Como as universidades e institutos de pesquisa podem superar as enormes limitações impostas pela escassez de recursos para atender às inúmeras demandas de um setor tão carente de soluções tecnológicas? Essa pergunta permeou o debate “Os Novos Caminhos da Pesquisa na Aquicultura”, um dos temas abordados no penúltimo dia do Congresso Brasileiro de Aquicultura e Biologia Aquática (AquaCiência 2018), em Natal-RN. O evento, que começou na última segunda-feira, chega ao seu fim amanhã após reunir durante cinco dias alguns dos maiores cientistas do país e representantes do setor.
“Vivemos o desafio de superar a pulverização de recursos financeiros para a pesquisa e o distanciamento do que se produz na academia com o que o setor produtivo espera em novas tecnologias e inovações para impulsionar a aquicultura brasileira”, atesta a professora da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Maria Celia Portella.
Segundo ela, o retorno econômico do investimento em pesquisa é alto. Dados dos EUA apontam que na agricultura, a média é de 44%; na aquicultura, 37% do valor aplicado. Na Europa, a professora conta, houve uma parceria de empresas e governo para incrementar a pesquisa aquícola. “Com o objetivo de promover o desenvolvimento na área, representantes da indústria da aquicultura reuniram-se para identificar lacunas e necessidades de conhecimento, tecnologia, processos e políticas para o setor”, afirma. A inovação foi reconhecida como a dimensão-chave e o foco da Plataforma Europeia de Tecnologia e Inovação na Aquicultura, EATiP. Com isso, foram elencadas sete áreas temáticas de atuação da plataforma, tais como segurança do consumidor; tecnologia; manejos dos ciclos biológicos de vida; produção de dietas sustentáveis; integração com o meio ambiente; saúde dos animais aquáticos; socioeconomia, administração e governança. São membros da plataforma empresas, instituições, universidades, associações, federações, organizações e observadores com um interesse no desenvolvimento sustentável da aquicultura europeia.
Patentes demoram dez anos: Voltando para a realidade brasileira, os desafios são enormes. Na área de propriedade intelectual, por exemplo, o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) pode levar até dez anos para concluir o pedido de patente. “A disparidade é gigantesca. Enquanto temos 300 examinadores de patentes, a China possui 11 mil, a Europa e os Estados Unidos têm 8 mil cada. Isso é um grande entrave para agilizarmos os processos no Brasil”, calcula Alexandre Guimarães Vasconcelos, do INPI, também presente no congresso.
Para Eric Routledge, chefe de P&D da Embrapa Pesca e Aquicultura, a saída passa pelo fortalecimento e organização do setor produtivo, para que a pesquisa consiga mais financiamento. “A demanda por recursos é enorme e a pesquisa ainda precisa atuar antes que o problema aconteça. É o caso das mudanças climáticas, por exemplo. Será que nossos sistemas de produção estão preparados para as grandes alterações do clima que estão previstas? E a tilápia, será que ela vai resistir a um aumento de seis graus da água?”, questiona ele.
Routledge destaca que alterações do ecossistema já estão provocando deslocamentos humanos que podem gerar novos desequilíbrios. É o caso do polo do Castanhão, no Ceará, que produzia milhares de toneladas de tilápia e um dia secou, provocando a dispersão dos produtores para novas regiões, aumentando a demanda de oxigênio de outros reservatórios para a criação de tilápia. “Vamos ter que aprender a produzir com menos água, assim como descobrir como lidar com futuras doenças e possíveis dificuldades de reprodução advindas do aumento da temperatura”, sentencia.
Além dos desafios ligados técnicos, a pesquisa, segundo o chefe de P&D, ainda tem a missão de municiar os responsáveis pela elaboração de políticas públicas. “O que estamos fazendo para subsidiar as políticas de licenciamento ambiental, que é outro grande gargalo do setor? Acho que os órgãos ambientais também poderiam contribuir, colocando-se um pouco no lugar do produtor para eles serem mais propositivos “, diz.
Por fim o chefe de P&D destacou a importância de haver uma maior integração entre os pesquisadores e a importância dos professores na formação desses futuros profissionais que precisam trabalhar em equipe. Para ele, a união de forças e o equilíbrio na definição de prioridades é o caminho para a superação de tantos desafios que a aquicultura apresenta.
Fonte: Embrapa