais em sabotar os traficantes, os próprios criminosos também evoluíram. “Eles são muito mais cuidadosos com suas identidades” diz Morales Gallen. Eles “fazem tudo com nomes e informações falsas”, além de chips SIM pré-pagos.
A Lei para Áreas de Proteção da Guatemala estabelece a condenação obrigatória por crimes contra o patrimônio natural e cultural, muitas vezes usados para acusar madeireiros ilegais, e contra o tráfico de flora e fauna. As penas variam de cinco a dez anos de prisão, podendo ser reduzidas a multas que variam de 1,3 mil a 2,6 mil dólares. Os juízes possuem o arbítrio de ajustar as multas conforme as condições financeiras da parte culpada.
Essas multas não são “nada para aqueles que traficam” enfatiza Morales Gallen. Das 19 apreensões de jacarandá julgadas entre 2017 e 2018, mais da metade foi avaliada em mais de 50 mil dólares, e a maior em 125 mil dólares.
Os juízes também têm o poder discricionário de ordenar reparações conforme os danos ambientais, como a plantação de 500 árvores em área protegida, por exemplo, ou em um caso de dezembro de 2017, a doação de um ar-condicionado para o poder judiciário do escritório local do CONAP. Quando questionado sobre a sentença, o juiz explicou que “faz calor em Petén, e o CONAP precisa de um ar-condicionado. Como podem trabalhar sem ele?”
Poucos contrabandistas julgados são presos. Para os combatentes nas linhas de frente, essa impunidade aparente é frustrante. “É mais caro para nós participarmos das operações do que para eles [evitarem] a prisão”, diz Jorge Diaz, da filial de Izabal da Fundaeco.
Ao mesmo tempo, conservacionistas e autoridades compreendem as circunstâncias extremas que levam os aldeãos a roubarem o jacarandá das florestas. Como disse Oswaldo Calderon, diretor regional da Fundaeco: “As áreas de proteção nunca serão protegidas e sustentáveis enquanto as pessoas estiverem morrendo de fome dentro delas”.
Morales Gallen diz que as punições leves transmitem uma mensagem, que crimes como a extração ilegal de jacarandá são considerados inconsequentes. “Há uma falta de conscientização em relação aos crimes ambientais. A Guatemala é um país muito violento, com roubos, sequestros e homicídios, então os crimes ambientais não parecem muito importantes. Se tivermos um caso sobre sequestro e um caso ambiental, acredite em mim, eles darão prioridade ao sequestro”.
López diz que o objetivo não é ser brando com os crimes contra o jacarandá, mas coletar informações com os contrabandistas locais que possam levar as autoridades aos chefes do tráfico. Ela diz que quando os líderes dos grupos de tráfico são capturados, eles também são acusados de outros crimes, como falsificação de documentos, suborno de oficiais do governo e corrupção, que contam com penas mais severas, incluindo tempo de prisão.
O fato da Guatemala estar fazendo o possível para combater o tráfico de jacarandá é notável, diz Romain Taravella, especialista florestal da Environmental Investigation Agency. “Aplicar a lei no mundo do jacarandá é mais exceção do que regra” ele diz.
Enquanto a Guatemala luta internamente com a preservação do jacarandá, surge uma ameaça externa. Na reunião da CITES este mês em Genebra, os 183 signatários do tratado considerarão uma retificação que isentaria instrumentos musicais e suas partes componentes que contenham jacarandá, além de produtos finais de jacarandá que pesem menos de 500 gramas, das restrições comerciais.
A isenção aos instrumentos musicais foi resultado da pressão de empresas de instrumentos americanas e europeias, que argumentam que sofreram os “danos colaterais” das restrições à “indústria moveleira”, como disse a britânica Music Industries Association, mas a mudança poderia aumentar a demanda pela preciosa madeira. Espera-se que a emenda passe, e se passar, diz Beltetón, o fardo de garantir a origem sustentável do jacarandá cairá sobre os ombros dos fabricantes de instrumentos fora da Guatemala.
Enquanto isso, o roubo de jacarandá na Guatemala continuará até que leis nacionais mais robustas sejam aprovadas e sua execução e penas sejam intensificadas. Ou até acabarem as árvores.
Fonte: Eileen Guo National Geographic