Por outro lado, estes mesmos resíduos são fonte de sustento para milhares de famílias brasileiras, os denominados catadores de materiais recicláveis, cujas associações e cooperativas somam mais de 34 mil pessoas em todo País, que se juntam a outros milhares de catadores, que extraoficialmente, também sobrevivem do lixo descartado.
Essa equação, que ainda hoje apresenta resultados desfavoráveis à saúde e ao meio ambiente, deve ser alterada com a aprovação, no Senado Federal, da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). A nova política, que vai definir as diretrizes gerais para a disposição correta dos mais diversos tipos de lixo produzidos, determinará, por exemplo, como se dará a atuação do setor empresarial na correta disposição deste material e cobrará dos entes governamentais uma correta gestão pública desses resíduos.
Há mais de 19 anos, o Brasil espera a aprovação de um arcabouço legal que defina instrumentos e responsabilidades para a geração dos mais diversos tipos de resíduos sólidos, entre eles, a novidade dos materiais eletrônicos, para os quais ainda não existe lei federal definindo como se dará seu descarte. A princípio, a PNRS definirá as diretrizes gerais para a gestão dos resíduos. Sua regulamentação será feita posteriormente, por meio de Decreto.
Para se adiantar a essa etapa, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) já está formando um grupo de assessoramento com objetivo de apoiar o Governo Federal na tarefa de fazer com que a política se transforme em dispositivo legal de fácil e correta aplicação.
A proposta aprovada na Câmara dos Deputados no mês de março é resultado de um amplo consenso envolvendo todos os atores que fazem parte dos mais diversos ciclos da produção de resíduos sólidos. Ela trata de temas amplos e variados que já fazem parte do dia-a-dia das pessoas envolvendo conceitos como área contaminada, ciclo de vida do produto, coleta seletiva, controle social, destinação final ambientalmente adequada, gerenciamento de resíduos, gestão integrada, reciclagem, rejeitos, responsabilidade compartilhada, reutilização e serviço público de limpeza urbana.
O que se pretende com a nova política nada mais é do que a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, a adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais, a redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos, a gestão integrada de resíduos sólidos, entre outros. Um outro importante objetivo é a integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos.
A nova política é clara em definir de que forma se dará o gerenciamento de resíduos sólidos, indicando inclusive sua ordem de prioridade que será a de não-geração, a de redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos. A nova política só não define normas para os rejeitos radioativos, que são regulados por legislação específica.
A grande novidade do texto que está no Senado diz respeito ao conceito de logística reversa, que será aplicada ao chamado lixo eletrônico. O conceito é definido como um instrumento de desenvolvimento econômico e social, caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada. Quando regulamentado, o novo dispositivo indicará aos geradores de lixo eletrônico suas responsabilidades com o correto descarte.
Com a nova política será também criado um sistema nacional integrado de informações sobre resíduos sólidos. O sistema será responsável por recolher e divulgar informações com rapidez e qualidade.
Lixões – Um dos mais graves problemas associados à inadequada disposição final de resíduos sólidos diz respeito aos lixões que se espalham pelo País. Segundo dados do IBGE, embora 97% do lixo seja coletado nas residências brasileiras, cerca de 59% dos municípios ainda depositam seus resíduos em lixões, outros 16% em aterros controlados, provocando a poluição da água e do solo. Apenas 13% vão para aterros sanitários.
De acordo com o secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do MMA, Silvano Silvério, o grande número de lixões se deve à falta de capacidade dos municípios para operar, planejar, fiscalizar e regular aterros sanitários já construídos ou pelo alto custo de implantação e operação de aterros sanitários. Dados da SHRU garantem que construir e operar um aterro sanitário para um pequeno município custa, por habitante, duas ou três vezes mais do que construir ou operar um aterro sanitário para um conjunto de municípios de pequeno porte.
