Apesar da compreensão unânime quanto à necessidade de investimentos mundiais em energias limpas, como estratégia de combate ao aquecimento global, não há qualquer perspectiva de que os combustíveis fósseis deixem de ser a matriz energética primordial ao menos pelos próximos trinta anos.
Com base nessa realidade, 21 países em todos os continentes, mais a União Européia, se uniram no CSLF, sigla de Carbon Sequestration Leadership Forum, para pesquisar uma tecnologia que, acreditam eles, é altamente promissora no sentido de reduzir emissões de CO2 – o seqüestro e posterior armazenamento geológico de carbono (CCS, em Inglês: Carbon Capture and Storage).
O grupo, representado pelos maiores especialistas de cada nação membro, se reúne esporadicamente para debater todos os desafios envolvidos na proposta, em busca de caminhos que possam, se não resolvê-los de maneira definitiva, ao menos aumentar a relação custo/benefício dos investimentos em CCS.
O Brasil integra este bloco – é um dos sete países emergentes, junto com China, Índia, México, Colômbia, África do Sul e Arábia Saudita.
Na condução desses estudos, as empresas petrolíferas figuram com destaque por razões claras. Elas têm vasta experiência na separação do CO2 nas refinarias. Sob condições favoráveis, injetam o gás em campos maduros de petróleo para, por intermédio dessa pressão, aumentar o potencial de extração neles, a partir de uma técnica conhecida como Enhanced Oil Recovery (EOR). Em termos mais simples, a empresa consegue extrair de cada manancial no máximo 40% de petróleo. Ao usar a injeção de CO2 para pressionar o remanescente, pode aumentar em até mais 30% a produção daquele poço.
Mas, afinal, em que consiste a tecnologia? Resumidamente, em separar o CO2 emitido em alguns processos industriais – a captura – e depois injetá-lo em reservatórios cujas conformações naturais, geológicas, sejam propensas a seu correto (e definitivo) armazenamento.
Os países do Fórum estão, na verdade, se inspirando nos depósitos naturais de CO2, de onde são extraídos, por exemplo, os gases utilizados nos refrigerantes e na água mineral. Entre os reservatórios candidatos ao CCS, os prioritários são minas de carvão, aqüíferos salinos profundos (a água é imprópria para o consumo humano) e os depósitos depletados, ou seja, onde não há mais produção de petróleo e gás.
Os custos envolvidos ainda são grandes, mas, para os membros do CSLF, compensam. “O CCS será um mecanismo chave na redução da emissão de gases”, diz Jorge Camargo, presidente da StatoilHydro no Brasil. Ele foi um dos conferencistas no workshop do CSLF, realizado na quinta e sexta-feira passadas, em Porto Alegre (RS).
A Petrobras vai começar no ano que vem a fazer a injeção de CO2, com a finalidade de seqüestro de carbono, em quatro bacias – Recôncavo, Potiguar, Campos e Paraná. “O Brasil não tem obrigação de reduzir suas emissões, mas o país é extremamente comprometido com a mitigação das mudanças climáticas”, disse no evento Paulo Cunha, do Centro de Pesquisas da Petrobras, um dos quatro representantes brasileiros no CSLF.
Segundo ele, a perspectiva é, até 2014, a empresa estar injetando 9 giga-toneladas de CO2 por ano, o equivalente a 18% de suas emissões em 2006. “Queremos ser um dos líderes do armazenamento geológico de carbono”, antecipou.
Outra prova do interesse brasileiro no tema foi a inauguração, na quarta-feira passada, do Centro de Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento de Carbono – Cepac -, vinculado ao Instituto de Meio Ambiente da PUC/RS. O Centro é uma parceria com a Petrobras no âmbito de sua rede de Tecnologias de Mitigação de Mudanças Climáticas.
“A filosofia do Centro é capacitar recursos humanos, com projetos de P&D (pesquisa e desenvolvimento)”, disse a AmbienteBrasil o geólogo Marcelo Ketzer, coordenador do Cepac.
Uma das primeiras ações do Cepac é o projeto CarbMap, um mapeamento da quantidade de CO2 que pode ser capturada e os potenciais reservatórios para seu armazenamento em território brasileiro.
Opinião pública
Entre os desafios para a implantação do CCS, um desponta praticamente consensual: explicar ao cidadão comum, em todos estes países, de forma transparente, como funciona a tecnologia e os riscos que, assumidos, são um foco prioritário das pesquisas em curso no Fórum.
Nesse contexto, a Petrobras contratou um levantamento sobre a percepção quanto ao armazenamento geológico de CO2. O objetivo principal foi apresentar, nas discussões internacionais sobre mudanças climáticas, a opinião predominante no país a respeito do tema, sobretudo no que concerne à potencial contribuição do CCS para evitar emissões de gases de efeito estufa.
O questionário se baseou no modelo da União Européia – Acceptance of CO2 Capture and Storage, Economics, Policy and Technology – e foi apresentado em quatro situações diversas: no Seminário Internacional sobre Seqüestro de Carbono e Mudanças Climáticas, no Rio de Janeiro, em outubro de 2006; aqui em AmbienteBrasil, de outubro a dezembro do ano passado; no I Seminário Brasileiro sobre Seqüestro de Carbono e Mudanças Climáticas, em Natal (RN), em abril deste ano e, finalmente, no IV Simpósio “A Universidade frente aos desafios da sustentabilidade”, promovido pela PUC/RS, em Porto Alegre, em setembro passado.
No cômputo geral, o resultado atestou que o CCS deve ser debatido, pesquisado, desenvolvido, regulamentado e implementado no país, com apoio à criação de incentivos para esta tecnologia.
Ao mesmo tempo, a pesquisa deixou claro o entendimento de que o CCS é uma atividade que envolve riscos a serem considerados e que deve ser desenvolvido e receber investimentos sem serem deixadas de lado as outras opções de melhorias tecnológicas para mitigação de mudanças climáticas (energias renováveis, eficiência energética, redução de emissões etc).
Outro ponto claro da pesquisa foi que formadores de opinião, como ONGs, ainda não possuem posturas claras quanto ao CCS.
* Mônica Pinto viajou a Porto Alegre para o CSLF Workshop a convite da Petrobras.