Aquecimento da água em 0,5°C aumenta furacões

Quando a água superficial do Atlântico Norte aquece 0,5°C, os furacões ficam cerca de 40% mais violentos e mais freqüentes, segundo uma nova pesquisa publicada nesta quinta-feira (31) na revista Nature (www.nature.com). O estudo ajuda a explicar por que as temporadas de furacões têm sido tão severas nos últimos anos, entre elas a que trouxe o Katrina, em 2005.

Os autores, os cientistas Mark Saunders e Adam Leam, da University College London, na Grã-Bretanha, calcularam quanto pioram a freqüência e a força dos furacões a partir do momento que a água esquenta, como tem acontecido freqüentemente nos últimos 12 anos. A conexão numérica que eles viram entre os eventos indica inclusive que 2007 (com águas ligeiramente mais frias e uma temporada de furacões relativamente calma) foi uma exceção numa tendência de piora.

Os dois não chegam a dizer se indubitavelmente o Atlântico fica mais quente por causa do aquecimento global. Mas consideram a causa altamente provável. A dupla diz apenas que não procurou a causa da flutuação de temperatura. Essa é a informação que ainda falta para dizer com certeza que o Katrina, por exemplo, que devastou Nova Orleans, nos Estados Unidos, teria sido tão forte por causa da ação do homem. Seus ventos atingiram 280 quilômetros por hora e o evento matou mais de mil pessoas. Os dados são calculados em US$ 2 bilhões.

A análise foi concentrada em um trecho tropical que pega Porto Rico e costa norte da América do Sul e se estende até quase a África. A região produziu 90% dos furacões que atingiram os Estados Unidos desde a década de 1950.

Passado e presente – A dupla montou um modelo estatístico que remonta a temperatura oceânica e os padrões de vento nos últimos 40 anos, e comparou com os dados registrados nos últimos 55 anos. A comparação mostrou que o modelo teve sucesso entre 75% e 80% dos casos, fidedigno o suficiente para estabelecer uma relação de causa e efeito entre os fatores. Quando tiraram o impacto do padrão dos ventos, puderam isolar o papel da temperatura da água.

Essa é mais uma peça do quebra-cabeças do clima – que, por definição, é caótico – e aumenta a confiança nos modelos climáticos que indicam tal tendência. “É importante que os modelos climáticos futuros possam reproduzir a relação entre os fatores””, explica Lea. “Se estamos tentando projetar alguns dos impactos do aquecimento global, é preciso ter esse grau de sensibilidade.”

Os cientistas já sabiam que os furacões obtêm energia do calor das águas oceânicas – então, quanto mais quente elas estão, mais combustível o fenômeno consegue. Agora o estudo mostra que uma mínima variação de temperatura tem efeitos devastadores. “(O fenômeno) É surpreendentemente sensível a pequenas alterações na superfície dos oceanos”, diz Sauders.

Eles descobriram que, para cada variação mínima, menos de 1°C a mais, o número de furacões fortes, com ventos de mais de 160 quilômetros por hora, aumenta em 45%; de forma geral, a índice é de 36% a mais. O número de tempestades tropicais sobe em 31%.

Implicações – A temporada de 2005 foi a mais ativa já registrada na região: foram 28 tempestades e 13 furacões, 7 deles de intensidade alta. No mesmo ano, as temperaturas do Atlântico Norte atingiram seu pico.

Em 1971, quando as temperaturas da água eram mais baixas, ocorreram 13 tempestades e 6 furacões, dos quais apenas 1 era de alta intensidade. Em 2005, a atividade média de furacões tinha portanto mais do que dobrado.

Outros cientistas, que já ligam o aquecimento global a furacões piores na região, apóiam o estudo e dizem que, no mínimo, ele redefine o que eles já disseram. “A chave para antecipar os riscos futuros é desvendar a ciência que existe atrás dessas estatísticas”, afirma Matt Huddleston, consultor do Met Office, escritório responsável pelos modelos climáticos usados pelo governo britânico.

“Esse artigo sugere que a ligação entre as tempestades tropicais e a água mais quente seja talvez ainda mais forte do que imaginávamos. Isso tem implicações imensas no impacto sobre medidas de adaptação na infra-estrutura americana e nos mercados financeiros globais”, diz Huddleston.

Para Chris Landsea, da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos, que nega tal relação, o estudo não excluiu que causas naturais, cíclicas, causam as mudanças observadas. (Estadão Online)