O clima de Marte pode ter passado por diversas eras de gelo, enfrentando alterações massivas causadas por “super erupções” ocorridas durante um intervalo de tempo de 500 milhões de anos ocorrido há 4 bilhões de anos, segundo um novo estudo publicado pela agência espacial americana Nasa.
Segundo a agência, a região do planeta vermelho conhecida como “Arabia Terra”, na região norte, tem evidências de que as tais “super erupções” – o pior tipo que existe, com Índice de Explosividade Vulcânica acima de 8 – expeliram vapor de água, dióxido de carbono (CO2) e dióxido sulfúrico (SO2) no ar, além das explosões em si terem alterado permanentemente a topologia do terreno de Marte. As conclusões foram publicadas no jornal Geophysical Research Letters em julho de 2021.
“Cada uma dessas super erupções pode ter trazido um impacto climático significativo — talvez o gás liberado tenha deixado a atmosfera mais grossa ou bloqueado o Sol, tornando-a mais fria”, disse Patrick Whelley, um geólogo a serviço da Nasa no Centro de Voo Goddard, em Maryland. “Os pesquisadores do clima de Marte terão trabalho para entender o impacto desses vulcões”.
Segundo o que a Nasa divulgou, imagine 400 milhões de piscinas olímpicas, mas troque a água por rocha derretida e gás. Tudo isso se espalhou pela região de Arabia Terra, liberando cinzas e lava por “milhares de quilômetros” ao redor do ponto da explosão. Para fins comparativos, super erupções na Terra não passam de dezenas de quilômetros.
O interessante é que, antes do estudo, o consenso científico era o de que as depressões da região haviam sido causadas por impactos de asteroides contra a superfície. Entretanto, a nova pesquisa mostra que a área foi literalmente escavada pelo material despejado pelos vulcões.
De acordo com Whelley, a ideia veio após ele se encontrar com a vulcanóloga Alexandra Matiella Novak, da Universidade John Hopkins, que já vinha estudando o tema para outras áreas de Marte, procurando pela presença de cinzas vulcânicas por meio de imagens do Orbitador de Reconhecimento da Nasa. Ambos usaram referências de estudos anteriores, que sugeriam que a região de Arabia Terra estivesse situada em uma área sitiada por caldeiras.
A partir daí, eles traçaram estimativas de onde as cinzas teriam pousado caso uma super explosão ocorresse, determinando que elas teriam acompanhado o vento, na direção leste: “então seguimos desse ponto e dissemos ‘Ok, esses minerais estão associados com cinzas vulcânicas adulteradas, o que já havia sido documentado, então agora vamos olhar para como os minerais são distribuídos para saber se eles seguem o padrão que esperamos de super erupções”, disse Novak.
Avaliando imagens do espectrômetro do orbitador, o time identificou minerais como montmorillonita, imogolite e alofane – todos, normalmente comuns em áreas onde restos vulcânicos viram argila ao se encontrarem com água. Entretanto, ao invés de estarem misturadas pelas atividades de ventos e água, as cinzas estavam dispostas da mesma forma que estariam se a explosão ocorresse há meros dias.
“Foi aí que eu percebi que isso não era um erro, mas um sinal real”, disse Jacob Richardson, geólogo da Nasa que trabalhou no estudo junto de Whelley e Novak. “Estamos, de fato, vendo o que esperávamos e aquele foi o momento mais empolgante pra mim”. Ele ainda afirmou que a pesquisa também foi capaz de determinar o número de explosões necessárias para produzir tanto material.
A única dúvida não respondida no paper é: como a região de Arabia Terra apresenta vários exemplares do mesmo tipo de supervulcão? Outras áreas de Marte – e até mesmo congêneres menores na Terra – geralmente apresentam diversas naturezas. O maior vulcão do planeta vermelho, Olympus Mons, é do tipo “escudo”, ou seja, ele drena a lava que desce por suas encostas, sem explodir.
Arabia Terra, porém, só tem vulcões explosivos.
Uma tese é a de que as movimentações geológicas de Marte não tenham sido suficientes para separar esses indivíduos super explosivos, como cientistas afirmar que pode ter acontecido na Terra. Hoje, o nosso maior super vulcão é o Mauna Loa, no Havaí. Mas há quem afirme que, em tempos antigos, ele não estava sozinho, e seus irmãos foram quebrados em versões menores ou se erodiram por completo com o afastamento continental promovido pelas nossas falhas geológicas.
Para sabermos isso com exatidão, porém, mais pesquisas serão necessárias: “as pessoas vão olhar para o nosso paper e dizer ‘Como Marte consegue fazer isso? Como um ‘planetinha’ derreter tanta rocha para alimentar a energia de milhares de super erupções em um só lugar?’”, disse Richardson. “Eu espero que esses questionamentos incentivem a condução de muitos estudos”.
Fonte: Olhar Digital