Fauna invasora ameaça ilhas de Darwin

Atiradores do alto, em helicópteros, e outros no chão, com a ajuda de cães, fuzilaram 79 mil cabras na ilha Santiago, no arquipélago das Galápagos, Equador, num período de quatro anos e meio. Os animais eram deixados para apodrecer no local. Apesar de a cena chocar, o objetivo do extermínio era nobre: evitar o colapso ecológico de uma das ilhas cuja fauna nativa inspirou Charles Darwin (1809-1892) a conceber a teoria da evolução.

“As cabras são extremamente eficazes em criar uma paisagem similar ao deserto, em razão de sua explosão demográfica e do vigor para se alimentarem. As tartarugas terrestres e outras espécies não eram páreo para elas”, disse à Folha Felipe Cruz, um dos diretores da Fundação Charles Darwin.

A instituição leva o nome do visitante ilustre que passou pelo arquipélago em 1835 e cujo bicentenário é comemorado nesta quinta-feira. Na época em que Darwin chegou às Galápagos a bordo do HMS Beagle, já viviam nas ilhas animais invasores trazidos por piratas, marinheiros e suas embarcações.

Com o tempo, o problema foi aumentando e, nos últimos anos, a ação mais importante de conservação nas Galápagos tem sido tentar erradicar os mamíferos não nativos (porcos, cabras, gatos, ratos e jumentos) de algumas ilhas.

As cabras ferais (animais domésticos tornados selvagens) foram eliminadas em 7 das 9 principais ilhas. Santiago foi a que deu mais trabalho, e onde o extermínio teve maior custo (US$ 6,1 milhões). O sucesso da erradicação demonstra, segundo os cientistas, que é possível acabar com espécies invasoras em ilhas grandes.

Santiago possui 58.465 hectares – o arquipélago brasileiro Fernando de Noronha tem 1.840 hectares. O trabalho de “limpeza” completo, porém, ainda está longe de ser concluído. Há planos de erradicar cabras de todas as ilhas do arquipélago. “E também outras espécies como ratos e, mais importante, as espécies de plantas invasoras. Esse trabalho já está em andamento”, disse Cruz.

Segundo ele, é complicado se livrar das plantas como a amora e a goiaba. Existem hoje 748 espécies de plantas introduzidas, em comparação a 500 espécies de plantas nativas.

Os gatos só foram banidos com sucesso até agora da ilha Baltra, e ainda ameaçam a biodiversidade em Santa Cruz, Isabela, São Cristóvão (a primeira ilha visitada por Darwin) e Floreana. “Vespas, formigas e ratos também são difíceis de controlar”, afirmou. Os ratos pretos, por exemplo, trazidos em navios, roubam ovos em ninhos de aves e tartarugas.

Ao menos 490 espécies de insetos e 53 espécies de outros invertebrados foram também introduzidos nas Galápagos. “Algumas têm impacto severo nas espécies nativas, como a mosca parasitária Philornis downsi, que está atacando os tentilhões-de-darwin”, disse Toni Darton, diretor do Galapagos Conservation Trust.

Extinção – Segundo Darton, quando Darwin esteve no arquipélago, o número de animais como tartarugas e pinguins deveria ser muito maior. “Em seu diário, ele fala que não conseguia encontrar um local livre de tocas de iguana para colocar sua tenda na ilha James (hoje Santiago)”, conta. Mas, antes de Darwin visitar as ilhas, muitas espécies já enfrentavam riscos.

“Entre 1700 e 1800, piratas, baleeiros e caçadores de focas acabaram com muitas populações de tartarugas em diversas ilhas. De 14 espécies, restaram 11. E uma delas é composta por apenas um indivíduo: Lonesome George [George, o Solitário], da ilha Pinta”, afirmou Darton. De acordo com ele, o próprio Darwin notou que a tripulação do Beagle coletou entre 600 e 800 tartarugas nas Galápagos em somente algumas semanas.

Entre as várias espécies de animais do arquipélago na lista vermelha de extinção da IUCN (União Internacional para Conservação da Natureza) estão o pinguim-das-galápagos (Spheniscus mendiculus), classificado como “em perigo”, e o “mockingbird” da ilha floreana (Mimus trifasciatus), que ganhou o status de “criticamente em perigo” no ano passado.

Esta ave, crucial para o pensamento evolutivo de Darwin, foi extinta da ilha Floreana ainda no século 19, em razão da introdução do rato preto. “Ela ainda existe nas ilhas menores Champion e Gardner-by-Floreana. Mas, em 2007, os números eram de apenas 18 e 30 adultos, respectivamente”, afirmou Darton. (Fonte: Afra Balazina/ Folha Online)