Aonde o surfista vai, o cientista vai atrás. Isso está acontecendo porque, nos últimos anos, os pesquisadores perceberam que muito do que sabiam sobre ondas gigantes estava simplesmente errado. E quem diria: foram surfistas que mostraram isso.
É que os cientistas duvidavam que ondas extremas, com quase 30 metros, fossem comuns. Mas surfistas insistiam em encontrá-las.
Por isso, lugares como Oahu, uma ilha repleta de gente com pranchas no Havaí, por exemplo, tornaram-se sedes de constantes congressos científicos sobre o tema.
Em meio ao clima de “paz, amor e aloha”, entre quiosques de frutos do mar, artesanato e camisetas de cânhamo, agora cientistas branquelos e ensapatados discutem coisas como a “modelagem númerica dos oceanos”.
A jornalista americana Susan Casey, que lança no Brasil o livro “A Onda”, acompanhou um desses encontros.
“Os cientistas temporariamente triplicaram o QI per capita do local”, brinca. Eles estavam preocupados. Se as teorias diziam que ondas gigantes eram tão improváveis quanto neve em Cuiabá, era cada vez mais nítido que elas tinham o ligeiro defeito de não bater com os fatos.
No passado, alguns dissidentes defenderam que ondas enormes em alto mar estavam afundando navios, mas não convenceram muita gente.
O caso mais famoso foi o do misterioso cargueiro alemão München, que afundou no Atlântico Norte em 1978. Tanto o navio quanto a tripulação continuam desaparecidos até hoje.
“É o problema em se provar ondas gigantes: se você se depara com esse pesadelo, é provável que ele seja o último da sua vida”, diz Casey.
Dois acontecimentos, porém, fizeram isso mudar.
Primeiro, em 1995, uma onda gigante bateu em algo fixo o suficiente para que sobrasse gente para contar a história: uma plataforma de petróleo perto da Noruega.
Os registros mostram uma onda de 25 metros batendo a 75 quilômetros por hora. Deu um imenso susto e danificou a plataforma, mas ela não afundou. Ninguém morreu.
Os engenheiros que a projetaram tinham calculado que, “uma vez a cada mil anos”, apareceria uma onda com algo entre “dez e vinte metros”. Coisas maiores do que isso simplesmente não existiriam por ali. Existiam.
O outro acontecimento foi o surfe em ondas gigantes.
Ele virou, nos anos 2000, uma indústria que gera, só na América do Norte, US$ 7,5 bilhões ao ano: muitas marcas estão dispostas a gastar para se vincular ao esporte radical e convencer o público de que podem “dar asas”.
Em 2001, a Billabong, empresa que faz roupas de surfe, passou a oferecer prêmios para quem surfasse a maior onda do ano. Isso criou uma “corrida do ouro” pelo mundo. Cada vez que um surfista de ondas grandes pegava a sua prancha, dava um tapa na cara dos cientistas.
Os pesquisadores, porém, estão avançando, mesmo sendo difícil traduzir o oceano em equações: as interações entre água, atmosfera e calor são muito complexas.
Eles já chegaram a uma conclusão importante: o aquecimento global tem feito a altura das ondas aumentar quase 10% a cada década ao menos desde 1960.
Isso porque água mais quente quer dizer água mais instável. Isso significa, por exemplo, mais tempestades em alto mar –e mais ondas grandes chegando à costa. (Fonte: Ricardo Mioto/ Folha.com)