O plantio direto de um “mix” de sementes nativas, como jatobá, tamboril, baru e sumaúma, pode restaurar trechos degradados e salvar um ecossistema como a Amazônia. Somado a isso, o método gera renda às comunidades locais e serve de opção ao produtor rural que desmatou mais do que a lei permite, e precisa repor parte da vegetação dentro da propriedade.
Em alusão ao Dia Internacional das Florestas, celebrado neste domingo (21), a Rede Amazônica detalha sobre a chamada “muvuca de sementes”, técnica que permite restaurar áreas degradadas e torná-las muito parecidas com o que eram antes de serem devastadas.
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“Deveríamos conservar muito mais, ter muito mais unidades de conservação para manter os ecossistemas originais, nativos e saudáveis e fazendo a função deles, que é produzir água, conservar solo, conservar a biodiversidade. No entanto, essa não foi a realidade do país. Hoje, a restauração é a regra. A muvuca de sementes vem para dar escala à restauração. Não exclui o pequeno produtor, médio, grande. É passiva de ser executada por todos os produtores”, explicou o engenheiro florestal Paolo Sartorelli, que executa o método há 10 anos.
O método
A muvuca combina adubação verde, sementes nativas e areia, resultando em uma mistura que vai desenhar a estrutura da floresta. Diferente dos outros métodos de reparo, é mais barata, pode ser feita com maquinários agrícolas distintos ou manualmente. Além disso, a manutenção e o tempo gastos são menores.
A quantidade de grãos precisa ser grande. Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), que faz restauração através desse tipo de semeadura, uma muvuca compõe pelo menos 90 quilos de sementes de até 120 espécies para cada hectare que será recuperado.
O primeiro passo para se recuperar uma área degradada com o coquetel de sementes é o diagnóstico ambiental. É a partir desse trabalho que se saberá, então, o tipo de bioma e quais espécies aquela região afetada carece para ser restaurada.
“Esse planejamento vai desde o diagnóstico da área que a gente vai saber se é bioma amazônico, é bioma cerrado. Qual a fitofisionomia que está a área e, com isso, a gente define as espécies para que a área chegue mais próxima da mata nativa”, complementou Lara Costa, técnica em restauração ecológica do ISA.
Paolo Sartorelli ressalta ainda que o ideal é usar espécies nativas regionais ou da vegetação original do local que será restaurado, o que reforça a importância do diagnóstico ambiental antes de tudo.
“Você vai estudar a sua área de restauração. Quando você for restaurar uma reserva legal, o Código Florestal Brasileiro permite que você use 50% das espécies exóticas. Então, se pegar o pau-brasil e plantar na Amazônia, que é nativo da Mata Atlântica, mas para restaurar uma reserva legal no bioma, isso é permitido. No entanto, quando estamos falando de um ecossistema que é uma nascente, mata ciliar, da beira do rio, não podemos fazer isso”, explicou o engenheiro florestal.
Muvuca na prática
Depois de feito o diagnóstico ambiental, a empresa ou pessoa interessada na recomposição de parte de um bioma específico faz contato com um fornecedor de sementes. A demanda, então, é repassada aos coletores que buscam dentro das florestas as espécies necessárias para fazer a muvuca.
Formada por comunidades indígenas, agricultores familiares, viveiristas e pessoas que moram em municípios do Mato Grosso, a Rede de Sementes do Xingu é uma dessas pontes que ligam empresas e organizações aos coletores. O Instituto Socioambiental, por exemplo, é um dos parceiros da associação.
Durante o ano, a Rede faz uma prospecção de clientes e de pessoas que desejam restaurar áreas. Na sequência, encomenda as sementes com os mais de 500 coletores associados.
“Com a muvuca, a gente tem percebido que conseguimos gerar renda junto com a comunidade local e, ao mesmo tempo, conservar a floresta. A muvuca tem esse ganho social que você consegue envolver todas as comunidades em uma questão nobre, que é a restauração da floresta amazônica”, declarou João Carlos.
No Acre, a comunidade indígena dos Ashaninkas, que fica dentro da reserva do Alto Juruá, também faz uso do método de semeadura para manter a área protegida e em boas condições de preservação e uso. Para o povo, cada região pode ser trabalhada de forma diferente, desde que a premissa permaneça sendo a conservação da floresta.
“As roças, a parte agrícola, a gente tem uma técnica para fazer. Recuperação de pastos, temos outras. Trabalhamos em um primeiro momento com algumas espécies, depois outras. Semeamos as sementes no espaço e elas se encarregam de fazer o seu equilíbrio”, reforçou Francisco Pianco, liderança do povo Ashaninka.
O método, de fato, impulsiona a aceleração do processo de reflorestamento que a natureza depois se encarrega de fazer, segundo Lucimar Souza, diretora adjunta de desenvolvimento territorial do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Mas, para ela, a conservação da Amazônia depende da fusão de esforços da sociedade civil e dos governos federal e estaduais.
“Com uma área tão grande como essa a ser recuperada, é necessário um esforço conjunto de atores ligados às questões ambientais e produtivas. Temos o hábito de pensar que a recuperação de áreas degradadas é uma questão pertinente somente para a área ambiental e, na verdade, não é. Também perpassa pelo grupo de organizações ligadas à produção da Amazônia”, disse Lucimar.
Fonte: G1