Rússia é uma das principais produtoras globais de fertilizantes, cuja carência resulta em safras reduzidas e preços altos. Brasil está entre países alarmados com consequências de sanções geradas pela invasão da Ucrânia.
Há séculos a família Conzen mantém plantações na província de Heinsberg, no extremo oeste da Alemanha, próximo à fronteira com a Holanda. Atualmente Bernhard Conzen cultiva cereais, beterraba-sacarina e milho para vender a cooperativas.
Mas os negócios da família estão sendo sufocados pela explosão dos preços dos fertilizantes: “Os efeitos são fatais, os custos de produção cresceram exponencialmente”, comenta à DW o também presidente da Associação Agrária da Renânia. “A recuperação de custos é questionável e temos grandes lacunas de liquidez.”
A demanda forte e a alta dos custos de produção impulsionaram o preço dos adubos já em 2021, gerando apreensões de segurança alimentar e inflacionando as matérias-primas agrárias. Analistas estimavam que a pressão se aliviaria no ano corrente, mas a arbitrária invasão da Ucrânia pela Rússia veio como outro fator encarecedor.
Como uma das principais forças no setor, a Rússia responde por 15% do comércio global de fertilizantes e 17% das exportações totais de potassa, segundo o Instituto Internacional de Pesquisa de Política Alimentar (IFPRI, na sigla em inglês). Além disso, fornece 20% do gás natural, componente-chave na produção de fertilizantes.
Diversos países da Europa e Ásia Central dependem da Rússia para mais de 50% de seu consumo do produto. O setor agrário da Alemanha obtém do país 30% de seus suprimentos, um volume que os produtores nacionais não estão aptos a fornecer, no curto ou médio prazo, alertam organizações locais.
“No momento, os preços para recursos operacionais como adubos, diesel e rações estão batendo recordes”, afirma Johann Meierhöfer, porta-voz da Associação de Agricultores Alemães (DBV). “Embora os preços do produtor tenham subido marcadamente, ao mesmo tempo, o alto custo desses recursos não só significa maior necessidade de liquidez para os fazendeiros, como também aumento dos riscos, pois eles sempre dependem da meteorologia.”
Apelos para suspensão de sanções à Rússia
Os agricultores contam que os altos custos operacionais provocarão gargalos de fornecimento e produção reduzida. A alta da energia e da logística também se reflete no preço dos alimentos para o consumidor, que sobe continuamente.
“Uma parcela dessa alta também será repassada para o consumidor final”, confirma Meierhöfer. “Devemos manter em mente que a produção agrária primária tem operado com margens de lucro muito pequenas, portanto não há muita flexibilidade aqui.”
Assim como Conzen, muitos fazendeiros alemães já têm assegurados seus estoques de fertilizantes para o atual período de cultivo. Porém a dependência do abastecimento por terceiros países gera dúvidas quanto às futuras safras. A Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) calcula que o preço de referência global dos fertilizantes subirá 13% até 2023, resultando numa redução das safras e lucros em 2022 e 2023.
Meierhöfer propõe que as autoridades alemãs ajudem os agricultores reduzindo a carga tributária sobre o diesel e pressionando os tomadores de decisões da União Europeia a suspenderem temporariamente as barreiras alfandegárias sobre a importação de adubos.
“Garantir um suprimento de fertilizantes no longo prazo também é importante. De outro modo, devemos contar com uma considerável redução das safras nos próximos anos” adverte o porta-voz da DBV.
Brasil “reza” pelo fim da invasão da Ucrânia
A invasão da Ucrânia e as sanções contra a Rússia preocupam igualmente o setor agrário brasileiro, que importa 85% das matérias-primas usadas na produção de fertilizantes, em parte da Rússia e de Belarus.
Potência mundial no setor, os agronegócios de exportação do Brasil chegaram a 120,6 bilhões de dólares em 2021, 20% a mais do que no ano anterior. Contudo, os custos operacionais e a necessidade de encontrar fornecedores alternativos para garantir as próximas safras são um novo desafio.
“Só a soja, milho e cana-de-açúcar representam 73% do consumo de fertilizantes do Brasil”, explica à DW Eduardo Daher, diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG).
Com estoques de adubos suficientes para cobrir os próximos quatro meses, na busca por novas fontes a ministra da Agricultura, Tereza Dias, recorreu ao Canadá e ao Oriente Médio. Em meados de março, ela também liderou uma proposta, apoiada pelo Mercosul e apresentada à FAO, para que os fertilizantes sejam excluídos das sanções contra a Rússia, por motivos de segurança alimentar.
“O agronegócio do mundo inteiro está com um problema enorme. Todo mundo está tentando encontrar diferentes fornecedores de adubos”, comenta Daher. “No setor, estamos rezando para que a guerra acabe logo e por uma boa temporada de verão, com a quantidade certa de chuva. Porque a inflação vai ser um problema-chave.”
Fonte: Deutsche Welle