Um relatório a ser divulgado na sexta-feira (06) pela ONU deve provocar manchetes referindo-se ao aquecimento global como “catástrofe”, “desastre” ou “cataclismo”, mas isso pode acabar sendo prejudicial, já que passa ao público a impressão de que o problema é grande demais para ser tratado, na opinião de alguns especialistas.
O relatório dos climatologistas reunidos em Bruxelas, focado nos impactos regionais do aquecimento, deve alertar para mais fome na África, aumento do nível dos mares, extinção de espécies e degelo dos glaciais do Himalaia.
Mas o Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudança Climática, que reúne 2.500 cientistas, não tenta resumir a situação em uma só palavra – ao contrário do que fazem políticos e jornalistas, que gostam de termos como “crise”, “aterrador” e “apocalipse”.
“Estou um pouco preocupado de que a mídia, tendo contribuído para produzir todo dia uma manchete apocalíptica, vá então em seis semanas declarar uma histeria e seguir adiante”, disse Achim Steiner, diretor do Programa Ambiental da ONU.
Ele ressaltou, porém, que está correto usar o termo como “catástrofe” para descrever efeitos como o aumento dos mares, que nos próximos séculos podem tragar cidades como Xangai ou o Rio de Janeiro, além de países inteiros no Pacífico.
“É legítimo usar essas palavras em cenários específicos, mas isso significa que todo o debate sobre mudança climática deve ser a respeito de maldição e trevas? Não, porque estamos descobrindo que podemos fazer algo a respeito.”
Mike Hulme, diretor do centro de pesquisas britânico Tyndall, criticou a imprensa do seu país por ter usado adjetivos como “chocante”, “aterrador” e “devastador” para se referir às conclusões do primeiro relatório climático da ONU, em fevereiro.
“Esses apelos muitas vezes levam à negação, à paralisia, à apatia e até a um comportamento reativo perverso”, escreveu ele em carta à revista Nature, na qual diz que a imprensa dos EUA foi mais comedida.
“Ativistas, imprensa e alguns cientistas parecem estar apelando ao medo para gerar uma sensação de urgência. Se querem engajar o público em reagir à mudança climática, isso é na melhor das hipóteses não confiável e na pior delas é contraproducente”, afirmou.
Os céticos também se aproveitam disso. Em 2003, o senador republicano dos EUA James Inhofe disse que a ameaça de “um aquecimento global catastrófico (foi) o maior boato já perpetrado contra o público norte-americano”. (Reuters/ Estadão Online)