Adiantando-se à aprovação da nova política, o Ministério do Meio Ambiente vem apoiando estados e municípios na constituição de consórcios intermunicipais e/ou interfederativos. Atualmente, 13 consórcios estão em processo de formação, abrangendo mais de 160 municípios que passarão a contar com gestão inovadora de resíduos, beneficiando os catadores que trabalham em condições precárias.
Até o final de 2010, 18 estados brasileiros devem concluir seus Planos de Gestão de Resíduos Sólidos, premissa necessária para a posterior constituição de consórcios intermunicipais. Estes instrumentos vão permitir aos municípios, gestores dos serviços, aprimorar seus sistemas e processos, melhorar a prestação dos serviços e definir estratégias para a destinação final dos resíduos.
Resíduos eletrônicos – O diretor-interino de Ambiente Urbano da Secretária de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano (SHRU) do MMA, Marcos Bandini, explica que, atualmente, não existe legislação federal para o descarte do lixo tecnológico. O que existe são resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) que tratam especificamente de alguns desses resíduos, como é o caso de pilhas e baterias e de pneus. Existem também algumas ações no âmbito do Governo Federal como o recolhimento de geladeiras comandado pelo Ministério de Minas e Energia e o Programa de Inclusão Digital conduzido pelo Ministério do Planejamento (MPOG), que aceita doações de computadores que são recuperados e distribuídos a instituições que os destinam ao uso de comunidades carentes, explica ele.
De acordo com o diretor, o termo resíduo eletroeletrônico abriga inúmeros tipos de resíduos, adquirindo, por isso, significado bastante geral. Inclui, por exemplo, televisores, geladeiras, celulares, telefones, computadores (a CPU propriamente dita e todos seus periféricos como impressoras, monitores, teclados, mouses, etc), fogões, aspiradores-de-pó, ventiladores, congeladores, aparelhos-de-som, condicionadores-de-ar, batedeiras, liquidificadores.
Do ponto de vista ambiental, é grande a importância que se tem atribuído aos computadores pela velocidade de disseminação de seu uso e pela rapidez com que se torna obsoleto. Um exemplo dessa situação é o fato de que no período de 2006/2007, os notebooks apresentaram uma taxa de crescimento equivalente a mais de 110%. Em termos de vendas para 2009, segundo a Associação Brasileira da Indústria Elétrica Eletrônica (Abinee), o mercado total de venda de PCs foi de 12 milhões de unidades, das quais 7,7 milhões de desktops e 4,3 milhões de notebooks. Estes números apontam que pelo menos 27% dos domicílios particulares no Brasil dispõem de computadores, segundo fonte do IBGE.
Quanto à telefonia celular, segundo dados constantes do Panorama 2009 da Abinee, foram produzidos em 2008, 73 milhões de unidades, sendo 48 milhões de unidades para atendimento ao mercado interno e 25 milhões para exportação.
Esses números são apresentados para indicar o volume de produção de alguns bens eletroeletrônicos. Com eles, pode-se afirmar que esses volumes são expressivos com tendência crescente que atendam a uma demanda de usuários novos ou reposição de equipamentos antigos/obsoletos, explica o Bandini.
Estima-se um relativo índice de aproveitamento de peças/partes componentes no mercado formal e informal (mercado de usados para equipamentos eletroeletrônicos). No entanto, conforme explica Bandini, caso surjam medidas visando incrementar a demanda que facilitem a aquisição desses produtos pelas camadas sociais de menor poder aquisitivo (redução de IPI, por exemplo), pode acontecer uma mudança no quadro atual e uma rápida substituição dos equipamentos, gerando um número muito grande de resíduos eletroeletrônicos.
Mesmo antes da aprovação da PNRS, a destinação dos resíduos eletroeletrônicos tem recebido diferentes soluções locais. Marco Bandini informa que ao cidadão aconselha-se, em cada caso e região, informar-se junto ao órgão ambiental municipal sobre a existência de soluções ou de programas que tratem desses descartes. Às vezes, já existem iniciativas dos fabricantes, ou de setores da sociedade, para o recolhimento de resíduos dos produtos ou de suas embalagens, na linha da logística reversa, diz.
