A próxima reunião da Comissão Internacional da Baleia (CIB) vai discutir um acordo que pode legitimar a atividade de países que capturam esses mamíferos marinhos, após 25 anos de moratória à caça comercial. Articulada pelos EUA e pela presidência da entidade, a proposta tem como alvo o Japão, nação que mais mata esses cetáceos hoje, mas alega fazê-lo com fim científico. A intenção é dar uma cota oficial de caça aos japoneses, os quais, em troca, aceitariam reduzir o número de animais mortos e se abririam à fiscalização.
“Como resultado disso, vários milhares de baleias a menos seriam mortos no período do acordo”, disse ontem em comunicado o presidente da CIB, o chileno Cristián Maquieira, que defende uma vigência inicial de dez anos para as regras.
A proposta lançada mantém só oficialmente a moratória, mas dá à CIB o poder limitar a cota de caça de todos os países. A fiscalização seria feita com amostras de DNA para rastrear o destino da carne dos animais, e aborígenes continuariam podendo caçar para subsistência.
O pré-acordo, por enquanto, foi discutido só a portas fechadas por um grupo de 12 países, que inclui o Brasil, sem consenso. O debate aberto só vai ocorrer no próximo encontro dos 88 países da CIB, que começa dia 30 de maio em Marrocos.
Apesar de, na prática, permitir uma redução real no número de baleias mortas, a mera sugestão abrir margem legal à caça comercial tem recebido críticas pesadas de ambientalistas. “A proposta de acordo é muito ruim”, diz José Truda Jr., que participa de um grupo de ONGs latinoamericanas que critica Maquieira. “Não é hora de recompensar o Japão institucionalizando suas capturas.”
O governo do Brasil ainda não tem uma posição sobre a proposta, e deve assumi-la só depois da discussão com outros países da América Latina, que votam em bloco para ganhar peso diplomático na CIB.
“Vamos ver o que é possível ter de entendimento, mas o Brasil é muito claramente a favor da moratória e contra a caça no santuário [do oceano Austral]”, diz Fábio Pitaluga, representante do país na comissão.
Hoje, o Japão anuncia unilateralmente sua cota anual de caça “científica”, que supera mil baleias, a maioria delas da espécie minke do oceano Austral. A carne desses animais, porém, é vendida sem restrição em território japonês. Os outros países que praticam caça industrial são Noruega e Islândia, mas nenhum dos dois assinou a moratória de 1986.
Não está claro, porém, qual preço os países conservacionistas estão dispostos a pagar para aceitar endossar a caça japonesa. A agência de notícias Kyodo noticia que o Japão proporá reduzir sua cota máxima de baleias-minkes do oceano Austral de 935 a 440. Neste ano, o país saiu com o objetivo de arpoar pelo menos 765 animais, mas só conseguiu atingir 507, por causa das ações da ONG ambientalista Sea Shepherd.
É difícil saber quantos animais precisariam ser salvos para manter a população num nível seguro. Segundo Alexandre Zerbini, biólogo do comitê científico da CIB, o número de baleias-minkes no oceano Austral foi estimado em 700 mil no início da década de 1990, mas caiu para 300 mil nos anos 2000. Não está claro se foi pela caça. “Qualquer coisa que você puder fazer para diminuir a captura é bom”, diz Zerbini sobre a tentativa de acordo. (Fonte: Rafael Garcia e Reinaldo José Lopes/ Folha Online)