O governo federal quer aprovar um marco regulatório com regras para controlar as organizações não governamentais (ONGs) na região da Amazônia e permitir a atuação somente daquelas que atenderem aos “interesses nacionais”.
A informação foi publicada nesta segunda-feira (9) pelo jornal “O Estado de S.Paulo”. O jornal obteve documentos do Conselho da Amazônia no qual estão listadas metas do órgão. Uma delas é a aprovação do marco legal das ONGs. A TV Globo também teve acesso aos documentos.
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O Conselho da Amazônia é presidido pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão. O órgão foi criado para comandar as ações do governo em relação à preservação da floresta e para dar uma resposta à comunidade internacional, que cobra do Brasil ações efetivas contra o desmatamento.
Os documentos revelados por “O Estado de S.Paulo” foram enviados pela Vice-Presidência da República para diversos ministros do governo, com o objetivo de informar sobre a programação do conselho.
Um dos trechos apresenta o objetivo de criar o marco regulatório das ONGs e depois justifica a medida:
“Obter o controle de 100% das ONGs que atuam na região amazônica, até 2022, a fim de autorizar somente aquelas que atendam aos interesses nacionais”, diz um dos trechos dos documentos.
Os documentos obtidos por “O Estado de S.Paulo” mostram que o marco regulatório das ONGs seria discutido na reunião do Conselho realizada na segunda-feira da semana passada.
De acordo com o jornal, o projeto do marco regulatório ainda não está pronto. A elaboração da minuta ficará a cargo dos ministérios da Justiça, do Meio Ambiente e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Em nota, a ONG Greenpeace disse que a ideia do governo de controlar a ação das organizações da sociedade civil é “bastante grave” e demonstra falta de compromisso com “preceitos básicos de democracia e participação social”.
“Lamentavelmente, mais uma vez, estamos diante de indícios de que o governo Bolsonaro não compactua com preceitos básicos de democracia e participação social. Constar em um planejamento estratégico do Conselho Nacional da Amazônia Legal a proposta de se criar um ‘marco regulatório das ONGS’, para ‘obter o controle de 100% das ONGs’ que atuam na região e, a partir de 2022, só autorizar aquelas que atendam a ‘interesses nacionais’, é bastante grave”, afirmou Luiza Lima, porta-voz de Políticas Públicas do Greenpeace.
“Governar um país democrático é defender a participação da sociedade civil organizada nas decisões que impactam a população. Um governo que preza pela democracia acolhe a voz que vem das ruas, encoraja uma participação popular vibrante e defende a pluralidade e diversidade de ideias”, completou Lima.
Mourão nega controle de ONGs
No início da manhã desta segunda, ao chegar para o trabalho no Palácio do Planalto, Mourão foi questionado por jornalistas sobre a reportagem de “O Estado de S.Paulo”. O vice-presidente respondeu que o documento sobre o marco regulatório das ONGs não passou por ele.
“Eu também não sei por que, eu não assinei esse documento, não vi. Preciso esclarecer. Não passou por mim isso aí”, afirmou Mourão.
“Olha, eu li essa matéria hoje pela manhã. Vou ver o que que é esse assunto, porque não é dessa forma que a coisa está colocada. Eu vou esclarecer essa situação”, completou.
À tarde, em entrevista à rádio Band News FM, Mourão disse que houve uma “interpretação errada” dos documentos obtidos pelo jornal e que não há estudo para criar um marco regulatório para as organizações não governamentais.
“Teve uma interpretação errada a respeito dessa questão de marco para organizações não governamentais. Não é isso que está colocado. Nós estamos realizando um planejamento em conjunto com todos os ministérios […] para que a gente possa divulgar aquilo que nós vamos conseguir realizar nos próximos dois anos ainda neste mandato do presidente Bolsonaro”, afirmou.
“Essa questão de marco regulatório das ONGs não passa por nenhum estudo mais sério nesse momento”, complementou.
O vice-presidente não explicou qual a finalidade dos estudos contidos nos documentos revelados pelo jornal nem se a temática continuará a ser debatida no Conselho Nacional da Amazônia Legal.
Ataques a ONGs
Ao longo de seu governo, o presidente Jair Bolsonaro tem feito ataques às ONGs que atuam na Amazônia. Em 2019, ele chegou a culpá-las pelas intensas queimadas que levaram às maiores devastações da floresta nos últimos anos e à reação da comunidade internacional contra as políticas de preservação ambiental do governo brasileiro.
Em setembro de 2020, em uma cúpula sobre biodiversidade da Organização das Nações Unidas (ONU), o presidente disse, sem apresentar provas, que organizações, em parceria com “algumas ONGs”, comandam “crimes ambientais” no Brasil e também no exterior.
Fonte: G1