O lixo eletrônico produzido no Brasil, em 2006, foi de 11 milhões de toneladas. Em termos mundiais são produzidos 50 milhões toneladas/ano de lixo eletrônico. Estima-se que 90% do lixo eletrônico não retorna para o ciclo produtivo com vistas ao seu reaproveitamento.
Pneus, pilhas, baterias – Também se adiantando à nova política, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovou, em setembro de 2009, Resolução dispondo sobre pneus inservíveis. A aprovação inaugurou um processo de logística reversa, estabelecido na PNRS. Ficou definido que o descarte correto do produto é de responsabilidade de fabricantes e importadores.
Eles serão obrigados a coletar e dar destinação ambientalmente adequada aos pneus na proporção de um para um. Isso significa que a cada pneu novo comercializado, um deverá ser recolhido. O ato do recolhimento se dará, obrigatoriamente, no momento em que o consumidor estiver fazendo a troca de um pneu usado por um novo, sem qualquer custo para o consumidor.
Ainda de acordo com o texto aprovado, fabricantes e importadores de pneus novos, de forma compartilhada ou isoladamente, deverão implementar pontos de coleta (ecopontos) de pneus inservíveis. E nos municípios acima de 100 mil habitantes deverá haver pelo menos um ponto de coleta e armazenamento, a ser implantado num prazo máximo de um ano a partir da publicação da resolução.
Também será obrigação de fabricantes e importadores elaborar um plano de gerenciamento de coleta, armazenamento e destinação dos pneus inservíveis e comprovar junto ao Cadastro Técnico Federal (CTF), do Ibama, numa periodicidade máxima de um ano, a destinação dos inservíveis.
O Conama vem ainda aprovando inúmeras outras resoluções com objetivo de regular a correta disposição de alguns resíduos perigosos. A Resolução nº 334, por exemplo, dispõe sobre os procedimentos de licenciamento ambiental de estabelecimentos destinados ao recebimento de embalagens vazias de agrotóxicos. A de nº 362, fala sobre o recolhimento, coleta e destinação final de óleo lubrificante usado ou contaminado.
A Resolução nº 401 estabelece limites máximos de chumbo, cádmio e mercúrio para pilhas e baterias comercializadas no Brasil e define critérios para seu gerenciamento ambientalmente adequado. Um Grupo de Trabalho dentro do conselho vem debatendo sobre a disposição final de lâmpadas à base de mercúrio.
Tramitação – A gestão de resíduos sólidos é tema presente no Congresso Nacional desde 1991 com o PL 203/91. Em setembro de 2007, o presidente da República, em solenidade no Palácio do Planalto, com a presença de diversos setores da sociedade ligados ao assunto, assinou mensagem encaminhando ao Congresso a proposta do Executivo para a criação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. A proposta foi transformada no PL 1991/2007 e apensada ao PL 203/91.
Em 19 anos de tramitação no Congresso Nacional, a PNRS sofreu emendas e foi apensada em diversas vezes. A subemenda que está no Senado Federal é um substitutivo global ao substitutivo do Projeto de Lei 203. Nesses quase 20 anos de tramitação, passou pela comissão de Seguridade Social e Família e diversas vezes pelo Plenário e pela Mesa Diretora.
Após todas emendas modificativas proposta que está no Senado apresenta ferramentas destinadas à solução dos problemas de resíduos sólidos no País. Essas respostas podem ser vislumbradas através de princípios de diretrizes propostos, entre os quais a criação de: Incentivos fiscais e econômicos à reciclagem; Plano Nacional de Resíduos Sólidos; Planos estaduais e municipais de resíduos sólidos; Planos microrregionais de resíduos sólidos (a ser elaborado pelos consórcios regionais de resíduos sólidos; Plano de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos (a ser elaborado pelos geradores de resíduos); responsabilidade compartilhada pelos resíduos sólidos; procedimentos de logística reversa; análise de ciclo de vida dos produtos. (Fonte: MMA)