EXCLUSIVO: Opções de consumo estão diretamente ligadas à influência dos meios de Comunicação

Mônica Pinto / AmbienteBrasil

Em maio passado, o jornalista Pedro J. Silva lançou, no mercado municipal de Curitiba (PR), o livro Um passeio pelas gôndolas: escolhas e influências dos consumidores de alimentos nos supermercados.

O trabalho, patrocinado pela Editora Imprensa Oficial, surgiu inicialmente em função de seu Mestrado em Sociologia na Universidade Federal do Paraná. A pesquisa foi realizada com 600 consumidores de alimentos nos supermercados, que ofereciam três tipos de alimentos: orgânicos (ou ecológicos), transgênicos e convencionais (produzidos com fertilizantes químicos).

Os entrevistados podiam responder assinalando mais de uma opção. Compiladas as informações obtidas, 83,7% disseram que compram alimento convencional; 41,3% que compram transgênicos e 35%, orgânicos – percentual considerado “muito elevado” pelo orientador de Pedro, o professor Alfio Brandenburg, e pela banca examinadora.

Com relação à renda e escolaridade dos consumidores de alimentos orgânicos, 45,6% dos entrevistados têm renda acima de quatro salários mínimos e 58,5% possuem curso de pós-graduação.

A pesquisa teria um interesse quase que puramente mercadológico se o jornalista, no livro, não fizesse também uma correlação entre estas escolhas do consumidor e a influência dos meios de Comunicação. E se não tivesse ele chegado a uma conclusão no mínimo preocupante: “o cenário midiático brasileiro é muito comprometido com os interesses de mercado”, disse Pedro a AmbienteBrasil.

Segundo ele, isso se verifica pela controvérsia dos especialistas que são fontes nos noticiários. “De acordo com muitas matérias veiculadas e analisadas, principalmente aquelas relacionadas à transgenia, observamos que boa parte dos jornalistas não aprofunda de forma crítica a temática, e muitos deles mantêm a ideologia dos interesses das multinacionais pró-transgênicos”, completa.

Professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UMESP e de Jornalismo da ECA/USP, o professor Wilson da Costa Bueno corrobora essa tese, na qualidade de um dos mais ferrenhos críticos ao que ele chama de “Jornalismo Ambiental Light”.

“Os meios de comunicação, cada vez menos investigativos, têm sido sistematicamente pautados pelas fontes empresariais ou políticas, competentemente assessoradas por agências de comunicação. Desta forma, tornam-se reféns dos grandes interesses, sejam eles comerciais ou políticos”, diz ele, avaliando que isso não se verifica apenas em relação aos transgênicos, mas se estende por uma “gama extensa de assuntos ou pautas”.

“A mídia festejou com estardalhaço a liberação das usinas no Rio Madeira, agindo como se fosse parte interessada, tem freqüentemente demonizado as ONGs e faz, equivocadamente, a apologia do consumo não consciente, colocando-se ao lado de fabricantes de celulares, das empresas de fast food, da indústria tabagista, agroquímica e de papel/celulose”, ilustra o professor, que edita quatro sites temáticos e quatro revistas digitais em Comunicação e, recentemente, tornou-se presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico – ABJC.

Em sua avaliação, parte da imprensa peca ao chamar agrotóxicos de “defensivos agrícolas” e ao confundir plantação de eucaliptos com floresta – segundo ele, repetindo o discurso das corporações nacionais e multinacionais.

“A mídia cobra responsabilidade social dos governos e das empresas, mas não faz a sua parte. Age como o macaco que pisa no próprio rabo. Só que a sociedade é que tem sentido a dor da pisada”, diz Wilson Bueno.

A jornalista Lílian Dreyer, ex-presidente da Cooperativa Ecológica Coolméia (RS) e autora da biografia do ecologista José Lutzenberger, “Sinfonia Inacabada”, lançada em outubro de 2004, lembra que o consumidor não tem dúvidas de que sua felicidade, conforme constantemente lhe reafirma a publicidade, é um bem disponível no mercado.

“Se boa parte dos jornalistas não quer ou não consegue trazer a público visões mais aprofundadas e críticas das escolhas que a sociedade está fazendo, talvez seja porque eles próprios ainda não estejam conseguindo um distanciamento crítico em relação a esse modelo que hoje domina a sociedade”, pondera.

O jornalista Luciano Correia, mestrando em Ciências da Comunicação pela Unisinos (RS) e autor do livro “Jornalismo e Espetáculo”, diz que a mídia é regida só pelo critério econômico e, para cumprir suas metas comerciais, precisa incorporar cada vez mais os contingentes de potenciais consumidores.

“Esses contingentes são uma massa emergente, que é integrada na sociedade de consumo, mas não como cidadãos e, sim, como consumidores”, afirma. “A tendência ao espetáculo é um processo autofágico, porque nessa briga por audiência os atores midiáticos agem sem critérios e utilizam quaisquer recursos, geralmente imperando o inusitado e o grotesco”.

Segundo ele, a concorrência entre as mídias, a briga por audiência e recursos da publicidade promove uma massificação niveladora por baixo, mediocrizando progressivamente os conteúdos.

Isso talvez explique porque, até pouco tempo, a cobertura ambiental brasileira se limitava quase que exclusivamente às pautas enfocando acidentes – vazamentos de óleo etc. E nada de educar minimamente a população.