As construções das hidrelétricas de Santo Antônio e de Jirau, ambas no rio Madeira, poderão sofrer mais atrasos devido a uma decisão tomada nesta segunda-feira (18) pelo governo brasileiro, sob pressão da Bolívia. Foi reativado um convênio firmado entre os dois países em 1990, sobre o aproveitamento racional dos recursos hídricos nas áreas de fronteira. Com isso, as questões ambientais envolvendo essas obras terão de ser discutidas pelos os dois países. Juntas, as duas hidrelétricas são capazes de gerar mais de 6.000 megawatts. Sua entrada em operação é considerada essencial para evitar a escassez de energia elétrica no País a partir de 2010.
Fontes diplomáticas vêem no episódio pólvora suficiente uma crise semelhante à guerra das “papeleiras” – o conflito que se arrasta há quase dois anos entre a Argentina e o Uruguai e diz respeito à utilização de recursos hídricos do rio Uruguai por uma indústria de celulose de origem finlandesa.
A reativação do convênio, com a retomada de um grupo de trabalho bilateral para tratar das implicações ambientais das hidrelétricas do Complexo do Rio Madeira, foi decidida durante a conversa do ministro de Relações Exteriores da Bolívia, David Choquehuanca, com o seu colega brasileiro Celso Amorim, em Brasília. Essa foi a saída diplomática encontrada pelo Itamaraty para lidar com uma questão que, depois do conflito bilateral provocado pela nacionalização dos setores de gás e de petróleo pelo governo Evo Morales, é vista como o imbróglio da vez entre Brasil e Bolívia.
Concessão com limites – No seu encontro com o ministro de Hidrocarbonetos da Bolívia, Carlos Villegas, o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, deixou claro que a “concessão” brasileira terá limites. Fontes que estiveram presentes relataram que Rondeau prometeu a Villegas que o governo brasileiro estará aberto a apresentar todas as informações sobre os impactos ambientais dos dois projetos. Mas não colocará em discussão com a Bolívia a execução e instalação de ambas as usinas. Ao lado de Choquehuanca, Amorim disparou o mesmo recado, em linguagem diplomática.
“Concordamos em discutir o tema profundamente, com pleno respeito à soberania nacional do Brasil e da Bolívia”, afirmou o chanceler. A questão foi a prioridade de Choquehuanca nas conversas que assentaram as bases para uma visita oficial de Morales ao Brasil em fevereiro próximo.
A usina de Santo Antonio conta com capacidade de geração de 3.150 megawatts. A de Jirau deverá gerar um pouco mais, 3.300 megawatts. O Fobomale – Fórum Boliviano sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, formado por movimentos populares que estão na base do atual governo, pressiona a equipe de Morales a tomar atitudes contra esses investimentos brasileiros. A entidade alega que as usinas reduzirão a velocidade das águas do rio Madeira, fator que elevará os níveis dos seus afluentes, do lado da Bolívia, com prejuízos para a agricultura e disseminação da dengue e da malária na região.
Os estudos feitos por Furnas e pela Odebrecht, que são responsáveis pelo projeto, não apontam impactos ambientais para a Bolívia. Mas, do lado brasileiro, os projetos também causam polêmica, mesmo com os esforços do governo Luiz Inácio Lula da Silva para levá-los a cabo. A licença prévia para ambas as usinas deveria ter sido emitida pelo Ibama em novembro passado. Mas, na ocasião, o instituto deixou claro que não as concederia antes de janeiro ou fevereiro, por conta do adiamento de audiências públicas necessárias para a conclusão do relatório de impacto ambiental pelo Ministério Público de Rondônia. (Denise Chrispim Marin/ Estadão Online)